Jornal Estado de Minas

ARTE URBANA

Mag Magrela começa a pintar hoje painel de 72 metros no Centro de BH


Desde 2017, o CURA – Circuito Urbano de Arte trabalha para transformar Belo Horizonte em uma galeria a céu aberto, com pinturas gigantes que colorem os prédios do Centro da cidade. As obras, que são uma espécie de ode à democratização da arte, já que podem ser vistas por qualquer pessoa, alteram o cartão-postal da capital mineira e reafirmam a ocupação do espaço urbano.



Em sua sexta edição, o evento tem como palco a região da Praça Raul Soares, lugar que, desde o segundo semestre de 2021, vem recebendo intervenções artísticas. O grupo de teatro de bonecos Giramundo inaugurou no local sua instalação “Gira de novo”, na última segunda-feira (14/2). As esculturas gigantes que convocam a retomar o espírito da alegria ficarão em exposição até o próximo dia 25.

A partir desta quinta-feira (17/2), uma nova intervenção do CURA começa a nascer, pelas mãos da multiartista paulistana Mag Magrela, que fará uma pintura inédita na empena do Edifício Savoy, localizado na Avenida Bias Fortes. Ao lado de uma equipe formada pelas artistas Wanatta e Fenix, sob a coordenação de Nath Sol e produção de PDR e Simone Abreu, a artista prevê que o painel de quase 650 metros quadrados (m²) estará pronto em uma semana.

“Tudo depende muito do tempo. Se tudo der certo, acredito que a pintura estará pronta em sete dias, mas isso depende de fatores que estão fora do nosso alcance. A parte mais difícil é fazer a projeção do desenho, riscar a parede para saber onde cada elemento do desenho vai. Depois disso, é só colocar a tinta", conta Magrela, que chegou a BH na manhã de quarta-feira (16/2).




Inaugurada na última segunda, a instalação "Gira de novo", feita pelo Giramundo na Praça Raul Soares, pode ser vista até o próximo dia 25 (foto: Gladyston Rodrigues/EM/D.A Press)

EQUIPE 

Assim que colocou os pés na capital mineira, a artista foi para o hotel onde ficará instalada nos próximos dias para descansar. À tarde, ela esteve no local onde será feita a pintura para o curso de altura, etapa importante para quem ficará suspensa no edifício pelos próximos dias. Depois disso, ela voltou para o descanso. Afinal, realizar uma empena é um trabalho que exige muito do corpo da artista.

"É muito físico", ela explica. "O que eu posso fazer antes de começar, além de conhecer o local da pintura, é descansar. Também tenho bastante cuidado com o meu condicionamento e a minha saúde antes desses trabalhos grandiosos. No caso desta pintura, uma equipe vai estar junto comigo, no prédio, e isso ajuda muito."

Artista autodidata, com trabalhos nas ruas de São Paulo, Rio de Janeiro, Portugal, Londres e Nova York, Mag Magrela foi selecionada para participar do CURA por meio da convocatória Beck's. Essa foi a segunda vez que ela se inscreveu no edital.





"Na última edição eu também me inscrevi e não passei. Nesta de agora, eu voltei a me inscrever e fui chamada para participar. O CURA tem uma curadoria muito legal, e eu fico muito feliz de poder participar de uma iniciativa tão bacana. Acompanho esse projeto desde o início e é um grande orgulho para mim poder fazer parte dele", afirma.

A obra que ela irá pintar na parede do Edifício Savoy está dentro da temática de seus outros trabalhos, marcados pela presença de figuras femininas que passam uma sensação de angústia, melancolia e morbidez.

PERSONAGENS 

"Vou fazer duas personagens mulheres lado a lado. Uma representa o passado e a outra o presente, com olhar no futuro. Uma delas carrega um peixe na mão, que simboliza o alimento espiritual. As duas representam a energia do feminino que todos nós temos. A energia do cuidado e da criação, que são forças surreais", diz.





Ela acrescenta que o significado do desenho se relaciona com questões pessoais enfrentadas nos últimos anos. "Ele fala sobre esse momento que estou passando na minha vida pessoal, em que preciso tomar decisões importantes que vão definir o território onde eu vou me enraizar. Olhando para o ano de 2020 e para a pandemia em que ainda estamos, uma série de questões delicadas vieram à tona. Estou no momento de entender tudo isso para tomar o caminho que será o melhor para mim."

Essa não é a primeira vez que Mag Magrela realiza um trabalho em Belo Horizonte. Em 2015, ela foi uma das convidadas do projeto Telas Urbanas, iniciativa da Fundação Municipal de Cultura para promover a arte mural na região da Pampulha. Na ocasião, ela pintou um painel de 72m2 no Viaduto Gil Nogueira, na Avenida Portugal. A obra fazia referência ao rompimento da barragem de rejeitos da mineradora Samarco, em Mariana.

Desde então, ela não tinha colocado os pés em BH, mais e se surpreendeu ao chegar aqui e se deparar com a Serra do Curral. "A cidade fica na frente de umas montanhas que são mais altas que a cidade em si. Isso me chamou muito a atenção", afirma.




REVERBERAÇÃO 

"Eu sinto que todos os lugares para onde eu vou me acessam de alguma maneira, tanto as coisas boas quanto as ruins. Nós que somos de fora olhamos a cidade com um outro olhar, de um jeito diferente, e isso acaba me inspirando inevitavelmente. Todas as questões, as boas e as ruins, me afetam e reverberam no trabalho que eu vou realizar", comenta.

Na ativa desde 2007, quando começou a pintar nas ruas de São Paulo sob o nome artístico que pegou emprestado da maneira como era chamada de forma pejorativa na escola, a artista assistiu a uma verdadeira revolução na arte de rua, que passou de marginalizada a cultuada, inclusive por órgãos oficiais. Para ela, essa mudança ocorreu devido a iniciativas como a do CURA, mas também em virtude da relação que as pessoas desenvolveram com o espaço urbano nos últimos anos.

"As pessoas se apropriaram da cidade de alguma maneira. E digo isso não só em relação ao tipo de trabalho que eu faço, mas também em relação a outras manifestações artísticas, como o teatro e a música, por exemplo. Quando a rua é ocupada, as pessoas se sentem à vontade para estar nela. Onde tem cuidado e ocupação, as pessoas se sentem parte de um todo. Quando a arte está nesses lugares de passagem, ela afeta as pessoas de uma forma diferente e tem um poder maior de transformação", avalia.

Ciente de que as imagens do CURA são bastante fotografadas e reproduzidas nas redes sociais, Mag Magrela diz achar positivo que as pessoas se relacionem com as obras de arte dessa maneira. "É inerente. A gente faz um trabalho e utiliza essa ferramenta para divulgar para muitos outros lugares. Quando comecei, a gente usava muito o Flickr. Foi por meio dele que eu conheci artistas de vários lugares do mundo. Hoje, esse tipo de relação que as pessoas têm é por causa da identificação. E o importante é que o trabalho seja visto."