Acostumados a uma sonoridade encorpada, os fãs de Lenine puderam experimentar, no segundo semestre de 2019, uma inédita investida do cantor e compositor pernambucano no formato voz e violão, numa série de três shows realizados em São Paulo.
Com a chegada da pandemia, ele hibernou seu instrumento e só o tirou desse estado no início de setembro deste ano, em uma apresentação no Teatro Sérgio Cardoso, também na capital paulista. Agora, Lenine chega a Belo Horizonte com o violão em punho para única apresentação, em formato híbrido, nesta sexta-feira (15/10), no Cine Theatro Brasil Vallourec.
O músico retomou a atividade presencial ainda apostando no formato intimista, mas a apresentação na capital mineira tem um ingrediente a mais: batizado como “Voz, violão e produção”, o show agrega a presença de seu filho, Bruno Giorgi, que soma à sonoridade acústica programações eletrônicas executadas ao vivo, loops, ambiências e texturas distintas.
“A gente leva para o palco parte dos arquivos sonoros de cada um dos álbuns que já gravei, por isso a produção está inserida nesse contexto do show. Vai dar para ouvir aquele pandeiro original que Marcos Suzano fez em ‘Hoje que quero sair só’, por exemplo”, explica Lenine.
''(O show) Tem uma simbologia, porque trata-se de um certo retorno. Para alguém que, como eu, tem dependência química da aglomeração do show e que vinha sofrendo muito com essa ausência de plateias, tem esse simbolismo do reencontro com o público''
Lenine, cantor e compositor
PANORÂMICA
Ele diz que o próprio repertório do show oferece uma grande panorâmica, com sucessos registrados ao longo de sua trajetória, como “Leão do Norte”, “Jack Soul Brasileiro” e “Paciência”, e também músicas do mais recente álbum, “Em Trânsito – Ao Vivo”, lançado em 2018 e com o qual conquistou seu sexto Grammy Latino – prêmio que se junta a dois troféus da Associação Paulista de Críticos de Arte (APCA) e nove distinções no Prêmio da Música Brasileira.“A gente carrega para o palco coisas fundamentais na minha trajetória como criador de canções e de álbuns. Meus discos foram produzidos sempre por mim, ao lado de grandes produtores, como Chico Neves, Tom Capone ou Jr Tostoi. E agora o Bruno, que divide comigo o palco”, diz. BH será a primeira cidade em que ele experimenta o formato voz e violão acompanhado pelo filho pilotando as programações e efeitos ao vivo.
“Tem essa parte da produção que agora está presente até no título do show e que se relaciona com esse grande castelo sonoro que a gente, no caso, mostra pela primeira vez. Tem uma simbologia, porque trata-se de um certo retorno. Para alguém que, como eu, tem dependência química da aglomeração do show e que vinha sofrendo muito com essa ausência de plateias, tem esse simbolismo do reencontro com o público”, afirma.
O que orientou a seleção das músicas que compõem a apresentação, conforme ele aponta, foi, em parte, a possibilidade do uso de elementos que estão registrados em seus discos. “Quis mostrar um pouco de tudo, corroborar a ideia de que cada disco, cada música, é apenas uma fotografia da canção, e aqui, no palco, a gente tem a possibilidade de poder exercitar outros timbres e enxergar outras fotografias”, ressalta.
SABOR
Ele exalta, ainda, o fato de poder trabalhar com seu filho, que, como diz, conhece sua obra intimamente, o que garante um “sabor diferente”, mais delicado e amoroso. Lenine não hesita em afirmar que sua prole tem sido uma enorme fonte de conhecimento.“O fato de ter três filhos com idades distantes – do João (Cavalcanti) para o Bruno são oito anos, e do Bruno para o Bernardo (Pimentel) são seis anos – implica referências distintas, cada um com um gosto musical muito particular e todos eles me municiando. Eu tive essa sorte”, comenta.
No caso do Bruno, ele aponta, a colaboração é ainda mais efetiva, porque o filho não apenas o municia com referências, como tem atuado como seu produtor, gravando, mixando e masterizando suas músicas e seus álbuns, além de eventualmente tocar e cantar junto.
“E quando a gente canta junto, fica tudo muito próximo, muito íntimo, porque tem a questão da tessitura vocal”, observa. “A gente trabalha junto desde o ‘Chão’ (2011), mas agora somos só nós dois no palco, dividindo tudo. Vamos ver. Também estou nessa expectativa, porque é algo que vamos fazer agora pela primeira vez”, acrescenta.
Lenine diz que, antes da chegada da pandemia, estava esboçando algumas músicas que poderiam gerar um novo álbum, mas que, a partir da necessidade do isolamento social, esse processo arrefeceu. Ele explica que vive uma relação cíclica de aproximação e afastamento em relação ao fazer musical, e que pode ser que agora retome. “Mas meu tempo é meu tempo”, diz, como um alerta para que não se crie expectativas.
TURNÊ
O que está no seu horizonte mais imediato é uma pequena turnê europeia com o pianista holandês Martin Fondse, com quem iniciou uma parceria que resultou no projeto “The bridge: Lenine & Martin Fondse live at Bimhuis”, gravado em 2016, na Holanda. “Só agora estou disponibilizando e compartilhando com o público esse trabalho, que era para ter gerado no primeiro semestre do ano passado uma turnê que só agora vai acontecer”, diz.“O projeto ‘The bridge’ foi com o acompanhamento da orquestra que o Martin Fondse conduz, mas agora vamos fazer um circuito mais de jazz, porque é em formato de duo, só eu e ele, com piano, violão e voz. Estou muito empolgado com essa pegada intimista atualmente, que me interessa bastante, porque representa a possibilidade de mostrar a canção quase da mesma forma como ela foi feita. Essa síntese tem me agradado”, assinala.
Para Lenine, tanto os shows em formato voz e violão que tem feito no Brasil – e para os quais já tem datas agendadas a partir de abril do próximo ano – quanto a turnê europeia com Martin Fondse representam um alívio, um respiro após o difícil período da pandemia, quando acabou se ocupando de várias coisas, até de música. “Tem a ver com essa minha relação cíclica. Eu e o violão, a gente faz as pazes, namora, depois eu dou um chega para lá nele e ele em mim”, explica.
PLANTAS
Ele considera que o mais complicado foi a impossibilidade de viajar, o que tem menos a ver com a música do que com as plantas. “No caso da pandemia, foi difícil não tanto o aspecto musical, mas a ausência da viagem, o que adoro fazer por causa dos meus interesses botânicos, porque deixar de viajar significa deixar de conhecer novas espécies de plantas”, aponta.Mas Lenine ressalva que pôde contar com seu refúgio para tentar manter o equilíbrio e a disposição para seguir adiante. “Eu tenho um santuário, um orquidário onde tenho minhas plantas e tudo, e isso foi minha garantia de sanidade, a relação direta com a terra, com plantar, com minha horta, com as frutíferas.”
O pouco contato que teve com o violão e com os processos de composição nesse período se relaciona também, conforme diz, com o próprio cenário político e social do país. “Quando escrevo, é muito com o olhar do cronista, então não quis dar esse mole, não quis pôr em palavras essa época medieval que estamos vivendo. A gente está atravessando uma coisa surreal, essa conjugação de pandemônio com pandemia, esse momento cinza, que só gera desesperança”, diz.
Ele considera que, para qualquer pessoa com algum grau de sensibilidade, o atual cenário político do país desperta emoções conflituosas e não raro negativas. “Não me satisfaço só com que esse governo caia, com que ele saia. Ele tem que pagar por tudo o que está causando, mas esse é um desejo que não muda o sentimento de desesperança, porque parece que se escancarou a mesquinhez, as pessoas não pensam mais no coletivo, é um salve-se quem puder, cada um por si e que se dane o outro. Eu não sou assim, eu sou humanista, eu penso no coletivo.”
“Voz, violão e produção”
Show de Lenine e Bruno Giorgi. Nesta sexta-feira (15/10), às 21h, no Cine Theatro Brasil Vallourec (Av. Amazonas, 315, Centro). Ingressos a R$ 60 (inteira) e R$ 30 (meia-entrada) para o formato presencial e R$ 10 (inteira) e R$ 5 (meia) para a live. Funcionamento da bilheteria: das 12h às 21h. Telefone:
(31) 3201 5211 ou (31) 3243 1964.
DOIS MODOS DE ESTAR NA PLATEIA
Com capacidade de público reduzida a 50% dos assentos, a proposta do Cine Theatro Brasil é de que o público participe do show da forma que se sinta mais confortável e seguro – de casa, por meio da live, ou presencialmente, na plateia, com toda a segurança que o reencontro exige.
A equipe do centro cultural fará a medição de temperatura na chegada, disponibilizará totens com álcool em gel 70%, adequação na circulação pelos espaços e sinalização indicando distanciamento mínimo na fila pelos corredores de acesso ao Grande Theatro Unimed-BH.
Na parte interna do teatro, os assentos estarão separados, com cadeiras interditadas e a permissão para que apenas duas pessoas, que estiverem juntas, se sentem ao lado uma da outra. Artistas e técnicos serão testados antes do evento.
No formato digital, o show será transmitido pela plataforma Eventim: ao comprar o direito ao acesso digital, cada pessoa receberá um passe com um link de entrada diferente. Cada acesso digital dá direito a apenas um link válido. Caso alguém faça a entrada em mais de um dispositivo, o link válido será o do último dispositivo acessado. Para ambos os formatos, a compra pode ser feita pelo site ww.cinetheatrobrasil.com.br ou na bilheteria do teatro.