Depois da sensação com a série espanhola La Casa de Papel, o sucesso da francesa Lupin ilustra o fim da hegemonia dos Estados Unidos na produção televisiva, um movimento impulsionado pelas plataformas e a nova ambição de atores internacionais.
“Há 10 anos, 90% da criatividade estava nos Estados Unidos”, diz Pascal Breton, fundador e presidente da produtora Federation Entertainment. "Havia boa criatividade local em um pequeno nível, mas ela não ultrapassava as fronteiras locais."
No entanto, as coisas mudaram. O poder da internet aumentou, o modelo de televisão sob demanda se instalou, os canais americanos deram o exemplo, com a HBO na liderança. Tudo isso levou os estrangeiros a apostarem nas séries, quando antes optavam pelo cinema ou pelo esporte.
"Não sei bem qual era a intenção no início, mas as produções confirmaram que não era apenas uma forma de se diferenciar no mercado internacional, mas que isso interessava a outros mercados", afirma Luca Barra, professor da Universidade de Bolonha e coautor de um estudo sobre ficção televisiva na Europa.
Esta “mudança de mentalidade” também favoreceu o desenvolvimento de estruturas de produção transnacionais, especialmente na Europa, para dar conta de um aumento dos orçamentos, afirmou.
SUCESSO
Paralelamente, a explosão do número de canais e plataformas gerou um apetite inédito por conteúdos e redefiniu a noção de sucesso. “São tantos programas e o público está tão fragmentado que produções que antes não teriam encontrado seu público podem encontrar uma saída”, disse Barra.O surgimento de plataformas internacionais, principalmente Netflix, mas também mais recentemente Amazon e Disney + desempenhou um papel crucial. A Netflix também ofereceu legendas em todas as suas produções e a dublagem de várias delas, permitindo que séries não inglesas como Lupin dominassem as audiências mundiais por vários dias.
Para se estabelecer no exterior, as plataformas americanas produziram conteúdo local em diversos países, passando por produtoras locais. Na Coreia do Sul, e agora na Europa, graças a uma recente lei, os serviços de vídeo na internet também têm a obrigação de contribuir financeiramente para o setor audiovisual do país em que estão presentes.
Nesse novo panorama da produção de televisão, os americanos "continuam muito poderosos", disse Breton, mas "há um reequilíbrio real" que "se acelerará". Para Jonathan Gray, professor da Universidade de Wisconsin, empresas de produção fora dos Estados Unidos também integraram códigos de script que são exportados para os Estados Unidos.
"Os gostos americanos são limitados em termos de televisão", disse ele. Mas as produções estrangeiras agora sabem como satisfazê-los, "sacudindo-os um pouco às vezes, mas sempre de forma reconhecível". Breton aponta que “há muito mais temas internacionais, tipos de narração de histórias”.
"Versalhes ou Saint Tropez são temas mundiais. Eles conquistam públicos internacionais, como a série italiana Gomorra, sobre a máfia, ou a mexicana Narcos, sobre o tráfico de drogas internacional.
No caso de Lupin, o Louvre funciona como um ímã, mas, para Breton, o sucesso também se explica pela encenação. “É um pouco como os filmes de Luc Besson, o único diretor do cinema francês que entendeu o mercado internacional”. Na verdade, vários ex-colaboradores de Besson estão por trás das câmeras na série Lupin.