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Estado de Minas MÚSICA

Osmar Milito, lenda da noite carioca, comemora seus 80 anos com novo EP

Pianista deu emprego a Djavan, tocou com Sérgio Mendes nos EUA e foi atração do Bottle's, Number One e Mistura Fina, casas que fizeram história no Rio


27/05/2021 04:00 - atualizado 27/05/2021 07:06

Osmar Milito (ao piano) e os parceiros Dalwton Moura e Luciano Franco em gravação realizada antes da pandemia (foto: Paulo Winz/divulgação)
Osmar Milito (ao piano) e os parceiros Dalwton Moura e Luciano Franco em gravação realizada antes da pandemia (foto: Paulo Winz/divulgação)

Para festejar seus 80 anos, comemorados nesta quinta-feira (27/5), o pianista e compositor Osmar Milito lança o EP instrumental “Milito Franco Moura”, parceria dele com os músicos cearenses Luciano Franco e Dalwton Moura.

Elogiado pianista de jazz e bossa nova, Milito tocou por quase dois anos com Sérgio Mendes na década de 1970, quando o brasileiro estava no auge da fama e lotava estádios nos Estados Unidos. Graças a ele, Djavan foi contratado, no início de sua carreira, para tocar no Rio de Janeiro.

O experiente pianista acompanhou várias estrelas internacionais em turnês brasileiras – entre elas, Sarah Vaughan, Tony Bennett, Sammy Davis Jr., Liza Minelli, Pat Metheny, Randy Brecker e Spanky Wilson.

O pianista Osmar Milito na contracapa de ''E deixa o relógio andar'', o primeiro CD lançado pela Som Livre (foto: Som Livre)
O pianista Osmar Milito na contracapa de ''E deixa o relógio andar'', o primeiro CD lançado pela Som Livre (foto: Som Livre)

FORTALEZA

Quatro faixas do novo EP foram gravadas em Fortaleza, antes da pandemia, na época em que Milito fazia shows no projeto “Jazz em cena”, realizado no Centro Cultural Banco do Nordeste.

O repertório traz duas faixas autorais do pianista – “Gafieira esperta” e “Forró brabo” –, ambas com a participação do contrabaixista Augusto Mattoso e do baterista Rafael Barata. Anteriormente, elas fizeram parte do álbum “Aos amigos tudo”, lançado em 2004.

O EP traz ainda as inéditas “Colibri”, de Luciano Franco, e “Reluz”, de Dalwton Moura. Já “Um sonho a mais”, de Franco, ganha releitura instrumental com a participação do saxofonista Jorge Matteus Doudement. “Mais que sonhar”, de Moura, registrada anteriormente no disco “Futuro e memória” pela cantora Kátia Freitas, ressurge em versão comandada pelo trombone de Barney Oliver.

Milito conta que, em sua temporada em Fortaleza, Luciano e o Dalwton lhe pediram músicas para colocar no EP. “Eu já tinha duas prontas, eles gostaram muito. Uma é o forró estilizado 'Forró brabo'. A outra, 'Gafieira esperta', é um samba bem jazzístico, com solos de piano, baixo e bateria. O disco ficou legal. Foi muito bom tocar com eles, pois, além de pessoas boas, são ótimos músicos. Têm canções lindas, são compositores muito bons”, elogia Osmar.

Participaram das gravações Luciano Franco (guitarra e baixo), Osmar Milito (piano), Jorge Matteus Doudement (sax-tenor), Barney Oliver (trombone), Iury Batista (contrabaixo acústico) e André Benedecti (bateria).

 Com a pandemia, Osmar Milito vem tocando muito em casa, pois adora estudar. “Estou aproveitando para fazer um disco autoral. Tenho um grande parceiro, o Paulo Sérgio Valle, que já está colocando letras nas minhas melodias”, informa o pianista paulistano.

“Certo dia, Paulo Sérgio me pediu algumas músicas, dizendo que gostava de minhas canções”, relembra. Osmar mandou a primeira, Valle adorou e pediu mais. “Comecei a mandar uma atrás da outra.”

Milito decidiu pôr letras nas melodias de seu álbum instrumental “Aos amigos tudo”, lançado em 2004. “São 13 faixas, só piano, baixo e bateria. A capa é um desenho do Chico Caruso. Na época, o disco ficou meio esquecido, porque no Brasil, infelizmente, não se consegue colocar música instrumental para tocar nas rádios. Decidi pôr as letras porque, caso contrário, ficaria um trabalho perdido”, explica. “O repertório terá duas ou três instrumentais e o resto com letras do Paulo Sérgio Valle.”

Agora, o pianista procura cantores para interpretar as parcerias dele com o letrista carioca e irmão de Marcos Valle. Paulo Sérgio é autor de vários sucessos: “Viola enluarada”, “Este teu olhar”, “Preciso aprender a ser só” e “Samba de verão”, além de “Evidências”, hit de Chitãozinho e Xororó, e “Se eu não te amasse tanto assim”, parceria dele com Herbert Vianna e sucesso de Ivete Sangalo.

“Estou fazendo esse outro álbum por prazer mesmo. Estou dando o meu melhor, sem aquele espírito de vender disco, de explodir na mídia e tal”, diz Osmar Milito.
(foto: Osmar Milito/divulgação)
(foto: Osmar Milito/divulgação)

“MILITO FRANCO MOURA”
• De Osmar Milito, Luciano Franco e Dalwton Moura
• EP
• Seis faixas
• Disponível nas plataformas digitais

Sylvia Telles (na foto com Tom Jobim e Marcos Valle) era espirituosa e alegre, conta Osmar Milito (foto: Youtube/reprodução)
Sylvia Telles (na foto com Tom Jobim e Marcos Valle) era espirituosa e alegre, conta Osmar Milito (foto: Youtube/reprodução)


Histórias com Sylvinha Telles, Maysa e Djavan


Osmar Milito tem muitas histórias para contar. Ele se mudou de São Paulo para o Rio de Janeiro em 1963, com o objetivo de estudar e trabalhar na capital fluminense. Fazia aulas de piano, mas ainda era amador. “Chegando ao Rio, fui aluno de piano da professora Wilma Graça. Acompanhei por dois anos a cantora carioca Sylvia Telles (1934-1966). Além de grande cantora, ela era muito legal”, comenta.

Em 1964, o pianista paulistano era atração da boate O Cangaceiro, em Copacabana, quando estourou o golpe militar. “No meio do show, acenderam as luzes e entrou o Juizado de Menores, que tinha um coronel no comando. Ele se aproximou da Sylvia e pediu os documentos dela”, relembra.

A cantora era uma pessoa engraçada e espirituosa. “Ela pegou a carteira cheia de cartões, jogou tudo no chão e começou a pular amarelinha. O coronel disse: ‘O que é isso, você está me gozando?’. E ela respondeu: ‘Não, o senhor me pediu os documentos e me senti tão jovem... Sou uma pessoa que tem 35 anos, uma filha de 5. Então, me senti uma garotinha, o senhor me desculpe'.”

Outro episódio divertido de Sylvia ocorreu no Bottle’s, templo da boa música no Rio de Janeiro. “O show já ia começar, apagaram-se as luzes e ela no corredor, com um copo de uísque na mão e o cigarro na outra. De repente, alguém chutou a porta. Era a cantora Maysa, meio de porre, que se aproximou e disse: 'Hoje vou tomar o seu marido', referindo-se ao produtor e compositor Aloysio de Oliveira (1914-1995). Sylvinha não se importou nem um pouco. E respondeu: ‘Puro ou com gelo?’. Rápida no raciocínio, ela era maravilhosa. Cantando balada, então, era um show...”.

Antes de tocar no Bottle’s, em Copacabana, Osmar Milito ia até lá assistir a apresentações de Luiz Eça (1936-1992), Johnny Alf (1929-2010), Sérgio Mendes e Luiz Carlos Vinhas (1940-2001) – os pianistas famosos da época.

“Fui conhecendo a galera e comecei a pensar em me tornar músico profissional. Mas eu era acanhado. O Dom Um Romão (1925-2005), baterista que tocava lá, sempre me chamava para dar canjas. Dizia: ‘Toca, pô!’. Comecei e nunca mais parei”, relembra Milito.

Já conhecido no Rio, o pianista paulistano se mudou para os Estados Unidos. “Fui para Los Angeles tocar com Sérgio Mendes. Rodamos o país com shows em estádios lotados, pois ele estava no auge da fama. Fiquei um ano e pouco, porém não aguentei o batidão. Eram shows para 30 mil pessoas ou mais, uma loucura. Ônibus e avião todos os dias.”

De volta ao Brasil, em 1967, Osmar Milito passou a acompanhar Chico Buarque, Ivan Lins, Marcos Valle e Nana Caymmi. No início da década de 1970, criou a própria banda para tocar na Number One, a primeira boate de Ipanema.

Ele deu emprego a muita gente boa. “Das minhas bandas fizeram parte Djavan, que começou comigo, o percussionista Paulinho da Costa, o grande trompetista Márcio Montarroyos (1948-2007), o baterista Paschoal Meirelles e os cantores mineiros Márcio Lott e Marilton Borges, entre tantos outros”, afirma.

Em 1971, Milito e seu grupo lançaram o disco “...E deixa o relógio andar”, o primeiro CD da gravadora Som Livre, segundo o pianista.
 
“Com essa banda gravei três LPs, mas os integrantes foram saindo para fazer outros trabalhos. Continuamos tocando na Number One por uns três anos. Depois fui para o Bar Flag, em Copacabana, e para o 706, em Ipanema. Djavan ficou comigo uns três anos.”

Em 1972, Milito gravou a trilha sonora do seriado “Shazan, Xerife e cia.”, produção infantil da TV Globo estrelada por Paulo José e Flavio Migliaccio (1934-2020).

“Gravei também o disco ‘As moças’, que foi um supersucesso. Cheguei a pôr quatro canções na parada de sucessos. Eram músicas da novela ‘O primeiro amor’ (1972). Na época, fiz um show no estádio do Grêmio, em Porto Alegre, que ficou lotado”, lembra o pianista.

Atração do Bar 21, no Rio de Janeiro, ele conta que jazzistas americanos que se apresentavam na cidade iam lá dar canjas. “Acompanhei Tony Bennett, Sara Vaughan, Sami Davis Jr., Liza Minelli.”

Nos anos 1980, Milito foi para a People, outra casa de sucesso na noite carioca. “Armei um grupo de dança e logo fui parar no Sobre as Ondas, em Copacabana, onde fiquei três anos. Depois fui para o Country Club, de 1986 a 1995.”

De 1992 a 2007, Osmar Milito e seu trio eram atração do Mistura Fina. “Lá foram 15 anos. Fiquei até 2007, quando ele fechou as portas”, conta. O pianista tocava com Rafael Barata (bateria) e Augusto Mattoso (baixo).

DISCOS

Milito lançou e trabalhou em vários discos, depois de estrear com “...E deixa o relógio andar”. 

Gravou “Nem paletó nem gravata”, “Maracatu atômico” (compacto de Jorge Mautner e Nelson Jacobina), “Que maravilha” (de Jorge Benjor e Toquinho), “Viagem” e “Na trilha de Osmar Milito – Temas de sucesso em novelas”.

Em 1978, lançou o disco “Lígia”, e, em 1992, “Brasil bossa nova”, com Wanda Sá e Pery Ribeiro (reeditado em 1998, com o nome de “Brilhantes”). Na década de 2000, gravou os CDs “Sonho de lugar”, “Aos amigos tudo” e “Unexpected”, esse último em parceria com a cantora hondurenha Indiana Nomma. (AP)


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