Jornal Estado de Minas

ARTES CÊNICAS

Alzheimer é tema da nova peça de Ilvio Amaral e Maurício Canguçu


Em novembro, quando estrearam a peça Maio, antes que você me esqueça, no Teatro Riomar, em Fortaleza, Ilvio Amaral e Maurício Canguçu completavam nove meses longe dos palcos. Reconhecidos por Acredite, um espírito baixou em mim, comédia em cartaz por 22 anos, eles não conseguiram se adaptar completamente ao formato on-line que os espetáculos ganharam por conta da pandemia. Mas isso não significou um período sabático.




Durante o isolamento social, os dois começaram a movimentar esforços para colocar em prática projetos engavetados. Um dos resultados é a montagem que estreou no Ceará e será apresentada pela primeira vez em Belo Horizonte neste sábado (5), às 21h, e domingo (6), às 19h, no Teatro Feluma.

“Essa peça nos cerca há muitos anos”, conta Canguçu. “Há cerca de uma década, quando o pai do Ilvio tinha acabado de falecer e minha mãe foi diagnosticada com mal de Alzheimer, pedimos ao Jair Raso um texto que falasse sobre esses dois assuntos. Pouco tempo depois, ele nos presenteou com essa dramaturgia. Nós adoramos, mas não montamos. Nunca entendemos o porquê, ficou aquela coisa adormecida.”

SENTIDO

Em meio às leituras que a dupla realizou na quarentena, o texto de Raso ganhou novo sentido. “Chegamos à conclusão de que precisávamos fazer. Antes, não tínhamos maturidade emocional suficiente para esta peça. Agora, 10 anos depois, fomos arrebatados pelo texto, entramos em contato com o Jair e começamos a construir o que o público vai conferir, pessoalmente, no palco”, afirma o ator.



Maio, antes que você me esqueça conta a história de Mauro (Maurício Canguçu), que, a contragosto, recebe a tarefa de hospedar em sua casa seu pai, Hélio (Ilvio Amaral), diagnosticado com Alzheimer. Ao longo dos 60 minutos do espetáculo, fica clara a relação conflituosa e distante dos dois.

Além de dramaturgo, Jair Raso é neurocirurgião, portanto escreve com conhecimento de causa. Aliás, foi justamente ele quem diagnosticou a doença da mãe de Canguçu. “Ela era uma pessoa muito alegre e companheira. Com muito respeito, brinco que graças a Deus ela faleceu antes de ficar acamada. Então, não vivi esse processo, mas de certa forma vivo isso na dramaturgia”, conta.

Ainda que seja um assunto delicado, Canguçu garante que a peça é divertida e também faz pensar, principalmente sobre as relações entre pais e filhos.

“Depois da apresentação em Fortaleza, a gente percebeu a necessidade que as pessoas têm de falar sobre o assunto. No fim do espetáculo, mesmo após a gente explicar que não poderia receber o público por conta do coronavírus, uns poucos nos esperaram na porta do teatro para comentar as experiências deles com a doença. Acredito que seja um espetáculo que desperta esse desejo”, analisa o ator.



A dupla pensa em promover rodas de conversa após as sessões. No entanto, isso terá de esperar por um mundo com menos restrições, principalmente de público, por causa do coronavírus. Na estreia, o Teatro Feluma funcionará com 50% da capacidade total.

“Nos ensaios, tomamos todos os cuidados possíveis, com uso de máscara, álcool em gel e a prática do distanciamento social. Mesmo com tudo isso, foi muito gostoso o processo de concepção e construção do espetáculo. Criamos um espaço de muita risada e muito amor, o que tenho certeza que vai se repetir no palco, diante do público”, diz Maurício Canguçu.

Durante o processo, a dupla de atores se deparou com algumas questões que precisavam ser resolvidas pessoalmente, e não de forma on-line, como se convencionou nos últimos meses.

“Teatro é feito de processos artesanais. A criação no teatro sempre foi muito presencial. Diante de todas as dificuldades, entre elas a falta de dinheiro, nos deparamos com a possibilidade de trazer esse espetáculo para o público, presencialmente. Foi pensando nisso que o construímos. Entre trancos e barrancos, tirando das nossas economias. Tudo isso para deixar a prisão que nos foi imposta e continuar fazendo arte”, pontua Canguçu.



Ansioso pela estreia em BH, ele não vê a hora de pisar no palco diante da plateia mineira. “É a nossa casa, o nosso público, que gosta da gente. Será um reencontro muito emocionante, espero que todos os que forem nos assistir permitam se deliciar com uma história que é para rir, mas também se emocionar”, acrescenta.

PAIXÃO

Emoção compartilhada pelo companheiro de cena. “O palco é minha paixão. Estrear na pandemia, em um ano tão atípico, é um desafio. O desafio também é interpretar um idoso com Alzheimer. Esse texto emociona e nos faz pensar que a vida passa e deve ser vivida”, comenta Ilvio Amaral.

Na semana passada, a peça Como vencer a burocracia sem ter um infarto, dirigida por Ilvio, ficou em cartaz no Cine Theatro Brasil Vallourec durante três dias. Agora, o veterano prepara-se para subir ao palco como ator.
“Após esse período terrível de boicote que vivemos, é bom saber que o público ainda está aí, firme e forte, para nos acompanhar”, afirma.



Maio, antes que você me esqueça deve voltar em cartaz durante a 47ª Campanha de Popularização do Teatro e da Dança, prevista para ocorrer no início de 2021.

“Esperamos que em Belo Horizonte as fases da reabertura não regridam. Queremos levar essa peça para Rio de Janeiro e São Paulo. Hoje, o Alzheimer é um tema que interessa a muita gente. Todas as famílias o enfrentam de alguma forma. Ver isso com humor e afeto é uma boa saída para superar essa doença”, conclui Canguçu.

MAIO, ANTES QUE VOCÊ ME ESQUEÇA
Neste sábado (5), às 21h, e domingo (6), às 19h. Teatro Feluma. Alameda Ezequiel Dias, 275, Centro. Ingressos: R$ 60 (inteira) e R$ 30 (meia). Vendas on-line: www.sympla.com.br. Classificação: 14 anos.

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