O coletivo mineiro Sala Vazia lança nesta terça-feira (30/3), às 20h, a adaptação de “Tito Andrônico”, uma das obras mais sanguinárias de William Shakespeare, em versão pop, contrastando a violência presente no texto com a cultura dos anos 80.
Em um jogo audiovisual dividido em cinco partes, o público decide, entre 600 combinações possíveis, qual versão quer assistir de cada ato da videodança “Tito: uma videópera pop do cerrado mineiro em chamas”. O material será disponibilizado de forma gratuita no canal do coletivo no YouTube.
No original de Shakespeare, o poderoso general da Roma Antiga Tito Andrônico volta triunfante da guerra contra os godos. No entanto, sua recusa em tornar-se imperador e as sucessivas mortes em decorrência da disputa pelo trono desencadeiam uma onda incessante de vingança.
Fernando Barcellos, de 34 anos, bailarino do coletivo Sala Vazia e diretor da videodança, afirma que a atemporalidade da obra shakespeariana motivou sua escolha da adaptação. “Em ‘Tito Andrônico’ (1594), ele identificou diversas violências que ainda reverberam na contemporaneidade, como o racismo, a misoginia, o embate pelo poder e a própria banalização do mal”.
Segundo Barcellos, seu objetivo nunca foi reproduzir literalmente essa violência no trabalho. Então o esforço de pegar um universo pop dos anos 80, que a princípio não tem nada a ver com a tragédia shakespeariana, foi uma tentativa de não cair nesse lugar comum dos estereótipos. O objetivo era fazer essas duas forças tão diversas e potentes se encontrarem”.
ESTÉTICA
As cores, os figurinos, o penteado e a maquiagem utilizados pelos bailarinos têm como referência a estética dos anos 80. A trilha sonora conta com hits nacionais e internacionais da época, emplacados por Michael Jackson, Cyndi Lauper, Titãs, Blitz e Xuxa.A linguagem do vídeo tem ecos da saga “Rocky, o lutador”, grande sucesso nos cinemas no período. Cada ato da videodança propõe uma espécie de luta de boxe entre os personagens. O resultado é marcado também pelo deboches e a ironia.
O diretor acredita que essas ferramentas servem como um meio de contestação política. “O deboche potencializa essas questões (relacionadas à violência). Você não precisa mostrar uma mulher sendo estuprada ou uma cabeça sendo degolada. Por meio dos artifícios da dança, posso criar isso de uma outra maneira, que, às vezes, impressiona mais do que propriamente a imagem no sentido estrito”, afirma.
A videodança é dividida em cinco atos, correspondentes à dramaturgia de "Tito Andrônico”. A narrativa depende da interação do público. Os duelos entre os bailarinos se inspiram nos games “Mortal Kombat” e “Street Fighter”. O espectador escolhe, entre cinco opções, que rumo da história deseja acompanhar.
Na descrição de cada vídeo serão disponibilizados os links que levam ao próximo passo da obra. Há 600 combinações possíveis. “A tônica de ‘Tito’ é saber qual jogador cada espectador vai escolher para ganhar esse jogo", explica Fernando.
O cenário dos duelos é o cerrado mineiro, em Uberlândia, unindo a dança com pautas ambientais. Barcellos conta que críticas às queimadas que estão devastando a vegetação local e um deboche explícito à tragédia de Mariana, em 2015, fazem parte da obra.
“Muitas pessoas me falaram que, depois de assistir ao nosso espetáculo, não conseguiam entender ‘Tito Andrônico’ de outra maneira, mesmo que a gente não traduzisse literalmente”, comenta o diretor. Nesta terça-feira (30/3), às 19h, a equipe do coletivo Sala Vazia promove uma live, em seu perfil no Instagram, para fazer um “esquenta” antes do lançamento do projeto no YouTube.
“Tito, uma videópera pop do cerrado mineiro em chamas”
Nesta terça-feira (30/3), às 20h, no canal do coletivo Sala Vazia no YouTube. Classificação indicativa: 14 anos. Duração: 30 minutos.
*Estagiário sob a supervisão da editora Silvana Arantes