O formato é múltiplo: vídeos, fotos, performances, danças e audiocartas. O objetivo: disseminar carinho e amor. Foi essa a inspiração do projeto “É só uma carta de amor”, agora com conteúdo disponibilizado até domingo (14/03) por meio das redes sociais do MOB Coletivo (@mobcoletivo). A proposta foi dividida em três etapas, como o envio das cartas pelo público, que ocorreu até 28 de fevereiro, a exposição on-line e o encaminhamento do material pelo correio.
Idealizadora, Andreza Coutinho, formada em artes visuais e pós-graduada em design e cultura, confessa que teve dificuldade em manter viva sua ideia no contexto da pandemia. “Lá atrás, quando isso tudo começou, eu relutei. Pensei: ‘As pessoas vão esquecer os artistas, vão esquecer os que andam de metrô, de ônibus... não tem sentido eu fazer esse projeto agora, porque ele vai cair no lugar de romantismo, de tipo ah, gente, tá tudo bem’. E não tá tudo bem”, conta.
Como ela não desistiu, a proposta foi adiante e nesta quarta-feira (10/3), por exemplo, a programação contará com o vídeo “Carta para uma cura”, de Kako Arancibia, às 9h, e com uma live de Joelma Barros e Daniela Graciere, das 20h às 21h.
“Um belo dia, me deu um clique e eu entendi que podia falar do silêncio… não de um silêncio no sentido de a gente se calar perante tudo que está acontecendo, mas de um silêncio interno, para a gente refletir, e que o projeto podia chamar as pessoas para essa reflexão, principalmente com relação ao artista”, completa Andreza, ao contar por que abriu mão de renunciar à ideia.
Filha de um saxofonista e de uma artesã, Andreza respirou arte desde cedo. Fundou o grupo MOB há 10 anos. “Em 2011, eu já achava que as pessoas corriam demais, não tinham tempo para se relacionar, e eu queria que as coisas fossem escritas com máquinas de escrever ou a mão, em um local para as pessoas se sentarem e tomar um cafezinho. A ideia era ser uma instalação do encontro.”
A seleção das cartas foi feita por meio de formulários do Google, enviados por artistas. Além dos diferentes formatos para os quais as cartas foram adaptadas, há algumas peculiares, em braile e em libras. Haverá ainda exposição de fotos no Instagram, o lançamento de livro sobre a edição do evento, um sarau on-line com a equipe do Apoema Sarau Livre e a disseminação de um QR Code, a partir do qual vídeos e cartas poderão ser acessados.
Um dos destaques do projeto, e que terá seu vídeo divulgado nesta quarta-feira, é Kako Arancibia. Em pouco menos de cinco minutos, ele transmite uma mensagem de solidariedade. “Através da arte, fui fazendo vínculos e aprendizados com as reflexões sobre gênero e sexualidade, e que me fizeram olhar pra mim enquanto pessoa que vivia com HIV. Eu vivia com HIV totalmente no segredo, e através da arte, da vivência, de cruzar caminhos com outras pessoas e com outras reflexões eu acabei aos poucos me tornando um ‘artevista’.”
PALAVRAS
Em “Carta para uma cura”, como é chamado seu vídeo, ele desenha veias e carimba palavras variadas em seu corpo, fazendo uma relação entre a disseminação do vírus da Aids e a circulação de palavras, tanto de apoio quanto de impacto negativo, com as quais convivem os portadores do HIV.
“O que eu percebi nessa história de ativismo com relação ao HIV é que, muitas vezes, não vale a pena falar de mim. Não dá pra negar que a carta nasce de uma vivência própria, mas eu não diria que ali tem um relato da minha história. É uma carta para outras pessoas. A partir do lugar que eu sinto que ocupo hoje, de aprendizado e força com relação a viver com HIV publicamente, é como se eu endereçasse essa carta para todas as pessoas que eu acho que precisam de um apoio, de uma conexão, e que, muitas vezes, não podem viver isso abertamente”, conta Kako.
*Estagiário sob a supervisão do subeditor Eduardo Murta