“A beleza deste filme está na direção perfeita, na interpretação intensa de seus atores (alguns deles em sua primeira experiência), na crueza do tema e, principalmente, na capacidade de mostrar o problema sob diferentes perspectivas, sem apontar o dedo contra alguém”. Assim o jornal Today descreveu “7 prisioneiros”, filme de Alexandre Moratto estrelado por Christian Malheiros e Rodrigo Santoro.
A produção modesta, também protagonizada por Christian Malheiros, custou US$ 20 mil. Abriu o caminho para “7 prisioneiros”. Produzido por Fernando Meirelles e Rahmin Bahrani, o longa foi bancado pela Netflix, que pretende lançá-lo em novembro.
FERRO-VELHO
Malheiros interpreta Mateus, menino do interior paulista com poucas perspectivas na vida, que aceita um trabalho na capital levado por um conhecido, junto com outros três rapazes. Pouco depois da chegada ao ferro-velho de Luca (Rodrigo Santoro), os quatro percebem que caíram em uma cilada.
Não receberão salário, pois se endividaram com o patrão para bancar o muquifo que dividem e a comida simples que os alimenta. A Mateus, um dilema se impõe: é possível negociar nessas condições, ou qualquer tentativa nesse sentido acaba sendo traição aos amigos e cooptação?
Rodrigo Santoro revelou que seu papel foi especialmente difícil devido às atitudes do personagem. Primeiro, teve receio por não ser parecido com a descrição de Luca no roteiro. “Antes de ser um astro de cinema, o Rodrigo é acima de tudo um grande ator”, afirmou Alexandre Moratto.
Santoro também ficou inseguro devido à sua origem, muito diferente daquela do personagem. “Cresci em uma família de classe média, naturalmente privilegiada. Luca tem uma frase que era quase mantra para mim: ele diz que veio da m..., que cresceu num barraco ao lado do esgoto”, comentou o ator.
“Já fiz outros personagens de classes sociais diferentes, mas desta vez estava fazendo algo muito realista e específico”, afirmou Santoro.
''Sem a cultura, o país não tem identidade. O que faz o caráter de um povo é sua arte''
Rodrigo Santoro, ator
VILÃO
Aplicado, depois de estudar em livros e reportagens o tema do filme, o ator foi conversar com pessoas em comunidades e com vítimas do tráfico humano. “Queria humanizar o personagem, aprofundá-lo. Não desejava que ele caísse no estereótipo do vilão.”
Ao mesmo tempo, seu objetivo era que o espectador não terminasse torcendo por Luca. “Não tem redenção. Ele sabe o que está fazendo, que são coisas terríveis, mas escolhe esse caminho conscientemente e justifica para si mesmo que é porque veio da miséria”, diz Santoro.
Para Santoro, “7 prisioneiros” é uma grande metáfora. “A história que se passa em um ferro-velho, sobre tráfico de pessoas e condições degradantes de trabalho, levanta uma discussão mais abrangente. O filme tenta fazer um retrato de como o abismo social, produto de um sistema excludente, pode relativizar conceitos éticos e valores. O espectador fica com a pergunta: quem é culpado e quem é inocente quando a gente está falando de sobrevivência?”, analisa.
Ao passear em Veneza com a mulher, Mel Fronckowiak, o ator percebeu como em cada esquina a cidade respira arte. “Foi muito inspirador e ao mesmo tempo dolorido”, revelou.
“Ver aqui a valorização da cultura e da arte e sentir o que está acontecendo no Brasil com a nossa cultura, com o cinema. A cultura nos torna únicos em relação ao mundo. Sem a cultura, o país não tem identidade. O que faz o caráter de um povo é sua arte. É pela sensibilização por meio das artes que a gente começa a ver o outro”, conclui.
VITRINE ITALIANA
Além de “7 prisioneiros”, o Brasil mandou para Veneza “Deserto particular”, de Aly Muritiba, atração da seção Jornada dos Autores; “Ato”, curta de Barbara Paz exibido no Horizonte Curtas; “A salamandra”, de Alex de Carvalho, que passou na Semana da Crítica; e o curta “Lavrynthos”, de Fabio Rychter e Amir Admoni, exibido na seção Bienalle College Roma/Realidade Virtual.