'Bacurau' (2019) não terá vida fácil para se tornar o primeiro longa-metragem brasileiro indicado a melhor filme no Oscar. O longa de Kleber Mendonça Filho e Juliano Dornelles foi considerado apto a concorrer na 93ª edição do prêmio da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas de Hollywood, nas categorias melhor filme, ator (Udo Kier) e atriz (Sonia Braga).
Ocorre que são 366 títulos elegíveis para a principal estatueta neste ano. Mais de 70 deles são produções estrangeiras, assim como “Bacurau”, que tentam igualar o feito de “Parasita”, o longa sul-coreano vencedor do Oscar 2020 – e de três outras categorias: direção (Bong Joon-ho), roteiro e melhor filme internacional.
De acordo com as regras implementadas para essa edição do Oscar, os longas habilitados a concorrer foram lançados em pelo menos um cinema comercial de determinadas cidades dos EUA (Los Angeles, Nova York, Chicago, Miami e Atlanta) e exibidos por sete dias consecutivos. Os cinemas drive-in foram incluídos como locais qualificados devido à pandemia da COVID-19. Filmes destinados ao lançamento em cinemas, mas inicialmente disponibilizados em plataformas de streaming, também estão aptos a competir.
A votação das nomeações pela Academia começa nesta sexta-feira (5/3) e termina na próxima quarta-feira (10/3). As indicações para o 93º Oscar serão anunciadas em 15 de março, e a cerimônia está prevista para o domingo, 25 de abril. “Bacurau” e o documentário “Protocolo da morte”, de André Di Mauro, são os dois brasileiros qualificados na disputa.
A última vez em que o Brasil disputou o Oscar foi em 2004, com “Cidade de Deus” (2002). O longa de Fernando Meirelles foi indicado nas categorias direção, fotografia (Cesar Charlone), roteiro adaptado (Braulio Mantovani) e edição (Daniel Rezende), mas não conquistou nenhuma estatueta.
Brasil e Chile são os únicos países da América do Sul presentes na pré-lista da premiação mais importante do cinema internacional. Entre os concorrentes europeus está a comédia dinamarquesa “Druk”, de Thomas Vinterberg, protagonizada por Mads Mikkelsen, um dos atores nórdicos mais conhecidos em Hollywood. Ele participou de produções como “Doutor Estranho” (2016), “Hannibal” (2013-2015), “007: Cassino Royale” (2006) e “Fúria de titãs” (2010), e está no elenco de “A caça” (2012), também de Thomas Vinterberg, indicado ao Oscar de melhor filme estrangeiro.
Em “Druk”, para alegrar um amigo em crise, quatro professores decidem testar a teoria de que serão mais felizes e bem-sucedidos vivendo com um pouco de álcool no sangue. A Rússia tem no páreo “Caros camaradas!”, de Andrei Konchalovsky. O drama histórico retrata o massacre de Novocherkassk, em 1962, após a revolta gerada pela greve dos operários de uma fábrica local, na antiga União Soviética. O longa concorreu em 2019 ao Leão de Ouro em Veneza e recebeu o Prêmio Especial do Júri.
Latinos retratam tradições
Dois filmes latinos despontam na lista com narrativas que retratam tradições e histórias de suas nações. “La Llorona”, de Jayro Bustamante, pode ser o primeiro filme da história da Guatemala a disputar o Oscar de melhor filme. O longa aborda a guerra civil guatelmateca da década de 1980 sob o prisma do terror. O Panamá tenta a mesma façanha com o drama “The family tree” (2020), de Jorge Ameer. Na trama, uma antiga tradição natalina local vai mostrar para o protagonista, Vitor Gardel, o verdadeiro significado do amor, da amizade e da família.País que mais vezes venceu a categoria filme internacional (14 vezes ao todo), a Itália tem nada menos do que cinco títulos habilitados à disputa na categoria principal. Entre eles, "Pinóquio" (2019), de Matteo Garrone, versão live action e sombria do personagem em meio à pobreza da Toscana, no século 19.
"O traidor" (2019), de Marco Bellocchio, aborda a história de Tommaso Buscetta, um dos mafiosos mais relevantes da Itália e o principal informante da polícia na operação que desmantelou o crime organizado no país e tem a brasileira Maria Fernanda Cândido no elenco.
Já em “Rosa e Momo”(2020), de Edoardo Ponti, uma sobrevivente do Holocausto acolhe um garoto de 12 anos que recentemente a roubou, dando ínicio a uma amizade improvável. O longa é uma das apostas da Netflix para se dar bem no Oscar 2021.
“La nuit des rois” (2020), de Philippe Lacôte, produção da Costa do Marfim, foi premiado no Festival de Toronto e selecionado para o de Veneza. Na trama, um jovem é mandado para a prisão de La Maca, onde é designado a contar uma história para os outros detentos, com sua sobrevivência em jogo. Ele só se manterá vivo se o “público” gostar da história contada.
Órfãos são aposta oriental
Na ausência da Coreia do Sul, o filme japonês “We are little zombies”, de Makoto Nagahisa, é a grande aposta oriental para o Oscar. O longa trata de quatro órfãos que decidem formar uma banda para recuperar a capacidade de sentir emoções, depois que perdem os pais. O longa foi premiado em Berlim e em Sundance por sua “originalidade”.
O indiano “Soorarai Pottru”, de Sudha Kongara, é a esperança da Amazon Prime na cerimônia. Inspirado no livro "Simply fly", o filme conta a história de Nedumaaran Rajangam, homem que se propõe a fazer as pessoas comuns voarem de avião e, nesse processo, enfrenta as grandes empresas do setor de aviação.
Além disso, 14 animações concorrem pela nomeação por diferentes países: Croácia, França, Japão, Dinamarca, Maurício, Polônia, Nova Zelândia, Rússia, China, entre outros. Anteriormente voltada para o público infantojuvenil, as produções, hoje, atraem todos os gostos. Tem desenho animado de aventura, terror, ação, musical, drama, comédia e romance na disputa.
Além do brasileiro "Protocolo da morte”, sobre entubação orotraqueal precoce em pacientes de COVID-19, que traz depoimentos de médicos especialistas do Brasil e dos EUA, outros 88 documentários estão na lista de filmes elegíveis. Em 2020, o Brasil foi finalista na categoria melhor documentário com “Democracia em vertigem”, de Petra Costa. Assim como “Protocolo da morte”, outras três produções ou coproduções norte-americanas retratam a pandemia de COVID-19 e suas consequências: “Coronation” (2020), “76 days” (2020) e "Totally under control” (2020).
O Chile é representado pelo documentário “Agente duplo”, de Maite Alberdi, que está entre os pré-selecionados a melhor filme internacional, assim como “Druk”. O Chile venceu seu primeiro Oscar em 2017, com “Uma mulher fantástica”, de Sebastián Lelio.
Casa Branca marca presença
Ex-ocupantes da Casa Branca são temas de alguns documentários habilitados pela Academia. A família Obama comparece em “Minha história”, cinebiografia de Michelle Obama, e “The way I see it”, que compara as perspectivas do democrata Barack Obama e do republicano Ronald Reagan.
O casal Obama ainda atua como produtor executivo do documentário “Crip camp: Revolução pela inclusão”, que retrata um movimento de jovens deficientes em busca da igualdade. O longa está disponível na Netflix. A parceria entre os Obamas e o serviço de streaming já rendeu bons frutos. Em 2020, os dois foram produtores de “Indústria americana", que faturou o Oscar de documentário, superando o brasileiro “Democracia em vertigem”.
O ex-presidente Jimmy Carter também é contemplado na lista com um documentário que discute sua relação política com a música: “Jimmy Carter: Rock & roll president” (2020).
“Meu nome é Greta” (2020), de Nathan Grossman, também está entre os elegíveis. O longa conta a história da ativista ambiental sueca de 18 anos Greta Thunberg, eleita personalidade do ano pela revista Time em 2019 e apontada como provável indicada ao Nobel da paz.
*Estagiário sob supervisão da editora Silvana Arantes