Jornal Estado de Minas

RETROSPECTIVA 2021

Teatro experimentou a convivência entre o presencial e o virtual em 2021


Todas as formas de expressão artística foram impactadas pela chegada da pandemia, mas, talvez, nenhuma de modo tão contundente quanto o teatro. Afinal, essa é uma linguagem que tem o encontro entre artista e público como premissa; é a arte da presença e do momento, o que se tornou inviável diante da necessidade do isolamento social. 





Se em 2020 ainda se discutia se era teatro ou não o que chegava ao público por meio da tela do computador, este ano marcou o retorno das produções cênicas ao seu lugar de fato e de direito: o palco.

A reabertura dos espaços culturais e a retomada das atividades presenciais em BH foi autorizada nos primeiros dias de julho, seguindo rígidos protocolos e com capacidade de público reduzida. Naquele momento, o cenário ainda era de incerteza e muitos artistas e produtores optaram por seguir on-line. O festival de peças curtas promovido pelo La Movida, realizado entre 22 e 31 de julho, transmitiu pelo Instagram os 16 espetáculos selecionados.

Uma das primeiras peças a ir ao encontro presencial do público foi a recordista de longevidade “Acredite, um espírito baixou em mim”, encenada no Cine Theatro Brasil Vallourec em 24 e 25 de julho. A reabertura propiciou a volta da circulação nacional de espetáculos de outros estados, que aportaram na capital mineira. 





O primeiro “visitante” foi o musical “A hora da estrela ou O canto de Macabéa”, com Laila Garin, que estreou no CCBB-BH em 14 de julho e teve sessões esgotadas na temporada que cumpriu até 26/7.

“As pessoas estão muito felizes de voltar ao teatro. Dá para perceber a emoção de quem assiste ao espetáculo. Ainda falta muito para a gente conseguir entrar num estado de normalidade, mas para a gente foi muito importante essa temporada em BH”, disse, à época, a produtora do espetáculo, Andréa Alves. Todo o elenco (atores e músicos) atuou de máscara.

Elenco da peça 'Incomoda, Incomoda, Incomoda', que marcou o retorno do público ao Grande Teatro do Palácio das Artes (foto: Leandro Couri/EM/D.A Press)

VIRTUAL 

As transmissões on-line, contudo, seguiam prevalentes. No final de julho, a diretora Sara Rojo, à frente do grupo Mulheres Míticas, apresentou o projeto – que ela classifica como videoteatro – “Hilda Penha”, protagonizado pela atriz Marina Viana, que marcou seus 40 anos de trajetória. Quem também celebrou uma efeméride de modo remoto foi a Cia. Luna Lunera, que festejou suas duas décadas de trajetória com a “Mostra Luna Lunera 20 anos”, entre agosto e outubro.





Espetáculos de duas diferentes turmas de formandos do Cefart chegaram ao público de formas distintas. “Incomoda, incomoda, incomoda”, apresentado no dia 6 de agosto, marcou o retorno ao formato presencial no Grande Teatro Cemig do Palácio das Artes e também foi transmitido pelo YouTube da Fundação Clóvis Salgado. Já “Haverá festa com o que restar”, apresentado no dia 19 do mesmo mês, ficou apenas no modelo remoto, com transmissão ao vivo, mas sem a presença de pessoas na plateia.

Ainda em junho, o Grupo Galpão lançou o projeto Dramaturgias – Cinco Passagens para Agora, com o objetivo de desenvolver espetáculos em parceria com dramaturgos e diretores convidados. A iniciativa desembocou, primeiramente, nos espetáculos “Como os ciganos fazem as malas” e “Sonhos de uma noite com o Galpão”, que estreou virtualmente em 21 de agosto.

TEATROS MUNICIPAIS 

No início de setembro, a PBH anunciou a reabertura dos teatros municipais, o que contribuiu para aquecer a cena local. A primeira peça a ocupar o Teatro Francisco Nunes, entre 10/9 e 19/9, foi “Acredite, um espírito baixou em mim”. 





No Teatro Marília, a retomada ficou a cargo da Cia. Produz Ação Cênica, que entre os dias 8 e 12 apresentou os espetáculos “A porta e o vestido” e “O homem do caminho”. Na sequência, entre os dias 18 e 26, o mesmo palco foi ocupado pela peça “Capitão fracasso”, dirigida por Luiz Paixão. Já o Teatro Raul Belém Machado reabriu as cortinas com a montagem “Diógenes”, dirigida por Fernando Chagas, em 5 de setembro.

O fato de os espaços culturais estarem novamente abertos não significou, no entanto, uma adesão integral de artistas e produtores ao formato presencial. Entre 10/9 e 2/10, sempre aos sábados, o ator Odilon Esteves apresentou a “peça-literária” on-line e interativa “Na sala com Clarice”, com textos da autora de “A hora da estrela” escolhidos pelo público e interpretados por ele, via plataforma Zoom.

Na rota da circulação nacional de artistas e espetáculos, a capital mineira recebeu uma verdadeira maratona da atriz carioca Clarice Niskier, que entre 10 e 12 de setembro apresentou três peças – “A alma imoral”, “A lista” e “A esperança na caixa de chicletes Ping Pong” – no Cine Theatro Brasil Vallourec, com a presença do público. 





Na sequência, cumpriu temporada do espetáculo “Coração de campanha” no CCBB-BH, de 17/9 a 18/10, atraindo um grande número de espectadores com uma história que partia de sua própria experiência na pandemia.

O CCBB-BH também recebeu, entre 18/9 e 11/10, o espetáculo infantil vencedor do prêmio APCA (Associação Paulista dos Críticos de Arte) “Vamos comprar um poeta”, inspirado no livro homônimo de Afonso Cruz e dirigido por Duda Maia.

IMPACTOS 

Já no final de setembro, a presidente do Sindicato dos Artistas e Técnicos em Espetáculos de Diversões do Estado de Minas Gerais (Sated), Magdalena Rodrigues, identificava uma movimentação ainda tímida de atores e produtores mineiros no sentido de retomar as atividades presenciais. 





“Ninguém tem dinheiro para colocar um espetáculo em cartaz, porque isso tem um custo com transporte, alimentação, equipamento, enfim, mesmo pensando em despesas mínimas, o pessoal está sem dinheiro”, disse, à época.

A despeito da situação de penúria apontada por Magdalena, alguns representantes da classe teatral de Belo Horizonte emplacaram com êxito montagens no formato presencial. O espetáculo “Wilde.Re/Construído”, com texto e direção de Sergio Abritta, fez quatro sessões no Teatro João Ceschiatti, do Palácio das Artes, em setembro, e uma no Cine Theatro Brasil Vallourec, onde havia estreado virtualmente, em outubro.

A crescente retomada do modelo presencial não aboliu, contudo, as apresentações on-line e híbridas. “Diógenes”, que já havia sido visto pelo público no Teatro Raul Belém Machado, foi exibido, em 30/9, pelo canal do Memorial Vale no YouTube; A-Mostra.lab também transmitiu, pelo YouTube, entre 22/9 e 27/9, as 26 obras que compunham sua programação, com algumas delas disponibilizadas também no Instagram; e o musical “Aladim – Pocket show” teve exibição no formato drive-in, no início de outubro, no estacionamento do Minas Shopping, com transmissão ao vivo pelo canal da Fundação ArcelorMittal no YouTube, dentro do projeto Diversão em Cena.





A montagem “Pá de cal (Ray-lux)”, da carioca Cia. Teatro Independente, é outra que veio de fora do estado neste período de retomada das atividades presenciais. Com dramaturgia de Jô Bilac e direção de Paulo Verlings, cumpriu temporada entre 23/10 e 15/11 no CCBB-BH. “Tenho a impressão de que o ‘pré-pandemia’, quando essa peça foi escrita, foi no século passado. Tenho consciência de que muitas coisas mudaram”, disse Bilac.

Em 23 de outubro, o grupo Armatrux abriu as portas de seu espaço, o C.A.S.A. – Centro de Arte Suspensa & Armatrux, em Nova Lima, para um evento presencial e gratuito que marcou o início das comemorações por seus 30 anos, com a apresentação dos espetáculos “Armatrux: A banda” e “Seu Geraldo”, da Cia. Pigmaleão. No final daquele mês, nos dias 29 e 30, Diogo Vilela trouxe a BH a peça “Cauby, uma paixão”, apresentada no Cine Theatro Brasil Vallourec.

O mês de novembro começou com o Festival Estudantil de Teatro (Feto) apresentando, ao longo de nove dias, sua programação totalmente on-line, recheada de cenas curtas que flertavam com a linguagem cinematográfica. Mas também foi um mês marcado pela definitiva inclusão de BH no roteiro das apresentações presenciais de espetáculos vindos de fora.





Ao longo do mês, passaram pela cidade Letícia Sabatella e Fernando Alves Pinto, com o espetáculo “Piaf e Brecht – A vida em vermelho”, no dia 5; Grace Gianoukas, com o show de humor “Grace em revista”, no dia 15; Maitê Proença, com a peça “O pior de mim”, no dia 20; e a Cia. de Comédia Os Melhores do Mundo, com a montagem “Hermanoteu na terra de Godah”, no dia 21. As três primeiras foram apresentadas no Cine Theatro Brasil Vallourec, enquanto Os Melhores do Mundo subiram ao palco do Grande Teatro Cemig do Palácio das Artes.

Em 4 e 5 de dezembro, Belo Horizonte ainda seria palco para a apresentação da peça “A lista”, protagonizada por Lilia Cabral e por sua filha, Giulia Bertolli, também no Cine Theatro Brasil Vallourec.

REENCONTRO 

Um evento marcante da retomada das atividades presenciais na esfera teatral foi a Mostra Reencontro, promovida pelo Galpão Cine Horto, que, após quase dois anos de portas fechadas, abrigou, ao longo do mês de novembro, 10 espetáculos de diferentes companhias da cidade. 





Sem descartar o modelo do público presente, o Grupo Galpão manteve também suas atividades no on-line e estreou, no último dia 4, em seu canal no YouTube, a peça-filme “Partida de vôlei à sombra do vulcão”, novo fruto do projeto Dramaturgias – Cinco Passagens para Agora.

No atual momento, uma parte da produção local vai ao encontro do público, ao passo que outra ainda opta pelo ambiente digital. Na primeira categoria está, por exemplo, a montagem “Sal”, da Margem Cia. de Teatro, com direção de Rita Clemente, apresentada no início deste mês no Galpão Cine Horto.

Seguiram no modelo remoto os espetáculos “Aliç n’país d’jogo d’bich”, dos formandos do Cefart, apresentado em novembro; “Às que aqui ficaram”, da Tríade Cia. de Teatro, que estreou no último dia 5 e segue em temporada até janeiro, com transmissão on-line e ao vivo, diretamente do Teatro Espanca!; e “Corações trapezistas”, do Circo Sufoco, com direção de Chico Pelúcio, que fica disponível gratuitamente até o próximo dia 18 no canal da trupe no YouTube.

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