No cinema, a expansão de horizontes tem acoplado um interesse pelos talentos asiáticos, com uma projeção afirmada desde a vitória impactante do filme “Parasita”, numa corrente de reviravolta para os esperados moldes do Oscar de 2020. O filme de Bong Joon Ho, numa tacada, conquistou a dobradinha de prêmios de melhor filme (incluído o de melhor fita internacional para a Coreia do Sul), de melhor diretor e ainda foi reconhecido pelo roteiro. Ditando normas, o Oscar de 2021 trouxe surpresas nas indicações da chinesa Chloé Zhao (como melhor diretora de “Nomadland”) e ainda um efeito batizado “Minari”, candidato a seis prêmios.
Chloé Zhao – nome formatado para o brilho, uma vez que ela comanda o aguardado “Os eternos” (da Marvel) – revela uma corrente de talentos múltiplos e pessoais: é produtora, roteirista e montadora de “Nomadland”. A aclamação de talentos internacionais, como o que ela carrega, se estende em plataformas populares como o do streaming da Netflix, que recentemente anunciou a injeção de US$ 500 milhões em singulares produtos coreanos. Série de sucesso, “Sweet home”, por exemplo, é vista em 22 milhões de residências, enquanto coreanos já somam público de mais de 3,8 milhões de pagantes dos serviços do streming.
Com estreia em 13 de abril, a série multicultural “Meu amor,” que terá episódios em seis países (inclusive o Brasil), deriva do documentário “My love, don't cross that river”, assinado pelo coreano Jin Moyoung. Além da obra dele, o subúrbio de Tóquio vem representado no episódio com direção do japonês Hikaru Toda.
Junto a filmes asiáticos premiados em recentes festivais no exterior, a onda em particular coreana (chamada de Hallyu) estará fortalecida pelos filmes de produção autônoma no exterior – “Carter” (longa de ação encabeçado por um agente com memória falha, a ser comandado por Byung-gil Jung) e “Moral sense” (extraído de um webtoon abarrotado de sensualidade), ambos futuros títulos da Netflix. Confira nesta página alguns destaques nas produções orientais.
“MINARI”
Prestígio global – As memórias de punição, de respeito e devoção aos pais e de muita indiferença, dado o choque entre hábitos coreanos e a sociedade em que foi criado, levaram o cineasta Lee Isaac Chung a filmar “Minari”, longa que no Festival de Sundance tocou tanto o júri oficial quanto o público, numa dupla coroação de prêmios. Agora, depois de vencer controversa categoria de melhor filme estrangeiro na 78ª festa da Associação de Imprensa Estrangeira de Hollywood, que, por causa dos mais de 50% dos diálogos em coreano da fita, a tachou de estrangeira, “Minari” chega à final do Oscar destacado com seis indicações à estatueta. Centrado numa interiorana região de Oklahoma, nos anos de 1980, a narrativa conta destinos de cinco imigrantes. O diretor é norte-americano, mesma condição da empresa produtora, a A-24. Curiosamente, a projeção internacional do longa refletiu na Pancinema, empresa distribuidora do filme na Coreia. Empresários afirmam que há demanda pela revisão de obras antigas do diretor Lee Isaac Chung e dos atores Steven Yeun e Yuh-jung Youn, primeira atriz sul-coreana a ser indicada ao Oscar. Ela interpreta a avó, fonte de um amor transbordante e de pequenos gestos, como o de guarnecer a família com produtos quase proibitivos para os parentes, entre os quais anchovas e pimentas especiais. Temperado com emoção, o longa já tem na torcida pela estatueta de melhor filme personalidades como Lulu Wang (diretora de “A despedida”) e a chinesa Ming-Na Wen, conhecida como a Fennec de “The mandalorian”.
“RODA DA FORTUNA E DA FANTASIA”
Triângulos amorosos – Depois de destacado no Festival de Locarno, com o filme “Happy hour”, e de competir no Festival de Cannes, por “Asako I e II”, o japonês Ryusuke Hamaguchi, há algumas semanas, conquistou o Urso de Prata, como Grande Prêmio do Júri, no Festival de Berlim. Enquanto em “Asako” Ryusuke tratou de uma universitária impossibilitada do amor, a partir de um rompante do namorado que some, em “Roda da fortuna e da fantasia”, o novo filme com pontuação geométrica, o diretor traz contos de decepção, solidão e limitações em impulsos eróticos. Ele atribui a ruptura de comunicação, pouco fluida no Japão, como vetor decisivo para as relações dos personagens. Com ação condensada em ambientes simples, como um quarto pouco mobiliado de paredes brancas, o diretor aposta num filme entendido como repleto de “movimentos, a exemplo de uma peça musical”. Triângulos amorosos, relações iminentes, lesbianismo e literatura dão as caras.]
“INTRODUCTION”
Longevo – No 25º filme da carreira, Hong Sang-soo apresenta “Introduction”, a ser distribuído no Brasil pela Pandora. O longa faturou prêmios em Berlim, o Urso de Prata de melhor roteiro. Sempre detido na fotografia em preto e branco, Sang-soo ambienta o enredo entre a República da Coreia e a Alemanha. O júri do Festival de Berlim considerou o filme “brilhante e possuidor de lúcida verdade”, tendo se encantado pela sabedoria das figuras maternais dos personagens, prontas a intervir em destinos. Em 2020, Hong Sang-soo havia levado o título de melhor diretor na Berlinale, por “A mulher que fugiu”, protagonizado pelos choques no encontro entre quatro mulheres que circulam em Seul.
“VIVER PARA CANTAR”
China tradicional – Exibido na Quinzena dos Realizadores do Festival de Cannes, o longa do diretor estreante Johnny Ma se empenha em trazer apaixonada mensagem sobre a importância de se valorizar a tradição chinesa. A ameaça da ópera de Sichau, popular para um grupo de admiradores restritos, se dá na narrativa de “Viver para cantar”, por meio da influência externa de um mundo pop, pronto a soterrar o interesse de muitos, e ainda é gerada pela especulação imobiliária: um teatro é ameaçado pela quebra de valores da plateia e pelo desgarramento de uma das estrelas do grupo mantido integrado por supremo esforço da empenhada diretora do grupo Zhao Li. Um filme colorido e por vezes depressivo pelo registro do fim de uma rica era musical.
“BETTER DAYS”
Chegou lá – O representante de Hong Kong entre os cinco finalistas a competirem pelo Oscar de melhor filme internacional, “Better days” é dirigido por Derek Tsang. Conhecida como gaokao, uma rigorosa seleção estudantil traz o peso e a responsabilidade para Nian, cuja família depende do desempenho dela. Mas, não bastassem os frequentes episódios de bullying que a cercam, ela ainda se vê na encruzilhada diante de um pacto mantido junto a um tipo criminoso.
“A SUN”
Bateu na trave – Representante de Taiwan, “A sun” ficou selecionado na prévia entre 15 títulos pré-finalistas ao Oscar. Exibido na Netflix e dirigido por Mong-Hong Chung, mostra caminhos e descaminhos de dois filhos com um pai severo. Introspectivo, o mais velho tenta cursar medicina, enquanto o outro é acusado de um crime e segue para detenção. A namorada dele aparece grávida para complicar ainda mais a situação.
“Yasuke” e “Demon Slayer”
Animes em alta – Já em cartaz na Netflix, “Demon Slayer: Kimetser no Yaiba” vem adaptado de mangá de 2016, e agora está na primeira temporada no streaming. Com uma irmã amaldiçoada, o guerreiro Tanjiro busca cura e vingança para atos cometidos contra a família. Atração da Netflix a partir de 29 de abril, “Yasuke”, de LeSean Thomas, modula com fantasia a história de um ex-samurai. Vindo da África, um senhor feudal se transforma em lenda japonesa do século 16.