O detetive Espinosa (Lázaro Ramos) participa de uma roda de samba num boteco, quando seu celular toca. Um corpo foi encontrado dentro de um carro. Pronto: acabou o samba. E começou “O silêncio da chuva”, nova adaptação de um livro de Luiz Alfredo Garcia-Roza para o cinema, desta vez dirigida por Daniel Filho. O longa estreia nesta quinta (23/09) nos cinemas.
Espinosa já foi personagem de uma série de TV, com Domingos Montagner no papel principal. “Achados e perdidos” (2006) foi para o cinema sob a direção de José Joffily, com Antonio Fagundes na pele de um detetive aposentado. “Berenice procura” (2018) é dirigido por Allan Fiterman.
“O silêncio da chuva” tem o desenvolvimento de uma investigação clássica. O morto, o empresário Ricardo (Guilherme Fontes), foi assassinado? Por que e por quem? As perguntas conduzem Espinosa e sua assistente, Daia (Thalita Carauta), à viúva, Beatriz (Cláudia Abreu), e também à secretária do executivo, Rose (Mayana Neiva). Para compor o quadro, outros personagens entram em cena, como o corretor de seguros vivido por Otávio Müller e o pai de Beatriz, o empresário picareta Anselmo Vasconcellos.
CARÁTER
A investigação é tão tortuosa quanto o caráter dos personagens, o que encaminha o filme para a complexidade do noir. Sem dispensar os clichês do gênero, trabalha com as aparências sempre enganosas, homens corruptos e dispostos a tudo, e a presença de femmes fatales em pontos-chave da narrativa.
Produto comercial de boa qualidade, “O silêncio da chuva” apoia-se na direção segura de Daniel Filho e no texto sólido inspirado no bom romance de Garcia-Roza, adaptado e roteirizado por Lusa Silvestre. Versão livre, que traz a trama do romântico Bairro Peixoto para um Rio de Janeiro contemporâneo, convulsionado e cheio de conflitos sociais.
O filme tem clima e sai-se bem em cenas de ação, o que não é muito frequente nas produções do gênero. O elenco responde bem às exigências do roteiro. Thalita e Lázaro compõem uma dupla de policiais bem interessante, com suas personalidades contrastantes. Ela, muito despachada e falastrona; ele, um tanto inseguro e mais introspectivo. As outras duas personagens femininas são levadas com brio por Cláudia Abreu e Mayana Neiva. Otávio Müller marca presença com seu carisma cult num papel um tanto exótico, mas que faz todo sentido no contexto do enredo.
A estrutura do longa mantém o suspense até o final. Aliás, "finais", pois há um antes dos créditos e outro depois. Portanto, espere esse outro desfecho depois da apresentação dos créditos técnicos. Ele confere novo sentido ao conjunto.
COMÉDIA
As questões sociais estão presentes na trama, em especial com a presença de Maximiliano (Peter Brandão), um ladrão pé de chinelo desejoso de dar um passo maior que as pernas. O ambiente um tanto soturno é pontuado por alívios cômicos, vindos, em especial, da tira interpretada por Thalita Carauta. Engraçada de fato, seu talento se escora nesse viés da comédia que consiste em dizer as falas com rapidez de metralhadora. A porção comédia merece reforço do multifacetado Otávio Müller, com sua caricatura de dom-juan barato. Mas ele não fica apenas nos risos, diga-se.
Todos esses elementos em bom equilíbrio mostram a competência de Daniel Filho, diretor experiente por décadas acumuladas de trabalho na TV e no cinema. O resultado final mostra também que tomar como ponto de partida um texto consistente pode ser um bom trunfo. Garcia-Roza (1936-2020), como se sabe, foi psicanalista e professor universitário durante boa parte de sua vida. Autor de livros de sucesso sobre psicanálise, na maturidade resolveu mudar de ramo e transformou-se em escritor de romances policiais. Teve grande sucesso. “O silêncio da chuva”, publicado em 1996, é seu primeiro romance.
Nele, surge o detetive Espinosa, que opera basicamente no Bairro de Copacabana. Policial diferente para nossos padrões, ele é tão eficiente como humano. Leva em conta a sociedade desajustada em que vive e não se acredita um paladino moral perdido num reino de pecadores. Mostra empatia com os outros. Gosta de viver, tem seus defeitos e fraquezas, mas é, basicamente, um homem reto. Pelo temperamento, lembra um pouco o inspetor Maigret, personagem de Georges Simenon. Lázaro Ramos, com sua integridade, o interpreta muito bem. (Agência Estado)
“O SILÊNCIO DA CHUVA”
(Brasil, 2021). De Daniel Filho, com Lázaro Ramos, Thalita Carauta, Cláudia Abreu. Classificação: 16 anos. Estreia nesta quinta (23/09) em salas da rede Cineart e no Cine Una Belas Artes, em Belo Horizonte
ATOR DEIXA A GLOBO
Lázaro Ramos não é mais artista exclusivo da Globo. Depois de 18 anos, ator e emissora não renovaram o contrato, e uma nova parceria do baiano, desta vez com a Amazon, deve ser anunciada em breve.
"A Globo, em sintonia com as transformações pelas quais passa o mercado, vem adotando novas dinâmicas de trabalho com seus talentos. A não renovação de um contrato não significa o final de uma parceria. Ao contrário, o novo modelo de gestão de talentos permite que essa parceria seja renovada em muitos outros formatos e projetos futuros", diz a emissora em nota.
O texto afirma ainda que "Lázaro Ramos tem abertas as portas da empresa para futuros projetos em nossas múltiplas plataformas". Em vídeo no Instagram, publicado na manhã de quarta-feira (22/09), Lázaro agradeceu e se despediu. "A Globo me proporcionou muito além do que sonhei."
O ator disse ainda que foi muito feliz na emissora. "Agora, seguirei para outras descobertas e outras aventuras. O desassossego e a ânsia de entender as pessoas e a realidade do meu país seguem sendo a base do meu trabalho como artista."
Lázaro Ramos ainda tem uma série de projetos com a emissora e demais empresas do grupo estreando ou por estrear. Ele estará na nova temporada de “Sob pressão”, na segunda temporada de “Aruanas”, no filme “Medida provisória” e no infantil “DPA – Detetives do Prédio Azul”.
Também estará na temporada inédita de“Ó paí, ó”, que deve estrear em 2022, no Canal Brasil, onde ele está no ar com o programa “Espelho”.
Nascido em Salvador, em 1978, Lázaro Ramos é um dos principais nomes da teledramaturgia contemporânea e tem feito incursões pela literatura.
Ele é autor do best-seller “Na minha pele” e de livros para crianças.
Recentemente, a Globo não renovou ou encerrou o contrato com outros importantes nomes que integravam seu elenco fixo, como Antonio Fagundes, Glória Menezes e Renato Aragão. (Agência Estado)