Jornal Estado de Minas

LITERATURA

Novo livro de Xuxa é hino ao amor por criança que salva o pai


Aconselhada pela filha, Sasha, a apresentadora Xuxa Meneghel visitou a Aldeia Nissi, em Bié, Angola, uma região carente que sofreu com a guerra e onde hoje são cuidadas cerca de 1.200 crianças. E ela viajou com o plano de conhecer um menino em especial, cuja história extraordinária a inspirou a escrever Betinho – O amor em forma de criança, lançado agora pela Globo Livros (32 págs., R$ 52, com ilustrações de Monge Lua).





Trata-se de um garoto nascido numa família pobre. Para completar, seu pai ficou cego quando ele ainda era bebê, e a mãe, julgando-se incapaz de cuidar de todos, decidiu tentar a sorte em outro lugar. Um vizinho passou a cuidar de Betinho e do pai, buscando mantimentos em uma região distante.

A situação piorou quando ele anunciou que não conseguiria mais trazer comida. Apesar da pouca idade, Betinho entendeu a gravidade da situação e conduziu o pai, que se movimentava com uma bengala improvisada, até chegar à Aldeia Nissi, onde ambos foram acolhidos.

Desde o lançamento de sua autobiografia no ano passado, quando revelou assuntos incômodos (como o sofrimento com bullying e assédio sexual), Xuxa vem tomando posições mais firmes sobre temas como política e a guerra estabelecida nas redes sociais entre grupos de pensamentos antagônicos. Sobre o livro e outros assuntos, ela respondeu por e-mail às seguintes questões.




Como você chegou a esse personagem tão envolvente?
Sasha me apresentou o Betinho por meio de fotos, pois já tinha ido três vezes para Angola como missionária. Na quarta vez, fui junto. Eu já sabia que ia conhecê-lo. Assim que cheguei à aldeia, fui recebida com música, mais de 30 crianças cantando e dançando, um cachorro veio dar as boas-vindas e, logo depois, veio Betinho, que pediu colo e não saiu mais de perto de mim, foi uma conexão imediata.

A Aldeia Nissi parece ser repleta de pessoas com histórias tão tocantes como a de Betinho. O que, de fato, mais te impressionou na história dele?
Sim. Muitas histórias pesadas e chocantes. A do Betinho me fascinou quando ouvi o pai dizer que acha que ele tem dois anos, pois não sabe ao certo o dia em que nasceu. E, mesmo pequeno, ele pegou a bengala (na verdade, um pedaço de madeira) e puxou o pai cego por quilômetros até achar a aldeia. Ninguém sabe direito o que se passou na cabeça dele, nem vai saber. Mas ele apareceu lá em busca de comida. Mas como um bebê consegue fazer isso? Se hoje fala pouco, na época, menos ainda. O que me intriga é como ele cuida do pai, é tão responsável e com tanto carinho para dar. O esperado de uma criança seria o contrário, por isso senti vontade de mostrar sua história. 

Quais outras histórias que você descobriu lá e que mereceriam ser contadas em livro?
Hummmm... São pesadas para livros infantis, mas estão escritas e gravadas na minha alma.





Você se interessaria em escrever a história de alguma criança ou animal que tiveram de enfrentar o isolamento social, provocado pela pandemia?
Não. As pessoas não estão nem acreditando no vírus, como acreditariam na minha história?

Você já disse que era uma pessoa que não tinha opinião própria, preferindo usar a dos outros.
Preferindo não, me era passado: "Você tem que falar isso".

Agora, se sente dona da própria voz. Assim, o que pensa sobre o que ocorre no Brasil no combate à COVID-19?
Uma vergonha, que vai fazer parte da nossa história para sempre. Um desgoverno em uma pandemia, uma falta de respeito.

A internet tem acentuado a criação de bolhas, com as pessoas só recebendo informações que lhes agradam. Isso faz com que muitas acreditem mais no que recebem das redes sociais do que em notícias divulgadas por meios confiáveis. Como uma pessoa com muita presença na internet, como você, lida com isso?
Lido de uma maneira ruim e estou com medo, pois não vejo melhora nessas desinformações desnecessárias, muitas fake news em um momento no qual deveríamos nos alimentar de informações corretas. E isso pode gerar uma guerra.  (Estadão Conteúdo)