Veterano diretor e produtor norte-americano, Joe Berlinger se especializou em documentários sobre crimes reais. Sua maior realização é a série Paradise lost, três filmes produzidos pela HBO (1996, 2000 e 2011, este último indicado ao Oscar) que acompanham as vítimas de um dos mais ruidosos casos de erro jurídico dos EUA nas últimas décadas. Em Os três de West Memphis, três adolescentes foram considerados culpados da morte de três escoteiros.
Sem ter nada a ver com o crime, passaram quase 20 anos encarcerados, um deles no corredor da morte, e o caso foi revisto graças à extrema pressão da opinião pública. Foram soltos em 2011. Muito da repercussão da história deveu-se aos filmes dirigidos por Berlinger.
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O “local infame” é o Hotel Cecil, que nasceu como um hotel de luxo no centro de Los Angeles em 1924. Pois a Grande Depressão de 1929 representou o primeiro baque para a edificação com 700 quartos, que sofreu um processo de deterioração nas décadas seguintes. A vizinhança é o chamado Skid Row, conjunto de 54 quarteirões conhecido como a maior cracolândia dos EUA, reunindo alguns milhares de sem teto.
No coração do Skid Row, o Cecil se tornou morada de criminosos e viciados – assassinatos e suicídios tornaram-se frequentes ao longo de sua história. Mas com tarifas baixíssimas, atraiu também turistas desavisados, que se encantaram com o saguão art déco para logo descobrir quartos caindo aos pedaços. É esse o perfil de Elisa Lam, personagem central da narrativa.
Universitária canadense de 21 anos, a filha de imigrantes chineses chega ao Cecil sozinha para alguns dias. Não sai viva dali. Dada como desaparecida em 1º de fevereiro de 2013, seu corpo só é descoberto 19 dias mais tarde. O caso viralizou quando a polícia de Los Angeles, sem pistas, divulgou o vídeo de quatro minutos da jovem no elevador do hotel, o último registro dela com vida.
Assista ao trailer:
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Desenvolvimento da série parte de premissa errada
Esse é o plano geral da minissérie. A maneira como Berlinger a desenvolve é que é o problema. Ele entrevistou personagens cruciais, como os detetives que investigaram o caso, o legista, a gerente-geral do hotel, o funcionário que encontrou o corpo. Mas deu maior ênfase aos autodenominados “detetives da internet”, na verdade pessoas sem muita ocupação que passam seus dias criando teorias da conspiração e as divulgando nas redes sociais.
A morte de Elisa Lam, ainda que trágica, foi simples. Não é o caso de contá-la aqui, mas qualquer busca na internet traz todos os detalhes da história. A questão é que a série, para tentar criar suspense, forja situações que não existem. Pior: dá voz a quem não devia, pois são vários depoimentos (alguns tirados de blogs e do YouTube) dos tais “detetives” de meia-pataca que só fizeram atrapalhar a investigação e confundir o público.
Não se ouviu nem sequer um amigo ou familiar de Elisa Lam. As únicas imagens dos pais e da irmã dela vieram de uma coletiva de imprensa (em que não falaram nada) logo que o desaparecimento foi anunciado. Não se ouviram as duas colegas de quarto que se estranharam com ela.
Por outro lado, volta e meia se vê um casal de turistas britânicos falando nada de relevante sobre o período que ficaram hospedados no hotel (na mesma época de Elisa). Ou então dois youtubers que passaram dias e noites “respirando” Elisa Lam simplesmente porque não tinham nada de produtivo para fazer. Ou a psicóloga que nada mais disse além do óbvio a partir do blog da estudante.
A intenção da série é “desconstruir a mitologia e os mistérios” de um crime. Pois a premissa já está errada, pois não houve crime nenhum na morte da universitária.
Atirando para todos os lados – num momento fala de doença mental, no outro sobre abusos na internet –, indo e vindo no tempo, vai cozinhando o espectador ao longo de quatro episódios. A história, se bem realizada, poderia ter gerado um longa-metragem. E só.
CENA DO CRIME – MISTÉRIO E MORTE NO HOTEL CECIL
Minissérie em quatro episódios. Disponível na Netflix