A Orquestra Ouro Preto , que viveu um movimento de altos e baixos desde a chegada da pandemia, com períodos de maior atividade e outros de latência, entrou neste mês de agosto com um horizonte repleto de atividades. No próximo domingo, (08/08), no encerramento do Festival do Patrimônio Cultural de Paracatu, será apresentado um concerto em homenagem aos Rolling Stones , às 18h30, com transmissão ao vivo e gratuita por seu
canal no YouTube.
No próximo dia 20, o grupo lança o álbum “Ritmos brasileiros”, projeto que vem sendo desenvolvido desde 2019 com o Duo Desvio, de percussão, e será disponibilizado em uma plataforma digital interativa no site da orquestra.
Sobre a apresentação do próximo domingo, em tributo à banda britânica, o maestro Rodrigo Toffolo explica que a ideia começou a tomar forma a partir da live “Você decide”, realizada no mês passado, em que duas músicas eram oferecidas para que o público pudesse, em tempo real, escolher qual seria executada.
''Rolling Stones pede da orquestra uma energia muito peculiar, um estado de espírito diferente. Acho que Stones requer uma inquietação maior, uma pegada mais firme, mais elétrica, ao passo que os Beatles têm aquelas melodias que falam por si só''
Rodrigo Toffolo, maestro da Orquestra Ouro Preto
BATALHA
“A ideia era fazer uma espécie de batalha musical. Uma orquestra que gravou Beatles , que é o nosso caso, tinha que tocar Stones, então preparamos três músicas deles, e, na hora do embate, a gente perguntava ‘Hey Jude’ ou ‘Satisfaction’? A música que perdia a gente não tocava, e aconteceu de algumas dos Stones ficarem de fora”, conta.
“Mas essa brincadeira fez um sucesso enorme, e a partir dali começou a ter uma demanda grande nas nossas redes sociais, com as pessoas pedindo para fazer um concerto com repertório dos Stones”, diz o
maestro
.
Com álbum, DVD e várias apresentações dedicados aos Beatles ao longo de sua trajetória, a Orquestra Ouro Preto agora “vira a chave”, como diz Toffolo, para encarar a música dos Stones. “Rolling Stones pede da orquestra uma energia muito peculiar, um estado de espírito diferente. Acho que Stones requer uma inquietação maior, uma pegada mais firme, mais elétrica, ao passo que os Beatles têm aquelas melodias que falam por si só”, diz.
Toffolo espera que, com o avanço da vacinação contra a COVID-19 e a possibilidade de concertos presenciais, a orquestra possa levar para a praça pública um espetáculo em dois tempos, com uma primeira metade dedicada dos Beatles e uma segunda ancorada no repertório dos Stones.
“Pode ser muito interessante juntar isso aí. O
rock
é um estilo musical que é a cara da segunda metade do século 20. As futuras gerações vão ter que saber que movimento é esse, porque é uma assinatura do nosso tempo”.
''Acho que por causa dessa tendência que a orquestra tem de ser pop, de se misturar com artistas e gêneros, é sempre muito bom trabalhar com eles, é fácil, é sem cerimônia. Isso é uma característica do (maestro) Rodrigo (Toffolo). Já cantei com outras orquestras, mas a Ouro Preto é muito próxima, muito acessível. Com as outras é tudo mais solene''
Fernanda Takai, cantora
Música e bate-papo sobre inspiração
No final deste mês, a Orquestra Ouro Preto apresenta o concerto gravado com
Fernanda Takai
, com o repertório do álbum “O Tom da Takai”, em que a cantora dá voz às composições de Tom Jobim. O projeto foi feito por encomenda de empresas patrocinadoras.
“Tem a ver com mudar um pouco a proposição em relação às lives. A gente sempre procura fazer algo diferente, e daí surgiu o SulAmérica Sessions, que é quase um programa de auditório, porque a gente toca com o convidado e depois tem um bate-papo com o artista, em que a gente fala de vários assuntos, aborda a forma como ele tem passado a pandemia, fala da importância da música na questão da saúde emocional, do repertório, do que levou à escolha das músicas e, no caso da Fernanda, como o Tom Jobim chegou na vida dela e também da relação que ela tem com Ouro Preto”, afirma o maestro.
Ele avalia que o formato irá atrair audiência. “A gente entra um pouco na intimidade do artista e fala, por exemplo, de inspiração. Quem curte um determinado artista quer saber coisas dele, como é o modo de criação, o que ele pensa. A ideia é caminhar um pouco pela cabeça do convidado, saber como ele se posiciona, como escolhe repertório.”
Fernanda Takai, por sua vez, diz que gostou muito da experiência de se reencontrar com a orquestra neste formato que mistura apresentação musical com bate-papo. “É um formato novo que eles estão experimentando, e eu achei muito interessante. Para quem assiste, talvez seja melhor, porque não fico fazendo comentários entre as canções, como normalmente faço num show. A conversa vem depois. E o foco do bate-papo sai um pouco só do repertório, a gente fala de carreira e de tudo o mais.”
A relação de Fernanda com a Orquestra Ouro Preto vem desde 2014, quando ela foi convidada para participar de um concerto na Praça da Liberdade, no qual cantou faixas de seu disco em tributo a Nara Leão, “Onde brilhem os olhos seus”, e dois temas dos Beatles.
De lá para cá, ela conta, foram vários outros encontros, sendo o mais recente em setembro do ano passado, executando o repertório de “O Tom da Takai”. “Acho que por causa dessa tendência que a orquestra tem de ser pop, de se misturar com artistas e gêneros, é sempre muito bom trabalhar com eles, é fácil, é sem cerimônia. Isso é uma característica do Rodrigo. Já cantei com outras orquestras, mas a Ouro Preto é muito próxima, muito acessível. Com as outras é tudo mais solene”, elogia.
Outros nomes já confirmados para esse projeto são Alceu Valença – que gravou com a orquestra o álbum “Valencianas” –, Ana Carolina e Diogo Nogueira. Lulu Santos deve entrar para esse time. “Eu diria que ele está 95% confirmado”, diverte-se o maestro.
“Foram várias as razões que orientaram a escolha desses nomes, mas, principalmente, a possibilidade de diálogo. O Alceu já é uma parceria antiga firmada entre a orquestra, a Tropicana Produções e a Palco Produções. Ele tinha que estar. A gente queria cantoras mineiras, então vieram Ana Carolina, que é de Juiz de Fora, e a Fernanda.”
O maestro cita também que “tanto o Lulu quanto o Diogo são artistas que acabaram se aproximando de nós por uma questão de respeito e carinho mútuo. No ano passado a gente gravou ‘Como uma onda’. A mesma coisa em relação ao Diogo, ele conhece o trabalho da orquestra, a gente conhece o trabalho dele, então passa por aí. É um encontro muito profícuo, não é um ‘job’, um ‘freela’, é um trabalho de artistas que já têm um carinho recíproco, que têm interesse um no trabalho do outro”.
O auxílio luxuoso do pandeiro
Com relação ao projeto com o Duo Desvio, o maestro diz tratar-se de um disco conceitual, que estuda os ritmos brasileiros, passando por gêneros nordestinos, como coco, maracatu e cavalo marinho, entre outros. “Tem até um concerto para dois pandeiros e orquestra, dividido em três movimentos, com partitura escrita, para que todo mundo possa reproduzir, quer dizer, é um concerto mesmo, no sentido formal do termo.”
A plataforma interativa na qual “Ritmos brasileiros” será lançado oferece diversos recursos. “Vai ter, por exemplo, um vídeo 360° que vai dar zoom na cara do maestro, na mão do violinista. E vai ter um joguinho pelo qual você pode fazer o ritmo da música. Está muito legal essa plataforma, é um trabalho muito bonito. As músicas são todas composições do Duo Desvio, feitas sob encomenda para a orquestra.”
Leonardo Gorosito, que integra o duo ao lado de Rafael Alberto, explica que esse projeto começou a tomar forma a partir do momento em que seu parceiro passou a ser chamado frequentemente para atuar como percussionista convidado da Orquestra Ouro Preto.
“O Rodrigo (Toffolo) tinha essa proximidade com o Rafael, já conhecia nosso trabalho como duo e nos convidou para compor uma peça, um concerto para dois pandeiros e orquestra de cordas. A gente não tem notícia de que exista algum outro neste formato. O Tim Rescala tem uma proposta parecida, só que é com uma orquestra de choro”, diz.
“Quando o Rodrigo fez esse convite, a gente pensou em fazer mais obras. Já tínhamos umas coisas compostas, em cima de ritmos brasileiros, e sugerimos incorporar isso ao trabalho. Tenho muito contato com os ritmos do Nordeste, de Pernambuco, principalmente, então a gente fez uma compilação de ritmos de todo o país e arranjou para cordas, com a percussão como solista”, explica.
GRAVAÇÃO
O projeto começou a ser gravado – primeiramente as percussões – em 2019, em São Paulo. No ano passado, num momento de relativo relaxamento das medidas restritivas, com a queda dos índices de contágio, entre outubro e novembro, os músicos da orquestra, divididos em naipes, gravaram suas partes em Belo Horizonte.
“O CD físico já está pronto, mas o lançamento vai ser completamente digital. Vai ser lançado no site, que tem essa plataforma totalmente interativa com o conteúdo do disco. Os instrumentos estarão ali desenhados em 3D, então as pessoas poderão ver o tambor de maracatu, o reco-reco, e a gente explica cada obra, os ritmos, os instrumentos, tudo”, reforça.