Para Zeca Camargo, escrever "Elza", o livro, foi um luxo. Concebida após dezenas de horas de entrevistas com a cantora Elza Soares, a biografia foi lançada em 2018, após ser escrita ao longo de 11 meses, com base em sessões de conversas iniciadas em julho de 2017.
"É um luxo porque tenho uma biografia em que a biografada está aqui, disposta a falar, oferecendo suas memórias. E vem uma história oral. Já se escreveu muita coisa sobre a Elza, mas é a primeira vez que ela dá a versão dela. Mesmo quem conhece a biografia da Elza vai ter algumas surpresas no livro", contou Camargo, na ocasião do lancamento do livro. A cantora morreu nesta quinta-feira (20/1), de causas naturais, aos 91 anos, no Rio de Janeiro.
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Leveza
"É um luxo porque tenho uma biografia em que a biografada está aqui, disposta a falar, oferecendo suas memórias. E vem uma história oral. Já se escreveu muita coisa sobre a Elza, mas é a primeira vez que ela dá a versão dela. Mesmo quem conhece a biografia da Elza vai ter algumas surpresas no livro", contou Camargo, na ocasião do lancamento do livro. A cantora morreu nesta quinta-feira (20/1), de causas naturais, aos 91 anos, no Rio de Janeiro.
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Cantora Elza Soares morre aos 91 anos
A memória de Elza para as sessões era a mesma da menina de 13 que gostava de brincar com os garotos na rua e fingia dramas para comover passantes e ganhar um trocado.
"Toda a memória dela é impressionante. Ela lembra de tudo", garantiu Camargo, na ocasião do lançamento do livro. "Lembra de detalhes, da roupa que tava usando, o que alguém falou. Quando alguém faz uma biografia, geralmente, o problema é a memória. A pessoa não lembra muita coisa. No caso da Elza, ela lembra demais, a gente tem de selecionar." Nas 384 páginas da biografia, é sempre a perspectiva da cantora que predomina.
"Toda a memória dela é impressionante. Ela lembra de tudo", garantiu Camargo, na ocasião do lançamento do livro. "Lembra de detalhes, da roupa que tava usando, o que alguém falou. Quando alguém faz uma biografia, geralmente, o problema é a memória. A pessoa não lembra muita coisa. No caso da Elza, ela lembra demais, a gente tem de selecionar." Nas 384 páginas da biografia, é sempre a perspectiva da cantora que predomina.
Talvez esse detalhe seja o aspecto mais interessante do livro. A tragédia sempre fez parte da vida de Elza. Menina, foi obrigada pelo pai a casar-se aos 13 anos porque ele achou que uma briga com um menino havia resultado em estupro. Elza jura que nada aconteceu, a não ser a briga em si. Mas ela casou-se. Não se interessava por fazer sexo, mas fazia porque era obrigada. Perdeu dois filhos desse primeiro casamento e outro da união com Mané Garrincha. Sofreu com violência doméstica e, quando menina, se assustou quando ouviu de São Jorge, no que ela chama de aparição, que apanharia mais da vida do que do pai. Elza era criança traquina e levava surras quando aprontava na rua, onde gostava de passar tempo em companhia da meninada.
Leveza
Na fala da cantora, no entanto, a história toma outro peso. Combinada com a costura de Zeca Camargo, a fala de Elza tem uma certa leveza. Ela não se esquivou das passagens difíceis, mas como não é de sucumbir à dor, seguia em frente. "O que é impressionante são as reviravoltas na vida dela. Não é que ela teve um alto e um baixo, ela teve vários altos e baixos e não desistiu. Ela tinha quase 70 anos quando a carreira tava meio à deriva e ela falou: vou fazer o disco que eu quero. E fez 'A mulher do fim do mundo'", diz Camargo.
Era, nas palavras dele, uma vontade de viver muito grande que fazia com que Elza naveguesse por ciclos difíceis sem deixar de produzir de forma brilhante. "Ela nunca foi acomodada. Isso é impressionante", diz.
Era, nas palavras dele, uma vontade de viver muito grande que fazia com que Elza naveguesse por ciclos difíceis sem deixar de produzir de forma brilhante. "Ela nunca foi acomodada. Isso é impressionante", diz.
Segundo Camargo, Elza era uma pessoa muito zelosa, especialmente quando se tratava da imagem da família. "Às vezes, tenho a sensação de que ela está fazendo quase um testamento para a família. Sobretudo, em momentos difíceis", contou o escritor, na ocasião.
Um dos momentos mais difíceis das conversas para o livro foi quando narrou a morte de Juninho, como chamava Manoel Francisco dos Santos Júnior, único filho que teve com Garrincha. O menino morreu aos 9 anos, em 1986, em um acidente de carro. "Ali, ela foi pro fundo do poço", lembra Camargo.
Um dos momentos mais difíceis das conversas para o livro foi quando narrou a morte de Juninho, como chamava Manoel Francisco dos Santos Júnior, único filho que teve com Garrincha. O menino morreu aos 9 anos, em 1986, em um acidente de carro. "Ali, ela foi pro fundo do poço", lembra Camargo.
Elza narrou com detalhes muitos gráficos os obstáculos enfrentados e revelou preferir o isolamento em momentos de crise. "E não tem família, amigo, empresário. Quando você fala 'Elza sumiu, tem dois anos que não grava', é porque estava em um momento de questionamento", explicou o autor.
Elza usava uma metáfora relacionada ao próprio reflexo e diz que sumiu porque estava olhando no espelho até achar a Elza que ela conhece. "Essa vontade é muito impressionante. Quando alguém fala que tem dificuldade na vida, eu falo: 'vou te contar uma história da Elza Soares'", avisou Zeca Camargo.
Elza usava uma metáfora relacionada ao próprio reflexo e diz que sumiu porque estava olhando no espelho até achar a Elza que ela conhece. "Essa vontade é muito impressionante. Quando alguém fala que tem dificuldade na vida, eu falo: 'vou te contar uma história da Elza Soares'", avisou Zeca Camargo.
Reinvenções
Os momentos tristes da biografia são tão marcantes quanto aqueles nos quais Elza Soares se reinventa. E são muitas essas reinvenções. Musicalmente, mas também como mulher. Logo após a morte de Juninho, ela passou a ser procurada pela geração do rock, que despontava na cena da música nacional. Gravou com Cazuza e Lobão. Branco Melo quis produzir um disco que nunca saiu.
Mas foi em 2000 que passou por sua mais recente reinvenção. Apaixonou-se novamente, coisa que não acontecia desde o relacionamento com Garrincha, por um rapaz 47 anos mais novo. Anderson Lugão, 25, foi parceiro amoroso e musical. Ajudou Elza a produzir "Do cóccix até o pescoço", uma espécie de renascimento no qual a cantora deu as mãos à cena que revitalizou a música brasileira.
Mas foi em 2000 que passou por sua mais recente reinvenção. Apaixonou-se novamente, coisa que não acontecia desde o relacionamento com Garrincha, por um rapaz 47 anos mais novo. Anderson Lugão, 25, foi parceiro amoroso e musical. Ajudou Elza a produzir "Do cóccix até o pescoço", uma espécie de renascimento no qual a cantora deu as mãos à cena que revitalizou a música brasileira.
Com Anderson, ela foi apresentada ao hip-hop carioca, à música eletrônica e deu novo rumo à própria música. "epois de 50 anos de carreira, eu não queria mais fazer a mesma coisa. Eu não queria ficar reciclando o samba que eu já tinha explorado tão bem. Tinha que olhar pra frente, descobrir outras coisas, usar minha voz de outras maneiras. Eu estava buscando", contou a cantora.
O casamento com Lugão acabou em 2008 e, no mesmo ano, Elza começou a namorar Bruno Lucide, 52 anos mais novo. Transgressão era quase um sobrenome para a artista. Às críticas, ela virava as costas. Ao amor, ela abria a porta. Não importa a idade. Essa última, aliás, sempre foi motivo de controvérsia na vida de Elza, devido a uma série de registros oficiais imprecisos. Mas pouco importa. É como ela explicou ao final do livro: "Não tenho idade, Zeca, tenho tempo".