Jornal Estado de Minas

LIVROS

Editoras apostam em feiras literárias físicas para formar leitores


O mercado editorial brasileiro se movimenta para não ser engolido por empresas multinacionais e, durante a pandemia do novo coronavírus, busca se reinventar. A quarentena obrigou as livrarias a fechar as portas. Vendas on-lines se apresentaram como alternativa, mas eventos literários seguem como fundamentais para a formação de leitores. A Feira Literária de Tiradentes (Fliti), realizada no fim de novembro na cidade histórica mineira, demonstra a importância dos eventos presenciais. O contato do leitor com o livro de papel segue como experiência única.





Eventos como a Fliti apontam caminhos para a recuperação, como demonstra a participação das editoras Melhoramentos, Mandala Produções, Aquarius, Quixote%2bDo, Aletria, Bambolê e Bem-te-vi. Para muitas delas, foi a primeira, e única, feira presencial do ano.

“Feiras, como a de Tiradentes, privilegiam as editoras. A organização tem esse cuidado, mas, mesmo assim, imagina a luta que é nesse contexto chegar às pessoas”, afirma Luciana Tanure, editora da Quixote Do. Ela lembra que quando veio a pandemia, em março, a empresa havia acertado todos os contratos para a produção de livros, mas foi surpreendida. “Fechei os contratos em um cenário e tive que executá-los em outro. Pela primeira vez estou em déficit financeiro. Tenho de pagar gráfica, porque o papel acabou de aumentar.”

O cenário ficou ainda mais instável para as editoras, porque há apenas um fornecedor de papel no Brasil, diz Luciana, o que dificulta a negociação. A Fliti foi o primeiro evento presencial da Quixote Do. A pandemia impediu, por exemplo, a realização do Festival Livro na Rua (Flir), em Belo Horizonte, evento que teve de ser adiado. “Por causa do isolamento social, não realizamos o Flir, mas há planejamento para fazê-lo em 2021 com apoio internacional, da embaixada da França”, revela Luciana.





Apesar da dificuldade, ela acredita que as editoras independentes têm papel fundamental no mercado. Luciana destaca a função desbravadora dessas empresas. “O movimento de ascensão do trabalho de um editor, de uma editora, de um produtor cultural, de um criador, empreendedor, ou seja, a ascensão do pequeno para o maior, é muito bem-vinda. Precisamos abrir e criar mercado de leitores no Brasil”, enfatiza.

Outro problema enfrentado pelas editoras é o preço do livro. “É verdade e também não é que o livro é caro. O objeto livro em papel é o nosso foco. E o papel é uma commodity, negociada na Bolsa de Valores de Nova York, depende do valor da celulose.” Luciana ressalta que a precificação do livro no Brasil está muito atrelada à variação do dólar.

De acordo com ela, a economia criativa encontra-se em um momento decisivo, apesar da crise. “Estamos nos anos 20 deste século, somos a vanguarda. A etimologia da palavra crise no grego antigo, a crise é um portal. Nós que trabalhamos com livro, cinema, produção cultural, dança, teatro ou empreendedorismo da economia criativa, estamos atravessando sempre um portal e, principalmente agora, um espaço híbrido.”





Luciana ressalta que “a Quixote tem o intuito de valorizar o que é nosso, mas também falar a língua global”. “O global é um norteador para gente. Não somos editora de nicho. A diversidade, a escuta, o respeito à diferença estão na base da nossa editora, da nossa visão”, diz.

Ela faz a analogia do consumo do livro com o consumo de alimentos. “Da mesma forma que a gente procura um alimento que seja nosso e não tenha agrotóxico, devemos procurar alimento para o nosso intelecto, para a nossa formação cultural, que também seja nosso e que respeite a cadeia de produção”, afirma. “Os livros da Quixote Do têm o selo FSC, que garante que todo o papel que a gente usa é de fontes renováveis.

Fundada por Vivi Nabuco, a editora Bem-te-vi também participou da Fliti. “Vivi tem uma relação muito grande com Tiradentes. A mãe dela restaurou a cidade, criou a Fundação Rodrigo Melo Franco de Andrade, que está fazendo 50 anos em 2020”, conta a editora Ana Luísa Chafir.

Na avaliação dela, as editoras passam por momento delicado devido à fragilidade da economia brasileira, aliada à crise política. “A crise afetou bastante a vida das empresas e a pandemia veio para acabar com o acesso e o trânsito das pessoas nas livrarias, nos ambientes de trabalho e de produção editorial. Por outro lado, houve grande avanço no mercado virtual, de vendas on-line e e-books”, afirma. “Impulsionadas pelo entretenimento em casa, as editoras passaram a vender mais por meio dos sites”, conclui.




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