Nos últimos anos, as causas humanitárias e identitárias propuseram uma série de revisões e desconstruções da história cultural e de seus personagens em todo o mundo. Em alguns casos, a ideia era questionar o reconhecimento dado a figuras que possam ter colaborado com injustiças, apesar de seus atos em tese grandiosos. Outras, entretanto, vão na contramão, e suas trajetórias são justamente reforçadas pela ligação aos temas atuais. É o que ocorre com o escritor, poeta e dramaturgo irlandês Oscar Wilde (1854/1900) na peça Wilde. Re/Construído, exibida hoje, via transmissão on-line, pelo Grande Theatro Unimed-BH.
Em cena, é feita uma ponte entre esses acontecimentos do fim do Século 19 com o presente, por meio de imagens projetadas no palco do Grande Theatro Unimed-BH. Os atores falam também sobre leis do Século 20 e da atualidade que ainda preveem punições para homossexualidade em muitos países. “O espetáculo se inicia e se encerra na morte, mas em nenhum momento Wilde está de fato morrendo. É contado aquilo que viveu junto, com ele sempre ativo, apesar das nuances da personagem, que vai desde sua glória, até sua derrocada, a partir de 1895, na ação movida pelo Marquês de Queensberry, pai de Alfred Douglas, um dos homens com quem Wilde teria se relacionado”, adianta o diretor.
Sob direção de Sérgio Abritta, o espetáculo tenta rememorar os últimos dias de Wilde, a partir dos depoimentos de dois de seus amigos que dão versões totalmente distintas sobre a morte dele, ocorrida em 1900. A narrativa volta ao passado, lembrando diversas passagens de sua existência, nas quais o protagonista aparece interpretado por Alexandre Toledo, enquanto Alex Zannon e Marcus Labatti alternam entre outros vários papéis. O foco principal é mostrar como sua brilhante trajetória literária, interrompida por uma condenação homofóbica, prevista pela lei inglesa da época, se relaciona com a intolerância que persiste ainda hoje.
“Resgatar fragmentos da vida do Wilde era algo importante. Mas mais importante ainda era concatenar essa vida dele que se transformou numa bandeira, na causa da diversidade. Conectar a vida dele com o presente. A princípio, quando a gente vê o julgamento, pelas práticas das leis penais da época, que condenavam como ‘práticas de atos indecentes’ as relações entre pessoas do mesmo sexo, parece totalmente absurdo. Porém, atos de homofobia existem ainda hoje, 121 anos depois, e não podemos naturalizar isso como antes”, argumenta Abritta, que compara os tempos atuais a um “recrudescimento da Era Vitoriana, com todos seus preconceitos estruturais”.
O diretor destaca que a condenação, confirmada em 1895, quando o autor de O retrato de Dorian Grey estava “no auge da sua capacidade”, praticamente encerra a vida Wilde, que desenvolveu sérios transtornos no cárcere, embora tenha escrito outras duas obras no período. “Foi condenado também ao silêncio, sendo que era uma grande palestrante, suas obras falavam por ele, ele escrevia o que falava”, diz Abritta.
PONTE
Em cena, é feita uma ponte entre esses acontecimentos do fim do Século 19 com o presente, por meio de imagens projetadas no palco do Grande Theatro Unimed-BH. Os atores falam também sobre leis do Século 20 e da atualidade que ainda preveem punições para homossexualidade em muitos países. “O espetáculo se inicia e se encerra na morte, mas em nenhum momento Wilde está de fato morrendo. É contado aquilo que viveu junto, com ele sempre ativo, apesar das nuances da personagem, que vai desde sua glória, até sua derrocada, a partir de 1895, na ação movida pelo Marquês de Queensberry, pai de Alfred Douglas, um dos homens com quem Wilde teria se relacionado”, adianta o diretor.
Símbolo na reação aos preconceitos
Sérgio Abritta, que é também autor do texto, destaca a forte simbologia da história de Wilde na luta contra o preconceito, já que o escritor teve a chance de deixar a Inglaterra e não cumprir a pena, mas preferiu encarar a absurda condenação. “Fragmentadamente, trazemos aspectos que interessam na luta contra a homofobia, mas não estamos reconstruindo nada. As falas estão lá. O julgamento do Wilde é todo documentado. Os amigos escreveram, e contemporâneos dele, como Frank Harris, contam detalhes de tudo e até mesmo dão oportunidade a Alfred Douglas de rebater. Está tudo no livro do Frank Harris (Oscar Wilde – Sua vida e confissões, 1916). Pinçamos e conectamos isso ao que dialoga com o presente, sem a necessidade de desconstruir ou modificar”, esclarece.
A viabilização do espetáculo foi possível graças a um edital do então chamado Cine Theatro Brasil Vallourec, com o patrocínio da Lei Federal de Incentivo à Cultura e do Ministério do Turismo por meio da Secretaria Especial de Cultura, do Instituto Unimed-BH e da Vallourec. Apesar disso, a ideia inicial era apresentá-lo com público, mas a produção foi surpreendida pelo novo fechamento dos teatros para o público em Belo Horizonte.
O jeito foi se adaptar para transmiti-lo pela internet. “É teatro também, mas é uma outra forma de teatro, outra linguagem, que é nova e que desconhecemos um pouco”, diz Abritta sobre o fato de ter que lidar com as câmeras em cena. Além dos três atores, o espetáculo conta com uma banda de quatro integrantes no palco, executando a trilha sonora.
Wilde. Re/Construído
Quinta-feira, 28 de janeiro, às 20h, no site www.cinetheatrobrasil.com.br. Ingressos: R$ 10, à venda no mesmo site.