Coroada pela revista Forbes como a atriz de maior bilheteria de Hollywood em 2010 graças à versão de Tim Burton de “Alice no País das Maravilhas”, a australiana Mia Wasikowska enfrenta dificuldades – como várias outras mulheres – para trabalhar do outro lado da câmera.
ME TOO
“Adoraria fazer trabalhos de direção, mas é difícil. E me parece que, sendo mulher, é uma experiência diferente”, comenta. “Atuar é diferente e, claro, com o #MeToo é outra coisa. Mas me pareceu interessante tentar fazer o meu filme com perspectiva muito feminina. Porém, a resposta é diferente do que vi com meus amigos homens.”
O desafio enfrentado pelas diretoras de cinema é um dos temas principais do drama “Bergman island” (“A ilha de Bergman”), protagonizado por Wasikowska e lançado recentemente nas plataformas de streaming, que deverão exibi-lo no Brasil.
O filme independente retrata a história de um casal de cineastas que vai à antiga casa do diretor Ingmar Bergman. Enquanto o despreocupado Tony (Tim Roth) se encontra com fãs, sua mulher, Chris (Vicky Krieps), luta para escrever um novo filme na remota Ilha de Faro, o refúgio do cineasta sueco.
Paira sobre ela o espectro de Bergman, que criou alguns dos trabalhos mais venerados do cinema, como “Persona” e “O sétimo selo”.
“É uma artista tentando encontrar sua voz e sentindo o peso da sombra de grandes artistas ao seu redor. Posso me identificar com esse conflito”, afirma Wasikowska.
Para ela, o caminho das mulheres para dirigir cinema é “sistematicamente diferente”, em parte porque “há algo naturalmente experimental no sentido feminino da criatividade”.
“Precisamos, realmente, trazer muito mais compreensão e gentileza ao nosso próprio processo criativo, porque ele pode ser outro devido à forma como os homens são criados. A forma como o mundo te responde pode ser diferente se você é homem ou mulher.”
OSCAR
Recentemente, Hollywood começou a emitir sinais de que está atenta à produção que extrapola a criação vinda de cineastas masculinos, majoritariamente brancos. Prova disso é o fato de que, em abril, Chloe Zhao se tornou a segunda mulher – e a primeira negra – a ganhar o Oscar de direção com “Nomadland”.
Porém, “A ilha de Bergman” levanta questões sobre a aura que prevalece sobre diretores canônicos, como Bergman, que geralmente ignoram as vantagens de que desfrutam. O aclamado diretor teve nove filhos com seis mulheres, mas não exerceu qualquer papel na criação deles.
“Ainda não sou mãe, mas quero ser”, comenta Wasikowska. “Não quero que isso seja limitante, só quero ser uma boa mãe”.
Porém, ela pondera: homens que seguem a carreira cinematográfica “provavelmente não sentiram tanto o peso da paternidade como as mulheres (em relação à maternidade)”.
“A ilha de Bergman” também discute sobre se é possível separar o artista de sua obra. “Nesse ponto, temos as conversas sobre Woody Allen”, comenta a atriz, referindo-se ao diretor aclamado por muitos, apesar das acusações de abuso sexual.
Em “A ilha de Bergman”, Wasikowska interpreta Amy, estrela do filme criado por Chris, que tem um amante. Mia Hansen-Love, diretora do longa, abordou trama similar – e autobiográfica – num de seus primeiros filmes.
“Estou tão orgulhosa dela por explorar abertamente essas coisas tão presentes em sua própria vida e com as quais a própria Mia luta”, afirma Wasikowska.