Jornal Estado de Minas

MÚSICA

No formato Ira! Folk, Edgard Scandurra e Nasi mostram seus hits em BH


É com a sintonia de quem caminha há 40 anos juntos que Nasi e Edgard Scandurra sobem ao palco do Grande Teatro Cemig do Palácio das Artes nesta sexta-feira (26/11), às 21h, com o projeto Ira! Folk, que repassa, em formato intimista, calcado em voz, violão e guitarra, a trajetória de uma das bandas mais importantes do rock brasileiro. 





No repertório, grandes sucessos da carreira, como “Flores em você”, “Dias de luta”, “Eu quero sempre mais”, “O girassol”, “Tolices”, “Tarde vazia”, “15 anos”, “Núcleo base” e também alguns lados B, como “Mudança de comportamento”, “Flerte fatal”, “Bebendo vinho” e “Um dia como hoje”, entre outras.

Passado o período mais severo da pandemia, o Ira!, segundo Scandurra, está retomando aos poucos as atividades presenciais, tanto como banda quanto como duo folk. “Estamos voltando lentamente ao que foi nossa rotina durante 40 anos”, diz o guitarrista, destacando a sensação de certo alívio e de alegria por recuperar a possibilidade das atividades normais do dia a dia, da vida pessoal e profissional, o que inclui o lazer, a diversão, a arte e a sociabilização.

“Eu fiquei meses e meses saindo de casa só para botar o lixo na rua, e acho que muita gente ficou assim também, então é uma celebração, da nossa parte e da parte do público. É a nossa arte, nossa vida e nosso trabalho”, diz. 




ATÍPICO 

“Se você fica parado dois anos, tem uma equipe inteira que deixa de trabalhar. A gente está num momento completamente atípico, muito difícil, não só por causa da pandemia, mas por conta desse cenário político e social que o país vive. Tem muitos motivos para esses encontros serem festejados”, aponta.



O site oficial da banda mostra uma agenda regular de shows até maio do próximo ano. Scandurra diz que ela deve ser incrementada em razão das comemorações pelas quatro décadas de percurso. A primeira vez que o Ira! subiu em um palco foi em 1981, três anos antes do lançamento do primeiro compacto. Como a pandemia impossibilitou as devidas comemorações neste ano, a ideia é que isso ocorra em 2022.

O guitarrista explica que a agenda de shows diz respeito tanto ao projeto Ira! Folk quanto à banda, cuja formação se completa com Johnny Boy (baixo) e Evaristo Pádua (bateria) – um formato mais para teatro, onde as pessoas estão sentadas, e outro para festivais e espaços maiores.  

“O Ira! folk foi uma coisa que deu muito certo, é uma maneira de mostrar nossas músicas com um tom mais intimista. Desde que começaram a surgir os projetos acústicos, a partir dos anos 90, com a MTV, principalmente, o público sempre se identificou muito com isso. O formato voz e violão é muito atraente”, diz.





Ele sabe que uma celebração com o público pelos 40 anos de carreira passa necessariamente por uma revisão dos grandes sucessos. Mas Scandurra quer jogar luz também sobre o trabalho mais recente da banda, intitulado apenas “Ira”, que foi lançado no final de 2019 e, com a chegada da pandemia, teve sua divulgação comprometida. 

DISCO NOVO 

“Acho importante mostrar esse disco novo, de músicas inéditas. A gente não gravava, como banda, desde 2006, então foram 13 anos longe de um estúdio”, diz, ponderando que é mais complicado para um grupo com a longevidade do Ira! trabalhar material inédito.

“Você disputa com você mesmo, porque tem todo um histórico de sucessos. Um trabalho novo dos Stones não tem condições de competir com ‘Out of our heads’, com ‘Satisfaction’. A gente tem que trabalhar essa medida inteligente, de mostrar as novas músicas tocando também os clássicos”, afirma.





Ele e Nasi têm conversado sobre fazer um formato de show comemorativo mais longo.  “São coisas que a gente tem que pensar bem, para fazer apresentações que sejam históricas para quem for assistir. De repente, a pessoa leva um lanchinho, um suco, uma toalha para estender no chão e vai com o espírito preparado para assistir a muitas horas de show”, diz.

Scandurra não considera que seja descabido pensar numa comemoração grandiosa, que, conforme diz, estaria à altura da história da banda. “Eu acho, sem falsa modéstia, que a gente está no panteão das 10 bandas mais importantes do rock nacional”, afirma. 

Ele observa que o gênero teve o seu momento de glória nos anos 1980, mas nunca foi exatamente um fenômeno de massas. O guitarrista também entende que o Ira! sempre transitou por um ambiente mais alternativo dentro do estilo que executa, mas que, a despeito disso, deixou um legado de peso.





“Brigamos, no bom sentido, com outros estilos muito fortes, muito enraizados no país, o samba, a música regional, o funk, a música eletrônica e suas várias vertentes. Acho que, dentro desse universo extremamente particular que é o rock cantado em português, o Ira! está entre as 10 bandas mais importantes. Nunca fomos campeões de vendas, como parceiros de geração e de estilo foram, mas, pelo conjunto da nossa obra, acho que temos um espaço bem importante dentro da música brasileira e especialmente dentro do rock”, destaca.

TURBULÊNCIA

Quem acompanha a história do Ira! sabe que essa caminhada de 40 anos teve muitos percalços e obstáculos. Em meados dos anos 2000, a banda se separou de forma litigiosa, num episódio que opôs Nasi e Scandurra de maneira conflituosa. 

“A gente já teve momentos muito difíceis. Com a separação da banda, a gente ficou sete anos sem se falar. Houve uma briga muito séria, muito triste”, comenta. “Quando a gente resolveu voltar, no final de 2013, ainda existia um resquício de desconfiança, no sentido de retomar aquilo que a gente tinha antes. A gente se conhece desde os 19 anos, andamos muitos quilômetros pelas ruas de São Paulo e do Brasil, foram muitas tardes juntos ouvindo discos, dando risada, falando abobrinha”, acrescenta.





Ele recorda que, a partir da decisão de retomar as atividades com a banda em 2013, a dupla começou a resgatar a amizade. Scandurra considera que hoje sua relação com Nasi se expressa na sintonia fina que demonstram no palco quando estão a bordo do Ira! Folk. 

“Temos uma relação de respeito um pelo outro, de amizade e de carinho. O fato de estarmos mais velhos, amadurecidos, torna mais fácil contornar os problemas. Quando se tem uma briga, é normal vir à tona algum rancor, mas a gente consegue resolver tudo olho no olho. Talvez este seja o melhor momento entre nós dois, desde que nos conhecemos, é uma relação profissional e afetiva sólida e madura”, ressalta.

Ele diz que essa relação sempre foi, desde os primórdios do Ira!, alicerçada nos papéis que a dupla cumpre na banda. Nos anos 1980, Nasi chegou a escrever algumas letras de músicas, mas o principal criador da obra construída ao longo dessas quatro décadas sempre foi Scandurra. Firmou-se o acordo tácito de que um era o compositor e o outro, o intérprete. O guitarrista compara essa dinâmica com a de Pete Townshend e Roger Daltrey, do The Who.





“É uma coincidência feliz o fato de tanto lá quanto cá a coisa funcionar bem dessa forma. Teve uma fase intensa de composições minhas, quando eu estava dando uma cara para o tipo de som que o Ira! faz, e o Nasi sempre gostou muito. A gente se acertou nesse formato de parceria, de eu ser o compositor e ele o intérprete. Para esse disco mais recente, ele cobrava muito que eu compusesse, dizendo que queria cantar minhas canções.”

PROJETOS PARALELOS

Scandurra diz que se sente muito estimulado neste momento de arrefecimento da pandemia e que isso tem se refletido em diversos projetos e frentes de atuação para além do Ira.! Talvez o mais inusitado, conforme ele aponta, seja a parceria musical que está construindo com a jornalista e apresentadora Marília Gabriela. 

O guitarrista conta que os dois se aproximaram por meio do Instagram e já compuseram um blues a quatro mãos. “Conversando, eu descobri que ela tem essa relação com a música. Ela me mandou uma letra, fizemos esse blues e gravamos. Agora ela me mandou outra. Marília tem uma voz muito bonita e muito peculiar”, afirma.





Ele acrescenta que também gravou recentemente com Leno Azevedo, que foi um expoente da Jovem Guarda; está trabalhando em um disco “mais acústico e instrumental” intitulado “Jogo das semelhanças”; e projeta um novo trabalho, para o próximo ano, com o Pequeno Cidadão, a banda que mantém com Antonio Pinto, Ticiana Barros e os respectivos filhos, voltada para o público infantil. 

“Estou num momento bacana, de muita criatividade, trocando com bastante gente, esperando que as coisas se normalizem, se é que existe normalidade neste país em que a gente vive.”

FORÇA

Músico antenado, que procura se manter sempre atualizado, Scandurra vê com entusiasmo o atual momento da música popular brasileira, com uma produção que conecta gerações. “Percebo uma força muito grande na MPB, vinda de pessoas que tiveram contato com a internet já na infância ou na adolescência, mas que também conhecem Noel Rosa, Cartola, Mutantes, Titãs, Ira.! Não são propriamente artistas novatos, mas é uma cena que tem um jeito peculiar de tocar, minimalista, com muitas sutilezas”, diz.

Ele inclui nesse panorama nomes como Céu, Kiko Dinucci, Ava Rocha e Curumin. Outra coisa que ele diz perceber no atual cenário é a prevalência dos artistas solo, em detrimento dos grupos. “Eu, como roqueiro, sinto falta de mais bandas, daquele grupo de moleques que se reúnem para fazer um som e sai dali uma coisa colaborativa e potente. Sinto falta disso, mas, de qualquer forma, é um momento muito rico, com música boa vindo de todas as regiões do país. A história do eixo Rio-São Paulo, região Sudeste, não existe mais. A gente recebe informação de música de todos os cantos do país”, aponta.

SHOW IRA! FOLK

Nesta sexta-feira (26/11), às 21h, no Grande Teatro Cemig do Palácio das Artes (Av. Afonso Pena, 1.537, Centro). Ingressos para plateia 1 a R$ 240 (inteira) e R$ 120 (meia), plateia 2 a R$ 180 (inteira) e R$ 90 (meia) e plateia 3 a R$ 160 (inteira) e R$ 80 (meia), à venda na bilheteria do teatro e pelo site Eventim. Obrigatório o uso de máscara.




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