A diretora Julia Baumfeld faz questão de frisar que “Marco” não é um documentário tradicional. Centrado na figura de Marco Antônio Guimarães – um dos fundadores do grupo Uakti, compositor e inventor de instrumentos de prestígio internacional –, o filme estreia nesta sexta-feira (19/11), na Mostra Sesc de Cinema, evento on-line que segue até 12 de dezembro.
Artista que transita por outras linguagens além do audiovisual, Julia explica que o documentário nasceu a partir de sua aproximação com o músico, e esse é o cerne da narrativa.
BALÉ
Desde criança, a diretora admira o trabalho de Marco Antônio Guimarães, seja no Uakti ou em trilhas sonoras compostas tanto para filmes (“Lavoura arcaica” e “Ensaio sobre a cegueira”) quanto para o Grupo Corpo.
Certo dia, Julia descobriu que o artista era seu vizinho e aniversaria na mesma data que ela: 10 de outubro. “Fiz uma pintura e dei de presente para ele. Tínhamos um amigo em comum, o Fernando Fiúza (1953-2009), que contou para o Marco que me conhecia. A partir daí, começamos a nos aproximar”, recorda.
A amizade veio primeiro. A ideia do documentário surgiu alguns anos depois, em 2012. O estímulo para realizar o filme veio justamente dessa proximidade, afirma Julia, pois sabidamente Marco Antônio Guimarães é uma pessoa muito reservada, que não costuma compartilhar sua intimidade.
“Comecei com a ideia de um documentário mais tradicional, contando a história dele, mas depois fui entendendo que seria algo sobre o nosso encontro, nossa aproximação”, explica.
O processo de filmagem se deu de maneira não convencional. Julia não ia ao encontro de Marco para rodar as cenas, mas para visitá-lo, como de costume, e levava consigo a câmera. “Às vezes, nos encontrávamos e simplesmente não era o caso de filmar; em outras ocasiões, sim.”
Realizados entre 2012 e 2015, vários registros revelam a cumplicidade dos dois amigos. “O lugar em que o filme está não é o da figura ou a história do Marco, mas da minha relação com ele”, destaca Julia.
“Marco gosta de contar histórias, a gente conversava muito. A reclusão dele tem mais a ver com o desejo de não exposição, é mais na esfera social, ele não é muito de sair de casa. Ele é muito tranquilo em casa, não é nem um pouco fechado”, revela a diretora.
Marco Antônio Guimarães deixou de fazer parte da formação de palco do Uakti em 1992, por se considerar mais inventor e compositor do que instrumentista. E também porque optou por um modo de vida mais isolado.
Julia destaca o fato de o músico ser um artista grandioso em vários aspectos – que dividiu projetos com Milton Nascimento e Phillip Glass, entre outros – em contraposição à sua personalidade imersiva e ao apreço pelo prosaico.
“Ele me ensinou muito a olhar para o simples, para o singelo, valorizar uma vida com menos coisas. Neste mundo em que se busca tanto o tempo todo, ele está sempre para o lado do menos é mais”, afirma.
LIVRO
A amizade seguiu durante e depois do processo de filmagem. Entre 2015 e 2016, Julia organizou cursos de criação ministrados por Marco na antiga casa-oficina do Grupo Uakti. Assistente dessas atividades, ela reuniu precioso material de ensino. Atualmente, trabalha no projeto de um livro com métodos de criação sonoro-visual elaborados e ensinados por Marco, como o sistema de composição com figuras geométricas.
No último dia 13, “Marco” teve sua primeira sessão em Belo Horizonte, presencial, no Sesc Palladium, onde volta a ser exibido em 3 de dezembro. A estreia internacional ocorreu em setembro, durante o festival Ficit, no Peru. A produção foi selecionada para festivais de cinema na Bahia, Rio de Janeiro e Coimbra (Portugal).
“MARCO”
Documentário de Julia Baumfeld. Exibição on-line até 12 de dezembro, no canal do Sesc Minas no YouTube. Sessão presencial em 3 de dezembro, às 19h, no Sesc Palladium (Av. Augusto de Lima, 420, Centro). Entrada franca, com retirada de ingressos no site Sympla.