Hamilton de Holanda, já há algum tempo, é um dos músicos brasileiros de maior evidência na cena nacional e internacional. Com produção incessante, nem mesmo a pandemia foi obstáculo para ele. Neste início de ano, o bandolinista, compositor e arranjador lançou o álbum “Maxixe samba groove”. Logo em seguida, seguiu para a Europa, onde cumpriu nova turnê na França, Itália e Espanha.
A maioria do repertório do novo disco foi composta durante a quarentena. “Luz de vida”, uma das oito faixas, é a única que não leva a assinatura de Hamilton. O tema foi composto pelo filho dele, Gabriel, que toca bandolim, e pelo sobrinho e contrabaixista Bento Tibúrcio, filho do violonista Fernando César. Ambos participaram da gravação.
“Há algum tempo venho tocando com meu pai. Quando ele ia gravar o novo disco, quis que eu participasse. Aí, sugeri que Bento Tibúrcio, meu primo, também tomasse parte”, conta Gabriel Holanda. “Em cima de uma harmonia criada por meu pai, eu e o Bento compusemos 'Luz de vida'. Ficamos felizes com a nossa estreia como compositores”, acrescenta.
Nas outras faixas, Hamilton foi acompanhado pelos talentosos instrumentistas André Vasconcellos (baixo), Antônio Neves (bateria) e André Siqueira (percussão), que têm tocado com Caetano Veloso, Milton Nascimento, Ivan Lins, Djavan, Zeca Pagodinho, Marisa Monte, Simone e Mart'nália.
Nas gravações, Hamilton utilizou vários bandolins. Um deles, de 10 cordas, foi construído pelo bombeiro e luthier Davi Lopes, que utilizou madeiras de mais de 200 anos salvas do incêndio do Museu Nacional, no Rio de Janeiro, ocorrido em 2018.
Foram usados outros seis bandolins: dois de Tércio Ribeiro e os de Pedro Santos, Rozini HH e Elifas Santana, além do que foi cedido pelo Instituto Jacob do Bandolim.
Também marca presença em “Maxixe samba groove” a flautista e cantora indiana Varijashree Venugopal, cuja voz é ouvida em “Choro fado”, a faixa de abertura gravada em Bangalore, na Índia. O saxofonista norte-americano Chris Potter, estrela do jazz moderno, a quem Hamilton conheceu num festival em Miami, faz o solo em “Afro choro”, gravada em Nova York.
O disco traz também as faixas “Bruzinho”, “Em nome da esperança”, “Ritmo e união”, “Tá nascendo flor no asfalto” e o tema que dá título ao trabalho.
Na gravação e mixagem do projeto foi utilizado o estúdio de Daniel Musy, parceiro de Hamilton desde o seu primeiro disco solo, lançado em 2002. A masterização ficou a cargo de André Dias, assim como ocorreu nos CDs “Casa de Bituca” e “Baile do Almeidinha”, além da série “Caprichos”.
A capa do álbum, idealizada por Enio Souza, tomou como referência uma imagem de Pang Way, fotógrafo da Malásia, especialista em vida selvagem – especialmente insetos. De acordo com Hamilton, o louva-a-deus retratado remete à esperança, sentimento comum nos momentos de dificuldade.
“Maxixe samba groove” foi coordenado por Marcos Portinari, produtor e empresário do bandolinista desde 2005. Os dois estiveram lado a lado em premiados projetos, entre os quais “Bossa negra”, “Canto de praya”, “Mundo de Pixinguinha” e “Samba de Chico”.
“MAXIXE SAMBA GROOVE”
Álbum de Hamilton de Holanda
Oito faixas
Brasilianos
Disponível nas plataformas digitais
O título “Maxixe samba groove” pode ser visto como a síntese de seu novo projeto?
O maxixe e o samba mostram de onde vem minha música. Já o groove abre caminho para outras referências/influências, como o jazz. O disco abre espaço para outros ritmos, como o hip-hop instrumental e o choro, minha língua materna, que é uma consequência do maxixe, irmão do samba. Então, o título remete às ideias da concepção do disco.
Quando foram compostas as músicas?
A maioria das músicas foi feita no auge da pandemia, em 2020. Ano bissexto, quando fiz 366 músicas, uma por dia. “Tá nascendo flor no asfalto”, “Afro choro”, “Choro fado” e “Ritmo e união” são dessa leva. Já “Maxixe samba groove” foi composta perto da gravação do disco.
Qual foi a sensação de gravar com Gabriel Holanda, seu filho?
Foi uma experiência emocionante. Redescobri o que tenho de melhor dentro de mim. Além do Gabriel, o Bento, meu sobrinho, filho do Fernando César, tomou parte do projeto, compondo e gravando com o primo. É a continuação do Dois de Ouro e da música na família – o legado do meu pai, do meu tio e do meu avô.
O Gabriel já vinha tocando com você?
Venho tocando com ele desde que passou a se interessar por música. Como também gosta de jogar futebol e tem os estudos, deixo Gabriel bem à vontade em relação ao tempo. Durante a pandemia, o Gabi e o Bento participaram comigo de aulas on-line de improvisação. Cada um no seu canto. Acredito que isso resultou na “Luz de vida”, música que compuseram juntos, a partir de uma harmonia que criei.
Como foi a nova turnê europeia?
Fiz uma série de shows com o pianista flamenco Chano Dominguez, que toca jazz e é apaixonado pela música popular brasileira, assim como sou apaixonado pela música flamenca. Um dos momentos mais aplaudidos do show era quando tocamos o medley com “Santa Morena”, de Jacob do Bandolim, e “Anda jaleo”, música tradicional espanhola. Tocamos também clássicos de Tom Jobim e composições autorais.
Onde vocês se apresentaram?
Começamos a turnê por Paris e depois fomos para a Itália, onde nos apresentamos em Bolonha, Catania, Palermo, Veneza e Ferrara. Em todos os lugares, com grandes plateias. Em Veneza, muita gente ficou de fora, pois o teatro estava superlotado. Depois fomos para a Espanha, onde nos apresentamos em San Sebastian e Pamplona.
Qual será a sua agenda para os próximos meses?
Em abril, volto à Europa para nova turnê, acompanhado por Salomão Soares (piano elétrico) e Big Rabelo (bateria), com a participação da cantora Roberta Sá. O show, com músicas de Tom Jobim, é o mesmo que fiz em Brasília, no segundo semestre de 2021. Há ainda o show de divulgação do álbum “Harmonize”, que farei em Belo Horizonte, São Paulo e possivelmente em Brasília, com a participação da indiana Variashree Venugopal. Em junho, me junto a João Bosco em novas apresentações.
Talentoso desde criancinha
Hamilton de Holanda iniciou a carreira aos 6 anos, formando o Dois de Ouro com o irmão e violonista Fernando César. O duo ganhou esse nome do percussionista Pernambuco do Pandeiro, depois de ouvi-los tocar no Clube do Choro de Brasília.
Em 1982, o Brasil tomou conhecimento do talento precoce da dupla de irmãos numa apresentação no programa “Fantástico”, da TV Globo.
Por iniciativa de Hamilton, o Congresso Nacional aprovou o projeto que instituiu o Dia Nacional do Choro em 23 de abril.
Em 2000, Hamilton reinventou o bandolim tradicional, adicionando a ele um par de cordas graves extras, afinadas em dó. O aumento das cordas, combinado com solos rápidos, contrapontos e improvisações, vem inspirando a nova geração a se dedicar ao instrumento.
Desde meados da década de 2000, o bandolinista tem levado seu som para diversos continentes, apresentando-se com sumidades do jazz e de outros gêneros musicais. Ativo nas redes sociais, Hamilton tem 600 mil ouvintes mensais.