Estandarte traz arte na palavra, beleza no visual, símbolo na forma e criatividade nas tramas do tecido, fitas, rendas, contas e em outros elementos das tradições mineiras. Em Caeté, na Região Metropolitana de Belo Horizonte, um grupo de 12 bordadeiras decidiu contar a história da cidade e destacar as manifestações culturais em uma coleção já exposta na sede da prefeitura, em espaço público. De caráter itinerante, a mostra vai chegar aos olhos de toda a população local. “Se somos 12, fizemos 12 estandartes”, diz a pedagoga aposentada Lêda das Graças Costa Ferreira, dona de um ateliê no Centro de Caeté.
Integrantes da recém-criada Associação das Bordadeiras e Artesãos de Caeté – Historiarte, que reúne mulheres de 23 aos 80 anos, a maioria na faixa dos 50, essas moradoras da cidade recriaram, com agulha, linha e dedicação, igrejas barrocas, casarões coloniais, procissões, manifestações da devoção popular, a exemplo do congado, Cavalhada do Morro Vermelho e pontos de destaque no município, como a Serra da Piedade, que guarda na ermida do século 18, a menor basílica do mundo, a imagem da padroeira de Minas, Nossa Senhora da Piedade.
Em resumo, está ali um painel da cultura e do respeito pelas tradições marcado pela delicadeza de transformar em bordado a história da antiga Vila Nova da Rainha, uma das Sete Vilas do Ouro de Minas Gerais e palco da Guerra dos Emboabas (1707-1709).
O trabalho começou com o registro escrito pelas bordadeiras a partir da rica oralidade dos moradores de Caeté. A pesquisa transformou-se em traçados, ganhou cores e, finalmente, a forma de estandartes medindo 90 centímetros de altura por 60cm de largura. No material, linho e brim no tom bege, fitas de cetim coloridas nas laterais e formando franjas, rendas, contas e o cordão de São Francisco, no alto, para pendurar na parede. A produção das peças ocorreu durante a pandemia, com recursos da Lei Aldir Blanc de Apoio à Cultura.
Além de Lêda das Graças Costa e Francisca Paulino Figueiredo, fazem parte da associação as bordadeiras Heloisa Helena Urias Pinto Cândido, responsável pelos desenhos de cada estandarte, Karina Aparecida Gomes, Maria Balbina Ferreira, Maria de Fátima Costa, Maria de Lourdes Valéria Costa, Mauniz Profeta Urias Pinto, Olga Coelho Ferreira Marques, Simone Natália Guedes Santos, Vera Marques e Zélia Maria Urias Sérgio.
O grupo registrou em texto os objetivos da missão: “Queremos, com nosso trabalho, transmitir valores da importância que preenche a alma de quem borda ou vê um bordado. São processos individuais – o da bordadeira e o de quem aprecia. Pelo bordado, podemos mudar o olhar de quem vê ao retratar afetivos importantes ou a história que ele traz. É passar a essência, a alma.”
E mais: “Numa transmissão de história por linhas e agulhas, decidimos produzir registros de culturas populares pelo bordado na trama do tecido e apresentar, em forma de estandarte, bandeiras imponentes que retratam o fazer cultural de um povo, e este povo somos nós. Um povo que emana rica cultura popular. Reafirmamos um propósito: Bordando, mantemos viva nossa história, valorizamos nossas riquezas e somos mais felizes juntas.”
Os 12 estandartes retratam da cavalhada a presépios, procissões e outros registros da fé, além do carnaval e música. Os próximos passos da exposição estão sendo estudados em conjunto, e tudo vai depender do tempo, tendo em vista a temporada de chuvas e os rumos da pandemia. Informações estarão no Facebook Historiartes Bordadeiras.
Erguendo a bandeira
Tradição popular, o estandarte retrata aspectos religiosos. A bandeira é muito bordada, com a presença de fitas, fuxicos e outros elementos de grande significado para uma comunidade.
Assim, a Associação das Bordadeiras Historiarte, de Caeté, decidiu usar os estandartes como imponente bandeira para registrar e deixar no tecido, ponto a ponto, fio a fio, a rica cultura local
para as futuras gerações.
Os estandartes
Cavalhada de Nossa Senhora de Nazareth – Distrito de Morro Vermelho
. Bordado de Karina Aparecida Gomes
A tradicional festa, mais antiga encenação da cavalhada em Minas, ocorre desde 7 de setembro de 1704
Boi da Manta – Bloco do Maracatu
. Bordado de Maria de Lourdes Valéria Costa
No carnaval, o Bloco do Maracatu saía com seus bonecos gigantes (hoje em restauração) pelas ruas de Caeté
Tradição das Coroações
. Bordado de Zélia Maria Urias Sérgio
Tradição pertencente ao patrimônio espiritual da igreja. Homenagear e coroar a Virgem Mariafaz parte da cultura popular religiosa nas igrejas locais
Festa do Divino Espírito Santo – Roças Novas
. Bordado de Heloisa Helena Urias Pinto Cândido
Festa cristã, de nome litúrgico Festa de Pentecostes. Perpetua a devoção e o amor ao Divino Espírito Santo
Levantamento de Mastro – Praça da Matriz de Nossa Senhora do Bom Sucesso
. Bordado de Mauniz Profeta Urias Pinto
A celebração com a bandeira de Nossa Senhora do Bom Sucesso ocorria após a procissão, ao som do congado e banda de música, na porta da Matriz de Nossa Senhora do Bom Sucesso
Novena – Tradição Católica
. Bordado de Vera Marques
Fiéis se reúnem, rezando para pedir a intercessão aos santos protetores. Por anos a fio, a tradição vem ocorrendo nas casas, ruas e igrejas
Tradição dos Presépios
. Bordado de Lêda das Graças Costa Ferreira
A alusão ao presépio de dona Corinta, que ocupava um cômodo inteiro da casa dela, é uma forma de destacar o cuidado e a tradição da criação de presépios em Caeté
Seresta da Lua Cheia
. Bordado de Olga Marques Costa Ferreira
Evento ocorre a cada primeira sexta-feira de lua cheia do mês, no coreto da Praça da Matriz de Nossa Senhora do Bom Sucesso
Procissão
. Bordado de Simone Natália Guedes
Festivo ou ato de penitência, o cortejo solene é dedicado a um santo ou uma santa, passando pelas ruas, geralmente ao redor de alguma igreja
Tradição do Banho em Nosso Senhor dos Passos no distrito de Morro Vermelho
. Bordado de Francisca Paulina Figueiredo Silva
O banho de cachaça na imagem de Nosso Senhor dos Passos ocorre na quarta-feira de cinzas, na Igreja Matriz de Nossa Senhora de Nazareth. De acordo com o relato popular, a madeira banhada fica livre dos cupins
Festa de Santo Antônio – Rancho Novo
. Bordado de Maria Balbina Ferreira
As festividades do padroeiro de Rancho Novo começam com a Trezena a Santo Antônio, nas casas. Acompanhada por congado, a bandeira segue em procissão pelas ruas ornamentadas rumo à capela
Padroeiros
. Bordado de Maria de Fátima Costa
São Caetano foi proclamado pelos devotos o primeiro padroeiro de Caeté. Anos mais tarde, Nossa Senhora do Bom Sucesso foi escolhida pelos fiéis como a padroeira da cidade
Fonte: Associação das Bordadeiras e Artesãos de Caeté – Historiarte