Jornal Estado de Minas

TÚNEL DO TEMPO

Cantor Sergiopí reúne memórias musicais de sua vida no disco 'Praeteritum'

“Praeteritum”, o novo álbum do cantor e compositor carioca Sergiopí, tem de tudo um pouco: Candeia, Milton Nascimento e Fernando Brant, Chico Buarque, Tim Maia, Marina Lima e até música da trilha sonora do filme “Os embalos de sábado à noite continuam”. As oito canções “lado B” fazem parte das memórias de Sergio.





“Resolvi dar uma vasculhada no repertório que eu costumava ouvir e cantar. Aí, comecei a conversar com Wado, em Alagoas, e Marco Bombom, no Rio de Janeiro. Começamos alguns testes: mandava para eles a base que fazia em casa mesmo, ao piano, e gravava com o celular, mostrando uma ideia de groove, levada e tom. Depois os dois elaboravam os arranjos”, conta Sergiopí.

ALAGOAS E RIO 

A produção de “Praeteritum” é assinada por Wado, Marco Bombom e Hiroshi Mizutani. O trabalho foi realizado entre julho e setembro de 2021, em Alagoas e no Rio de Janeiro. O disco chega depois dos autorais “Meu pop é black power” (2015) e “Auradelic” (2020). A cantora paulista Patrícia Marx faz participação especial na faixa “Uma antiga manhã”.

“Praeteritum” é um “disco da pandemia”. Durante o confinamento social, Sergio ficou muito tempo em casa, compondo e recordando sua infância e adolescência. Ele conta que se lembra pouco dos anos 1970, “época estranha, período de ditadura”, mas comenta que a música, na época, “acalentava os nossos corações”.





Nesse “túnel do tempo”, Sergiopí voltou às férias escolares no litoral fluminense, resgatando canções que ouvia naquela época. E não se esquece de um pedido que fez ao pai: assistir a “Os embalos de sábado à noite”, filme estrelado por John Travolta e lançado em 1978. Não deu: o menino era muito novo, seria barrado na porta.


“Em 1983, ele tentou me levar a 'Os embalos de sábado à noite continuam', mas também não conseguiu, porque eu ainda era moleque”, relembra Sergio, referindo-se ao longa em que Travolta foi dirigido por Sylvester Stallone.

Por volta dos 14 anos, ele passou a colecionar LPs com trilhas sonoras. Diz que comprava quase tudo que saía. “Garoto, ouvi muito a norte-americana Cynthia Rhodes cantar 'Finding out the hard way', um dos temas do filme ‘Os embalos de sábado à noite continuam'. Sabia de cor, cantava em casa, sozinho ao piano. Por isso resolvi gravá-la.”





A família dele, aliás, é para lá de musical. O pai foi criado no bairro da Saúde, referência da boemia carioca. O avô era amigo do mineiro Ary Barroso (1903-1964), autor de “Aquarela do Brasil”,  e da cantora Núbia Lafayette (1937-2007), que frequentavam festas na casa dele.

O novo trabalho é um álbum de recordações, com músicas marcantes na vida de Sergio. “Preciso me encontrar”, por exemplo, lembra as histórias que a mãe lhe contava sobre o avô, que não conheceu. Preso político, ele morreu na cadeia, na Ilha Grande (RJ). “Filiado ao Partido Comunista, foi torturado. Gravei ‘Preciso me encontrar’ como homenagem a ele, que se chamava Dagmar Almeida.”

SALTIMBANCOS 

Sergiopí criou 'túnel do tempo musical' em seu disco de regravações (foto: A. Lopes/Divulgação)
Depois de “Preciso me encontrar” vem “Alô, liberdade”, de Chico Buarque, Luís Henrique Bacalov e Sergio Bardotti, canção da trilha do filme “Os saltimbancos trapalhões”.





“Quem associar uma faixa à outra vai ver que o disco tem o pé em um discurso velado”, comenta Sergio. “Recado”, de Gonzaguinha, fecha o álbum.

Ao comentar o repertório que escolheu, o cantor evita dar “spoilers”. “Acho mais legal a pessoa decupar, entender e ouvir para chegar às próprias conclusões”, comenta. 

Mas conta que gravar “Recado” foi especial. “Quis desconstruir a música. Passei para Bombom algumas referências e ele fez um arranjo mais vazio, com mais guitarras e baixo, com leve groove de percussão e bateria. No final tem uma surpresa, coloquei um caco, mas prefiro deixar para que as pessoas ouçam e descubram. É uma palavrinha forte”, adianta.

A única canção que não faz parte das lembranças de Sergio é “Over again”, de Tim Maia. “Quem me aplicou foi o Bombom, que conhece muito o trabalho dele, porque inclusive trabalhou com Ed Motta e a banda Conexão Japeri”, conta, referindo-se ao sobrinho do “Síndico”. “Tim tem umas 20 músicas compostas em inglês. Essa canção me tocou bastante.”





Sócio da gravadora Lab 344, Sergiopí diz que durante a pandemia encontrou os novos parceiros Momo e Wado. “Praeteritum” foi feito em menos de dois meses. “O repertório foi até muito fácil de achar”, comenta.

“FUTURUM” 

Depois do disco de  regravações, ele planeja o autoral “Futurum”, só com inéditas. Serão oito faixas e deve sair até junho. Dois singles já estão previstos para março e abril.

“Meu parceiro Momo está morando em Londres. Rola muita coisa pelo WhatsApp. Wado até já mandou várias letras. Até agora, gravei faixas com baixo, piano e bateria”, diz.

O pianista Lulu Martin e o baterista Diogo Macedo são os companheiros de estúdio de Sergio, além de Bombom.



 “Será um disco mais orgânico, sem eletrônica. Digamos que tem referência meio Carly Simon, Al Jarreau e Norah Jones. Talvez entre um trompete ou outra coisa de sopro, vamos ver”, conclui.

REPERTÓRIO

“PRECISO ME ENCONTRAR”
De Candeia

“ALÔ, LIBERDADE”
De Chico Buarque, Luís Henrique Bacalov e Sergio Bardotti

“COISAS DA VIDA”
De Milton Nascimento e Fernando Brant

“OVER AGAIN”
De Tim Maia

“NADA SEM VOCÊ”
De Ivan Lins, Celso Viáfora e Ivano Fossati

“UMA ANTIGA MANHÔ
De Marina Lima e Antonio Cicero

“FINDING OUT THE HARD WAY”
De Frank Stallone e Roy Jason Freirich

“RECADO”
De Luiz Gonzaga Jr.


“PRAETERITUM”

(foto: LAB 344/REPRODUÇÃO)

• Disco de Sérgiopí
• Lab 344
• Oito faixas
• Disponível nas plataformas digitais