“A despedida”, de Roger Michell, segue a cartilha daqueles dramas de prestígio de antigamente: cenário deslumbrante (no caso, uma casa moderna na Costa Leste dos Estados Unidos), personagens privilegiados e elegantes, que cozinham pratos sofisticados, e elenco invejável, que conta com Susan Sarandon, Kate Winslet, Sam Neill, Mia Wasikowska e Lindsay Duncan. Lançado em 2019, o filme chega agora a plataformas de streaming no Brasil.
Versão em inglês da produção dinamarquesa “Coração mudo”, dirigida por Bille August e escrita por Christian Thorpe, também autor da adaptação, trata-se de um drama familiar que costuma atrair atores com seu potencial para momentos cômicos, lágrimas e barracos épicos.
Como o título indica, o drama joga na equação “uma pessoa à beira da morte”. A matriarca Lily (Susan Sarandon) tem doença degenerativa e resolve não sofrer mais. Lily é dessas pessoas seguras, decididas e sarcásticas em face dos acontecimentos mais dolorosos. Convoca a família para passar o último fim de semana com ela e o marido Paul (Sam Neill), um Natal fora de época.
A certinha Jennifer (Kate Winslet) vem com o marido Michael (Rainn Wilson), um bananão, e o filho adolescente Jonathan (Anson Boon). A caçula Anna (Mia Wasikowska), a ovelha negra, chega atrasada e acompanhada da namorada não binária, Chris (Bex Taylor-Klaus). Também está lá uma antiga amiga da família, Liz (Lindsay Duncan).
Tudo parece relativamente em ordem, até que segredos começam a ser revelados e os conflitos afloram. A decisão de Lily não é bem aceita por todos. A morte, afinal, não é algo com que as sociedades ocidentais lidam bem.
DEUS
“Num mundo sem Deus, é mais difícil pensar sobre a morte”, comenta o diretor Roger Michell, famoso pela comédia romântica “Um lugar chamado Notting Hill”. “Os vitorianos tinham a vantagem de Deus. Disseram a eles que tudo ficaria bem, que depois da morte seria só felicidade, anjos, todo mundo sendo bacana com o próximo. Para eles, era mais fácil contemplar a morte. Nós deixamos para pensar nisso depois, quando, na verdade, é a única certeza da vida. É duro encarar nosso próprio desaparecimento.”
“Não queremos o fim”, resume Lindsay Duncan, vencedora de dois prêmios Olivier e um Tony. “Você se preocupa sobre como vai ser. Essa é a discussão interessante proposta pelo filme, porque, no final das contas, você não tem controle. Não sabe como vai deixar este plano. Mas se tiver inteligência emocional e coragem, pode pelo menos falar sobre o assunto.”
A atriz conta que costuma fazer piada sobre o tema, para facilitar o enfrentamento da morte. Mas sabe que o temor é também pela perda que quem amamos vai sofrer. “Eu me preocupo com quem fica para trás, o filme fala disso.”
A morte de Lily é apenas pretexto para explorar relacionamentos dos personagens. “É óbvio o amor que existe entre eles”, diz Duncan. Liz tem relação antiga e complexa com o casal formado por Lily e Paul, o que às vezes causa estranheza nas filhas. Jennifer e Kate são muito diferentes, mas enfrentam igualmente as cobranças da mãe.
TATUAGEM
Atores vieram de várias partes do mundo para as filmagens e ficaram confinados na única locação, a casa em Sussex, na Inglaterra, fazendo se passar por Connecticut, nos EUA. A união foi imediata. “É o único grupo de WhatsApp de que participo”, revela Duncan. O diretor e o elenco fizeram a mesma tatuagem, um melro-preto, pássaro que simboliza sabedoria e morte.
A culpa é de Kate Winslet, que Duncan descreve como “a melhor organizadora de programas que existe”. No último dia de filmagem, todos se reuniram para drinques e comidinhas, enquanto dois tatuadores fizeram a ronda. “Foi muito legal”, conta Lindsay Duncan, que fez ali sua primeira tatoo.
“A DESPEDIDA”
Direção: Roger Michell. Com Susan Sarandon, Kate Winslet, Sam Neill, Mia Wasikowska e Lindsay Duncan. Disponível no iTunes, Now, Google Play, YouTube Filmes, Vivo Play e Sky Play.