"Chegamos a outras pessoas por causa do Zoom. Fosse antes, estaríamos fazendo esta entrevista por telefone. E é muito divertido, você vê as pessoas com quem fala. De certa maneira, antes era como se você fosse com a onda. Agora, você acompanha a onda e vê onde ela pode te levar"
John Taylor, baixista do Duran Duran
Como permanecer relevante na música após mais de 40 anos de carreira – e com uma pandemia mudando radicalmente os planos? A resposta o Duran Duran procurar dar ao longo dos 51 minutos que duram as 12 faixas de “Future past”.
Álbum que começou a ser gestado em um cenário distante da crise sanitária, só foi finalizado em abril passado, quando os quatro integrantes – o vocalista Simon Le Bon, o tecladista Nick Rhodes, o baixista John Taylor e o baterista Roger Taylor – se reencontraram depois de quase um ano separados.
O nome mais presente no álbum é o do DJ e produtor britânico Erol Alkan, que assinou a maior parte das faixas, muitas delas em colaboração com Graham Coxon, guitarrista do Blur. Juntos, os dois fizeram uma tapeçaria sonora que vai mudando de tom a cada faixa.
As canções mais dançantes são coloridas com participações: a banda pop sueca Tove Lo está em “Give it all up”, enquanto o grupo japonês Chai gravou os refrões de “More joy!”, também voltada para a pista, mas com um quê futurista.
“Invisible” e “Anniversary” são outras faixas de destaque, a primeira, inclusive, com um clipe que reúne a rainha Elizabeth, Elton John, Lady Gaga e James Bond (o de Daniel Craig, diga-se).
O time de colaboradores também traz o superprodutor italiano Giorgio Moroder. Do alto de seus 81 anos, o homem que inovou a disco music com o uso de sintetizadores (e trabalhou, depois de configurar o som de Donna Summer, com Daft Punk, Blondie, David Bowie e Lady Gaga, entre inúmeros outros grandes nomes), produziu duas canções, “Beautiful lies” e “Tonight united”.
Enfim, é um recomeço, por vezes eletrizante, que dialoga com os novos tempos, mas sem perder a essência. Na entrevista a seguir, John Taylor, de 61 anos, cofundador do Duran Duran, fala um pouco do caminho para “Future past” e do que ele espera para os próximos tempos.
ENTREVISTA
Vocês começaram a produzir “Future past” em 2018 e só o finalizaram em abril deste ano. O disco que está sendo lançado é outro por causa da pandemia?
Nunca trabalhamos em um disco continuamente. São sempre duas semanas e depois folga, porque moro na Califórnia e o resto da banda em Londres. Mas também porque sempre que gravamos um disco é muito intenso, então temos que tirar uns dias de folga. Planejamos, inicialmente, lançar no verão do ano passado, até que veio março de 2020. Não sei se teria sido diferente (se não fosse a pandemia). Ficamos todos, durante um ano, longe uns dos outros e da música. Todas as experiências pelas quais passamos em 2020 foram profundas. Gosto de pensar que quando nos reunimos novamente para terminar o disco éramos pessoas diferentes. Foi desafiador, mas acho que as peças se juntaram tão bem que ‘Future past’, que era um trabalho pré-pandemia quando começamos, se tornou um disco pós-pandemia ao terminar. Acho que este sentimento tem a ver com as letras, já que muitas das canções são sobre relacionamentos longos e questões muito íntimas, coisas que a pandemia trouxe à tona.
Pessoalmente, como foi para você o período de isolamento?
Não foi tão difícil. Tive COVID em março do ano passado, antes de o vírus se tornar uma coisa tão amedrontadora. Para mim, foi como uma gripe muito forte. Quando a superei e concluí que não haveria como voltar a Londres, resolvi tirar o melhor do período, realmente aproveitar. Este quarto em que estou conversando com você, por exemplo, eu nunca havia passado tanto tempo nele. Gasto muito do meu tempo indo e vindo para Londres, tenho jet-lag o tempo inteiro. Então, para mim foi muito bom esse isolamento. Fizemos reuniões semanais com os amigos via Zoom, foram como diferentes versões de nós mesmos. Todo mundo dizia: nada será como antes (quando a pandemia acabar), absolutamente não. Pois os últimos seis meses foram insanos com a banda, com trabalho, com o lançamento do álbum. O que está acontecendo agora está mais louco do que nunca.
É louco, mas também diferente de antes, não?
Definitivamente. Na verdade, todo álbum tem alguma coisa diferente do outro. Chegamos a outras pessoas por causa do Zoom. Fosse antes, estaríamos fazendo esta entrevista por telefone. E é muito divertido, você vê as pessoas com quem fala. De certa maneira, antes era como se você fosse com a onda. Agora você acompanha a onda e vê onde ela pode te levar.
Ao longo de sua trajetória, o Duran Duran esteve ao lado dos melhores produtores e músicos. Em “Future past” você trabalharam com dois produtores de diferentes gerações, Giorgio Moroder e Erol Alkan. Como foi esse processo?
Os dois produtores que tivemos não poderiam ser mais diferentes. Erol tentou reinventar a banda, tratando de como seria o som do Duran Duran em 2021. Com Giorgio sabíamos onde queríamos ir e fomos muito respeitosos. Com Erol, foi intenso; com Giorgio, mais fácil. Com Erol, que produziu a maior parte do álbum, tentamos refazer o som da banda, o processo de composição. Estou falando de arquitetura de som, do jeito que fizemos as seções rítmicas, que esculpimos os sons dos teclados, das guitarras. Canções como ‘Future past’, ‘Anniversary’, ‘Invisible’ são resultado deste encontro. Já com Giorgio, que chegou na parte final das gravações, não. Ele veio com sua pequena maleta, plugou tudo nos teclados e tocou. Tão mais fácil. E foram canções que vieram com outro clima, menos estressantes e mais divertidas.
O Duran Duran existe há 43 anos e vocês estão juntos a maior parte desse tempo. Como conseguem?
Primeiramente, nós queremos, e portanto escolhemos, estar juntos. Temos responsabilidade uns com os outros, uma parceria que tem 40 anos é algo muito sério, ainda mais em relação a uma banda que se tornou muito maior do que nós. Mas somos todos muito complicados, então temos que trabalhar nessa relação, respeitar o espaço de cada um. Não tenho irmãs nem irmãos, então vejo nosso relacionamento como se fosse. Você realmente quer encontrar seus irmãos e quando encontra é como um êêêêê! Algumas horas depois, hummmm.
Neste momento vocês têm cinco datas de shows confirmadas para 2022, a partir de abril, na Europa (em 25 de junho no Rock in Rio Lisboa). Depois da pandemia, como você imagina que serão os shows?
Estes shows são todos em festivais de verão, que é algo de que gosto muito, pois alcançamos muita gente e muitos jovens. Ano passado, quando fiquei nos EUA, nós tivemos durante o lockdown o movimento Black Lives Matter e depois a eleição presidencial. Foi tão incrivelmente intenso e ninguém podia estar junto. E festivais de músicas são lugares seguros para se encontrar e se divertir. Não sei como vai ser, cada um tem um sentimento, as pessoas discordam. Amizades, de uma maneira geral, são assim: você e eu somos amigos, mesmo que gostemos de músicas diferentes, mesmo que um de nós seja um péssimo cozinheiro, mesmo que você torça para o Liverpool e eu para o Manchester. Mas há uma linha divisória. Nós dois não poderemos ser amigos se tivermos diferentes opiniões sobre as mudanças climáticas, se você votou no Trump ou se tiver sido a favor do Brexit. De repente, posso elencar inúmeras razões pelas quais não podemos ser amigos. E não gosto disso. Quero estar junto, mas não quero essa polarização. Música é diversão, podemos ficar juntos, dançar, cantar. Então, quero mais disto, compreensão, perdão uns aos outros. Precisamos agora de um bom encontro.
“FUTURE PAST”
Duran Duran
BMG (12 faixas)
Disponível nas plataformas digitais