Embora ligado à fantasia e ao sobrenatural, o cinema fantástico estabelece suas conexões com temas urgentes do mundo real. Várias delas estão presentes na edição do Cinefantasy que começa nesta sexta-feira (16/4), em formato digital, na plataforma Belas Artes à La Carte .
Ao todo, serão exibidos 150 filmes de 70 países, divididos em 15 mostras temáticas, que incluem curtas, longas e documentários, disponíveis até o próximo dia 29. A abertura, às 18h de hoje, tem como atração “Horror noire: A história do horror negro”. O documentário norte-americano investiga a presença (ou a ausência) de artistas negros nos filmes de terror, ao longa da história do cinema.
Dirigido por Xavier Burgin, o longa lançado em 2019 é baseado no livro de mesmo nome escrito por Robin R. Means Coleman. A filmagem aborda a construção de estereótipos preconceituosos e a inexistente diversidade racial no cinema de gênero norte-americano, na primeira metade do século 20.
Por outro lado, destaca a blaxploitation dos anos 1970, de filmes como “Blacula, o vampiro negro”, de William Crain, até chegar na consagração de Jordan Peele, vencedor do Oscar de melhor roteiro original em 2018 com “Corra!”.
ACESSO
Além de Peele, o filme inclui depoimentos dos atores e atrizes Keith David, Tony Todd e Rachel True, da autora Tananarive Due, entre outros. A exibição do documentário de abertura será gratuita, mas limitada a mil acessos. Para assistir aos demais filmes do festival, é preciso assinar o serviço Belas Artes à La Carte (R$ 9,90 por mês).
A programação ainda inclui debates e outras atrações relacionadas aos temas mostrados nos filmes. Diretor e curador do festival, Eduardo Santana destaca que pautas sociais são uma preocupação da curadoria há algumas edições, com a criação das mostras temáticas “Fantástica diversidade”, dedicada a filmes com temática LGBT, e “Mulheres fantásticas”, formada por filmes dirigidos por mulheres.
“O cinema fantástico sempre teve essa preocupação, desde o (diretor norte-americano) George Romero (1940-2017), com a “A noite dos mortos-vivos” (1968), sempre com alguma crítica ao sistema. Com a pandemia, isso fica mais forte. A ficção vem para a realidade. A pandemia nos faz pensar em filmes fantásticos porque o que vemos agora, com exceção de momentos históricos, como a Gripe Espanhola, só víamos nos filmes”, argumenta Eduardo Santana.
O curador destaca na programação a exibição dos documentários “Narrativas do pós”, de Graubi Garcia e Jairo Neto, que questiona como as histórias serão contadas após a convulsão política e social que o Brasil atravessa, e o espanhol “O alvorecer de Kaiju Eiga”, de Jonathan Bellés, sobre a criação dos Kaiju Eiga: os “filmes de monstros gigantes”, como o Godzilla, e qual a relação deles com a ameaça da bomba atômica no Japão.
Ele cita também o brasileiro “A senhora que morreu no trailer”, de Alberto Camarero e Alberto de Oliveira, sobre a vida da artista brasileira Suzy King, encontrada morta no trailer em que vivia, na Califórnia, em agosto de 1985, e “Morgana”, dos australianos Isabel Peppard e Josie Hess, a respeito de uma dona de casa que, aos 50 anos, se reinventou como uma estrela de filmes sadomasoquistas. Segundo Santana, são exemplos de filmes de origens distintas que se conectam tematicamente.
Na mostra principal, dedicada aos longa-metragens não documentais, está o drama psicológico holandês “Porcelana” de Jenneke Boeijink, que mostra a ruína de uma família aparentemente perfeita.
Outro destaque é o suspense húngaro “Ravina”, de Balázs Krasznahorkai, sobre um obstetra prestes a se tornar pai que retorna à sua cidade natal para encarar um filho que ele abandonou 17 anos antes.
Há ainda o premiado “Amigo”, do espanhol Óscar Mártin, sobre a estranha ruptura na amizade de dois homens depois que um deles se acidenta, e o canadense "Sayo", de Jeremy Rubie, que mostra uma viagem entre dois mundos de uma jovem em busca de sua irmã que morreu. Os quatro filmes são inéditos no mercado brasileiro.
Ainda na mostra principal, quatro filmes são nacionais. “Rosa tirana”, de Rogério Sagui, gravado no sertão da Bahia; “Voltei!”, de Ary Rosa e Glenda Nicácio, filmado no recôncavo baiano, sobre duas irmãs que ficam escutando notícias no rádio e se surpreendem com a volta da irmã mais velha; “Como vivem os bravos”, de Daniell Abrew, faroeste nordestino ambientado em Palmácia (CE); e a distopia “Rodson ou (Onde o sol não tem dó)”, de Cleyton Xavier, Clara Chroma e Orlok Sombra, que imagina um futuro em que é proibido ler e consumir cultura, no qual vive Rodson, um garoto com instinto artístico que sai em busca da alucinação perfeita sob o sol de 2000°C.