As cortinas estão fechadas, a bilheteira ficou sem as animadas filas e o palco se encontra vazio. Mas, mesmo no silêncio provocado pela pandemia do novo coronavírus, as veias da cultura mineira pulsam e mantêm viva a tradição de um espaço que, neste domingo (14/3), se torna cinquentão e oferece ao "respeitável público" uma programação virtual para celebrar o aniversário de meio século.
Estrela maior da Fundação Clóvis Salgado (FCS), o Palácio das Artes, na Avenida Afonso Pena, na Região Centro-Sul de Belo Horizonte, ganha a campanha especial 50 Anos em 5 Atos, com exposição interativa e imersiva e outras atividades on-line, que ficarão "em cartaz" nas redes sociais da instituição a partir de maio.
Segundo a presidente da FCS, Eliane Parreiras, é importante celebrar tanta história e o impacto da instituição na cultura mineira e brasileira, "fazendo reverência a todos que construíram essa trajetória, junto com o público fiel e afetivo, além de discutir os passos em direção ao futuro". Para Eliane, é um orgulho poder comemorar meio século de atividades de uma instituição cultural.
A presidente destaca: "O Palácio das Artes nasceu da visão de Juscelino Kubitschek (1902-1976), quando prefeito de BH, na década de 40, com a encomenda ao arquiteto Oscar Niemeyer (1907-2012) do projeto de um centro cultural diverso, no coração da capital e junto ao Parque Municipal. Com o tempo, ele cresceu e criou vínculos profundos com artistas, produtores culturais e o público mineiro. É sempre momento de discutir e reafirmar o papel dos espaços culturais como ponto de encontro, de convivência da diversidade, da nossa identidade cultural, da humanização, para a formação, reflexão, pensamento crítico e autonomia intelectual”.
O secretário estadual de Cultura e Turismo, Leônidas Oliveira, ressalta que o Palácio das Artes representa a síntese das artes mineiras. “Por esse palco passaram grandes artistas da nossa terra, de BH, do interior de Minas, do Brasil e do mundo. É com muito orgulho que nós louvamos esse grande espaço da arte. Parabenizo todos os técnicos, diretores e gestores que construíram e seguem construindo essa história de 50 anos. Que em breve, após esses dias que vivemos, esse lugar volte a ser o símbolo grande, máximo da arte mineira."
Tendo como inspiração o famoso slogan do programa de governo de JK para o Brasil em 1954, quando candidato à Presidência da República, “50 anos em 5” (50 anos de progresso em 5 anos de realizações), o aniversário do Palácio das Artes será festejado, a distância, mas de mãos dadas com o público para enaltecer o passado e consolidar o espaço como referência cultural mineira em sintonia com a reinvenção digital.
Um vídeo que registra a multiplicidade cultural e de pessoas, ações e emoções presentes nesse espaço tão representativo para a cultura e a vida dos mineiros deverá ser publicado às 10h de hoje nas redes sociais da FCS.
PROGRAMAÇÃO
De maio a dezembro, a programação contará com cinco eixos temáticos, em ações virtuais e presenciais, incluindo exibição de histórias marcantes vivenciadas pelo público no Palácio das Artes, lives e depoimentos de funcionários, ex-funcionários e grandes artistas que fazem parte da trajetória do complexo cultural, podcasts e mini-documentários que abordam momentos marcantes da história do espaço.Haverá ainda uma exposição imersiva e interativa chamada “50 anos em 5 atos”, que ocupará a fachada, o hall de entrada e a Grande Galeria Alberto da Veiga Guignard, homenageando o cinquentenário da instituição.
Em destaque, estarão ainda programas que integram a agenda anual da FCS, como Concertos no Parque, Sinfônica POP, espetáculos dos corpos artísticos, mostras de cinema e exposições. As ações compõem o planejamento anual da instituição e terão seu calendário definido de acordo com as medidas sanitárias de enfrentamento à COVID-19, a cada novo momento.
Da portaria, na Avenida Afonso Pena, número 1.537, aos camarins, passando pelas salas de aula e de ensaio, o Palácio das Artes é um complexo de 18 mil metros quadrados, com quatro andares, circundado pelo Parque Municipal Américo Renné Giannetti, que vai muito além do teatro com 1,7 mil lugares no qual já se apresentaram nomes sagrados do drama e da comédia, da ópera e da dança, dos ritmos eruditos e populares.
No palco, foram "muitas emoções" em shows de Roberto Carlos, Maria Bethânia e outros grandes artistas. Ali, Baryshnikov dançou “O corsário”, Bibi Ferreira cantou Piaf e José Saramago ensinou o evangelho à luz da língua portuguesa. Ao som do seu bandoneon, Piazzola recriou o tango argentino, Madredeus emocionou com as vozes d’além mar e Sebastião Salgado trouxe imagens para eternizar um mundo de luz e sombras. E teve Elis Regina viajando no “Trem azul” e Antunes Filho impressionando com a montagem de “Macunaíma”.
Conforme a instituição, o Palácio das Artes é o maior centro de formação, produção e difusão cultural de Minas e um dos maiores da América Latina com esse perfil. Sede da Orquestra Sinfônica de Minas Gerais, do Coral Lírico de Minas Gerais e da Cia. de Dança Palácio das Artes, ele abriga o Centro de Formação Artística e Tecnológica (Cefart), com cursos básicos e profissionalizantes de artes visuais, dança, música, teatro e tecnologias da cena.
O complexo cultural dispõe de recursos cênicos e acústicos de elevado padrão técnico para a montagem de óperas, peças teatrais, concertos, espetáculos de dança e shows de música popular, além de galerias de artes visuais, cinema, e salas adequadas para lançamento de livros, palestras, congressos e seminários.
HISTÓRIA
A partir da idealização do então prefeito JK para a construção de um novo espaço para as artes na capital, o Teatro Municipal de Belo Horizonte, com projeto original de Niemeyer, as obras foram iniciadas em 1942. O arquiteto projetou o teatro de forma que a fachada ficasse voltada para o parque, ligado à Afonso Pena por uma passarela de concreto, mas as obras foram paralisadas em 1945.Dez anos depois, o arquiteto Hélio Ferreira Pinto foi convidado para redimensionar o projeto original do teatro, transformando-o no Palácio das Artes. Em 1966, o governador Israel Pinheiro assumiu o compromisso de concluir a obra, e o complexo cultural foi inaugurado oficialmente em 14 de março de 1971, com a abertura do Grande Teatro do Palácio das Artes em um concerto da peça “Messias”, de Händel, com regência de Isaac Karabtchevsky.
Outros espaços foram criados posteriormente, como o Cine Humberto Mauro (1978), Teatro João Ceschiatti e Galeria Arlinda Corrêa Lima (1984), Sala Juvenal Dias (1993), Galeria Genesco Murta (início da década de 1990), Galeria Mari’Stella Tristão (2016), PQNA Pedro Moraleida (2017) e Galeria Aberta Amilcar de Castro (2018).
TRÊS PERGUNTAS PARA...
Eliane Parreiras, presidente da Fundação Clóvis Salgado
1) Qual a importância do Palácio das Artes na vida cultural de Minas?
Ele tem importância fundamental para a cultura de Minas, tanto para artistas como para público, por ser um espaço que oferece produções artísticas em várias linguagens, seja das produções próprias ou externas.Durante muito tempo, foi uma das únicas opções de espaço cultural em Belo Horizonte, formando gerações. Ainda hoje, com o aumento dessa oferta na cidade, o Palácio das Artes continua exercendo papel estratégico de uma instituição com vida muito intensa e contribuindo para a democratização do acesso à cultura, à formação artística, ao processo de autonomia intelectual, de pensamento crítico e de reflexão.Tudo isso passa pelo que chamamos hoje de Mediação Cultural, que é a oferta ampliada e mediada de conteúdos adicionais que geram reflexões. Para o público é também o espaço do sentimento, da convergência, do encontro. Entendemos que o Palácio das Artes, do ponto de vista institucional, é um farol para a cultura mineira.
2) A senhora poderia destacar os principais projetos educativos oferecidos pela Fundação Clóvis Salgado?
O Cefart possui amplo e inovador programa pedagógico para profissionalizar e inserir jovens talentos no mercado de trabalho da cultura e das artes. São oferecidas, gratuitamente, oportunidades democráticas de acesso a formação cultural diversa, por meio de cursos técnicos, regulares e de extensão, com grande repercussão social. Para estimular a prática do fazer artístico, foram criados grupos jovens, como Big Band Cefart, Orquestra Jovem, Coral Infantojuvenil e Grupo de Choro, dos quais participam mais de 200 alunos, além de projetos de pesquisa e apresentações artísticas diversas. Como resposta ao isolamento social enfrentado atualmente, foi criada a plataforma Cefart Virtual, que permite a realização do ensino à distância, possibilitando a continuidade dos cursos regulares de teatro, dança, música, artes visuais e tecnologia da cena. Além disso, a escola também oferta o Educativo FCS, proposta de experimentação e inovação em práticas de mediação, pensada especialmente para o ambiente virtual. A ação formativa se dá ainda pela ampla oferta de debates, seminários e discussões que ampliam o potencial de reflexão e o conhecimento.
3) Para quando terminar a pandemia: o que podemos esperar de novo no Palácio das Artes?
O Palácio das Artes nunca esteve estagnado. Ele sempre se reinventou e sempre manteve vínculo muito estreito com artistas, produtores e o público. Passamos por um enorme desafio no ano passado, em função da pandemia, e tivemos que nos adaptar às mudanças no comportamento do público, dos artistas e na forma de produzir cultura. Acreditamos, mais do que nunca, que o futuro do Palácio das Artes passa pela mediação cultural, a relação do indivíduo com a arte e a cultura e o público como protagonista desta relação. A arte só se concretiza com o público, já que o espectador coproduz a narrativa e é aqui que estamos atuando e que celebramos com esse novo olhar para o futuro. Desenvolvemos o conceito de mediação cultural que é estruturado em três grandes eixos: mediação da informação, mediação de conteúdo e mediação crítica.
PROGRAMAÇÃO
FESTA DAS ARTES
ATO I - EXPOSIÇÃO 50 ANOS EM 5 ATOS
Período: maio a julho
Local: Grande Galeria Alberto da Veiga Guignard, Hall de Entrada e Fachada (Palácio das Artes, na Avenida Afonso Pena, 1.537, Centro de BH)
ATO II - PALACIANAS – HISTÓRIAS QUE INSPIRAM
Período: abril a dezembroAcesso: páginas da FCS no Instagram e no Facebook
ATO III - LIVES – PRATA DA CASA VALE OURO
Período de exibição: abril até dezembro de 2021
Exibição: canal da Fundação Clóvis Salgado
ATO IV - PODCASTS ECOS DO TEMPO
Lançamento: a partir de maio de 2021
ATO V - MINIDOCS ECOS DO TEMPO
Lançamento: a partir de junho de 2021Informações para o público: (31) 3236-7400
DEPOIMENTO
"Nunca vou me esquecer da primeira que fui ao Palácio das Artes. Pouco tempo após a inauguração, ainda adolescente, aceitei o convite de dois colegas, os primos Anderson Martins e Péricles Martins, para assistir à apresentação da orquestra sinfônica. A partir daquele dia, vi o que pude naquele palco: shows, peças de teatro, balés, musicais. Os braços da bailarina russa Maya Plisetskaya (1925-2015), do Balé Bolshoi, figuram entre os movimentos mais impressionantes que já vi. Eram de cisne, não duvido. O Madredeus ficou no coração. E o que dizer de Nara Leão, Gal, Bethânia, Milton, Chico e tantas outras vozes? Mas tenho uma falha no currículo: na primeira semana de Maria, Maria, com ingresso comprado, tomei umas e outras, à tarde, e perdi o horário. Só fui ver muitos anos depois".(Gustavo Werneck)
LINHA DO TEMPO
Confira os principais fatos na história da instituição
1909
Belo Horizonte tem 12 anos de fundação, quando é inaugurado o Teatro Municipal, na esquina das ruas Bahia e Goiás, no Centro. Em 1942, o local é transformado em cinema e demolido 41 anos depois.
1942
Prefeito Juscelino Kubitschek inicia obra do Teatro Municipal, projetado por Oscar Niemeyer. Voltado para o Parque Municipal Américo Renné Giannetti, ele seria ligado à Avenida Afonso Pena por passarela.
1945
Obra do teatro é paralisada. Cidade recebe, em caráter provisório, o Teatro de Emergência, mais tarde denominado Teatro Francisco Nunes e localizado dentro do Parque Municipal.
1955
Projeto original do Palácio das Artes é reformulado pelo arquiteto Hélio Ferreira Pinto, abrigando, além do teatro, sala de exposição, museu de gravura e anfiteatro.
1966
Governador Israel Pinheiro assume o compromisso de concluir o Palácio das Artes.
1970
Em 30 de janeiro, o Palácio das Artes é inaugurado na Avenida Afonso Pena.
1970
Em 3 /9, é publicado o decreto que regulamenta a Lei nº 5.455 de 10/6/70, que instituiu a Fundação Palácio das Artes.
1971
Em 14 de março, abrem-se, pela primeira vez, as cortinas do Grande Teatro do Palácio das Artes, com apresentação de “O Messias” (foto), de Haendel.
1978
Em 20 de setembro, a Lei nº 7.348 muda o nome da Fundação Palácio das Artes para Fundação Clóvis Salgado, instituição vinculada à Secretaria de Estado da Cultura
1997
Em 7 de abril, um incêndio destrói o Grande Teatro do Palácio das Artes.
1998
Em 27 de julho, depois de 15 meses de obra, o Grande Teatro é reaberto ao público