Nos últimos 12 anos, um sorridente, divertido e colorido cupcake conquistou o carinho da população belo-horizontina, ao aparecer sob várias formas, em diferentes cantos da cidade. Grafitado em muitas versões, o Bolinho é fruto do trabalho criativo da artista Maria Raquel, que tem o personagem como complemento de seu nome artístico. A partir desta quinta-feira (3/6), ela receberá convidados na Mostra de Arte do Bolinho – BH é quem?, com o intuito de evidenciar ao público os processos dessa criação.
No próximo dia 13, quando os trabalhos estiverem finalizados, as telas produzidas ficarão em exposição permanente no site do projeto. Todo o processo será documentado em um vídeo, a ser exibido no canal do Bolinho no YouTube. "Sinto que as pessoas em geral não têm ideia de como é feito o grafite. Veem na parede, mas não sabem dos processos. Muita gente me pergunta como é, quais materiais eu uso, tem dúvidas sobre as técnicas. Ainda há um certo misticismo. Por isso é uma coisa legal abrir esse processo", afirma Maria Raquel.
DESAFIO
A artista, que já grafitou centenas de bolinhos por BH desde 2009, destaca que a pandemia configura um período "muito desafiador" para a arte urbana. "Meu trabalho é feito na rua, e vivemos uma época em que não podemos sair na rua. Nesses 12 anos, esse foi o período mais difícil. Tive que trazer as características do Bolinho da rua para casa através da tela, do desenho. Foi a parte mais complicada", comenta Maria Raquel, que é graduada em artes visuais pela Universidade do Estado de Minas Gerais (Uemg), e em letras pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).Diante da flexibilização das medidas de isolamento e da possibilidade de retornar aos cenários urbanos, o Bolinho reencontra sua missão de dialogar com o tempo presente. "Depois que as coisas se afrouxaram, o Bolinho tinha até a obrigação de falar disso, de como tem sido a vida nesse tempo, do uso de máscara, etc. Ele sempre teve essa característica de falar do momento, do meme, das coisas atuais. E isso é bem natural para mim", diz Maria Raquel, que se define como uma pessoa "bem louca da internet, muito ligada em tudo o que está rolando, e o Bolinho pegou isso".
'Meu trabalho é feito na rua, e vivemos uma época em que não podemos sair na rua. Nesses 12 anos, esse foi o período mais difícil. Tive que trazer as características do Bolinho da rua para casa através da tela, do desenho. Foi a parte mais complicada'
Maria Raquel Bolinho, artista
MÁSCARA
Esse aspecto é um dos motivos que justificam o carisma da personagem, na opinião de sua criadora. "Gosto muito de contar a história das épocas, do que foi acontecendo em BH e no mundo. Tivemos o Bolinho das manifestações, em 2013, por exemplo. Agora é o Bolinho de máscara", diz a grafiteira, que compara a atividade com a dos cartunistas."Tem isso de ir contando, de forma bem-humorada, o que vem acontecendo no nosso tempo. A história do Bolinho se mistura com a história de BH. Ele surge no Duelo de MCs, quando conheci outros grafiteiros, numa cena que crescia bastante", relembra.
Destacar essa efervescência dos movimentos ligados à arte urbana em Belo Horizonte também é um dos objetivos da mostra que se inicia amanhã. A artista Clara Valente será a primeira convidada. Formada em artes plásticas pela Escola Guignard, Clara se especializou em pintura e desenho. Seu trabalho tem o tridimensional ligado à natureza e às paisagens lúdicas como principal traço. A ideia é que o Bolinho se conecte a essa proposta.
"É muito legal participar desse projeto dessa artista, que é um ícone da arte urbana de BH. Fico muito honrada. Nosso trabalho é bem distinto um do outro, mas o Bolinho se insere em tudo. Vou fazer meu trabalho, e ela vai inserir o Bolinho ali, nessa atmosfera mais ligada à natureza", diz Clara, que reforça a importância do evento para a coletividade da arte urbana na cidade. "O Bolinho tem muitos seguidores. Assim, muita gente que não conhece nosso trabalho fica conhecendo”, prevê.
Clara diz já ter um esboço articulado com Maria Raquel. O público poderá ver essa ideia ir para a tela de 1,5m x 1,5m. Para a criadora do Bolinho, essa produção compartilhada é também um grande atrativo. "Fazer uma pintura com outra pessoa é um processo difícil. No grafite, gostamos de fazer parcerias, mas muitas vezes são desenhos separados dentro de um mesmo tema. Então, isso é legal de acompanhar, principalmente isso de pensar um trabalho a dois, um incorporando coisas do trabalho do outro", argumenta Maria Raquel Bolinho.
Os outros cinco convidados se juntarão a ela, um a cada dia, até o próximo dia 12. A ideia é produzir grandes telas com o personagem principal, sempre utilizando as técnicas do grafite, com spray.
Nesta sexta-feira (4/6), será a vez de Lucas Skritor, grafiteiro, tatuador e artista plástico, que desde 2009 espalha letras e painéis por Belo Horizonte. No sábado (5/6), o convidado será Nowone, que marca presença nos muros da cidade com a pintura há pelo menos 10 anos.
Na próxima semana, a programação terá o multiartista Comum, na quinta-feira (10/6). Desde 2004, ele desenvolve trabalhos em diferentes modalidades da arte urbana e das artes plásticas, como grafite, stencil, muralismo, lambe-lambe e gravura. No dia seguinte, Bolinho receberá a artista, grafiteira e ilustradora autodidata Fênix. Atuante na cena de arte urbana mineira desde 2016, seu trabalho prioriza as culturas afro e indígena.
Por fim, no sábado (12/6), o convidado será João Marcelo Goma, um dos mais cultuados nomes da arte urbana da capital mineira, responsável por diversos murais e grafites espalhados pela cidade. "BH tem uma cena muito grande, mas muitas pessoas não sabem como procurar, como chegar até os artistas, nem quem são os autores dos trabalhos que veem por aí. Nem todos têm uma popularidade. Nossa mostra tem objetivo de promover isso", afirma Maria Raquel Bolinho.
Mostra de Arte do Bolinho – BH é quem?