Os atores Robert Pattinson e Zoë Kravitz de perfil, com o sol poente. ele usa a máscara do Batman

Longa tem quase três horas de duração e aborda o romance de Batman com a Mulher-Gato, além de incorporar elementos do policial noir

Warner Bros./Divulgação

Ao longo dos últimos anos, alguns filmes de super-heróis (ou anti-heróis) têm demonstrado ambição para ir além desse escaninho. “Logan” (2017), de James Mangold, e “Coringa” (2019), de Todd Philips, são dois exemplos que lograram sucesso nesse sentido.

O primeiro por contar com muitas camadas, que acabam por tornar o confronto mocinho versus bandido praticamente acessório. E o segundo por ser mais plausível, menos fantasioso, dialogando com a realidade de maneira convincente. 

Isso posto, cabe dizer o que, de início, pareceria apenas o óbvio: o novo “Batman”, que tem pré-estreia em cinemas de Belo Horizonte nesta terça-feira (1º/3) e entra em cartaz nas salas das redes Cineart, Cinemark, Cinépolis e Cinesercla a partir de quinta (3/3), se contenta em ser um filme de herói.

Falta ao longa dirigido por Matt Reeves, que marca a estreia de Robert Pattinson nas vestes do Homem-Morcego, essa ambição de furar a bolha esquemática do modelo maniqueísta dos bons contra os maus. 

Mas sobram outras ambições: “Batman” parece querer abarcar de tudo um pouco. Ao menos três quadrinhos do “Cavaleiro das Trevas” servem de inspiração para o longa: “Batman: Ano um”, “Batman: O longo dia das bruxas” e “Batman: Ego”. Tal amálgama acaba por tornar a história um tanto rocambolesca.



Ao longo de três horas de projeção, a trama passa de um tom contido, que faz clara referência aos policiais noir e aos filmes de detetive, para a pirotecnia feérica tão característica das produções do gênero. Entre a sugestão e o grito, “Batman” perde o prumo. 

REFERÊNCIAS 

A ambientação da primeira parte do filme pode suscitar tanto “Blade Runner” (1982), de Ridley Scott, – Gotham City é focalizada sempre à noite, sob uma chuva ininterrupta –, quanto “O colecionador de ossos” (1999), de Phillip Noyce, ou “Seven – Os sete crimes capitais” (1995), de David Fincher.

Isso porque a trama começa a se desenrolar a partir de uma série de assassinatos de figuras públicas proeminentes e da investigação que Batman, o comissário Gordon e o enxuto “núcleo do bem” da trama empreendem. Para o público, o filme entrega logo de cara que é o Charada quem está por trás dos crimes, e que ele tem um objetivo a cumprir com suas ações – o que é revelado ao longo da história.

Além do Charada, comparecem outros personagens clássicos do universo de Batman, como a Mulher-Gato, vivida por Zöe Kravitz, o Pinguim, em composição impressionante de Collin Farrell, e o mafioso Carmine Falcone, papel que John Turturro conduz com a habitual desenvoltura. 

Além deles, desfila pela tela uma miríade de personagens, praticamente todos eles alocados na ala dos bandidos. O tom soturno do novo “Batman” reflete uma Gotham City decadente, tomada pela criminalidade, pela corrupção e pela desesperança. A trama transcorre dias antes da eleição do novo prefeito da cidade.

Some-se a esse cenário as inquietações que acometem o personagem de Pattinson, que, em seus momentos como Bruce Wayne, parece sempre taciturno, um tanto desiludido, constantemente confrontado com o passado de sua família. É nesse aspecto que parece residir a ambição do diretor. 

O problema é que o “Batman” de Matt Reeves trabalha com elementos demais, tenta abarcar diversos tons, estabelecer pontes em excesso e criar situações que atendam ao gosto dos aficionados pelo universo do herói.

Mas talvez precisamente por isso, pela forma como trabalha com uma pletora de códigos dos filmes do gênero, “Batman” deve fazer bonito nas bilheterias brasileiras e brigar pelo pódio das maiores arrecadações neste primeiro semestre de 2022, por ora ocupado por “Homem-Aranha: Sem volta para casa”. 

O fato de ter três horas de duração é que eventualmente pode comprometer esse percurso, já que terá menos sessões do que um filme de duas horas, por exemplo, pode ter.

ROMANCE


Há os crimes, a investigação, mistério, muita pancadaria e muito tiro, há o pano de fundo político e o comentário social um tanto pueril. Há, tanto por parte do protagonista quanto do antagonista, um ímpeto que é conduzido por desejos de vingança e de justiça que se confundem. E há romance, com a relação entre Batman e a Mulher-Gato.

Diante de tantas pontas para costurar e planos para sobrepor, resta pouco espaço para uma construção mais bem elaborada das personagens. Quando Pattinson foi anunciado como o novo Homem-Morcego, não foram poucos os questionamentos; os fãs do herói não viram nele a figura ideal para tal papel. 

Fato é que o ator, que protagonizou de forma marcante longas como “Cosmópolis” e “O farol”, dispõe de muito mais recursos dramáticos do que Ben Affleck, que estava inicialmente escalado para este “Batman”, mas não chegou a ter um filme para chamar de seu (teve que se contentar em dividir o protagonismo com Henry Cavill em “A origem da Justiça”, de 2016, e com um elenco estrelado em “Liga da justiça”, de 2017).

Os predicados de Pattinson como ator, no entanto, estiveram longe de ser plenamente explorados. Quando está sem a máscara, o personagem sustenta quase sempre uma mesma expressão, que guarda um tanto de recalque, outro de insegurança, e não vai muito além disso.

O olhar vazio que Bruce Wayne carrega se justifica, em parte, porque o Batman que vemos no filme de Reeves é um vigilante ainda incipiente, está apenas há dois anos nas ruas, combatendo o crime numa cidade em que ele transborda por todos os cantos.

De todo o elenco, quem tem a melhor oportunidade de mostrar serviço é Paul Dano, com seu Charada – ainda que em apenas uma ou duas cenas, já que, na maior parte do tempo, ele tem o rosto coberto por um capuz. Os demais atores cumprem de forma um tanto protocolar e chapada a missão de dar vida aos seus personagens.

INCOERÊNCIAS 

Outro problema do novo “Batman”, que também se relaciona com a profusão que toma conta da tela, são algumas incoerências da narrativa. Num dado momento, por exemplo, o Homem-Morcego se vê numa situação em que toda a polícia de Gotham City está em seu encalço. No momento seguinte, sem que tenha havido um desfecho para tal situação, a relação entre o vigilante noturno e os homens da lei parece apaziguada.

Em outra cena, ao lado da Mulher-Gato, ele é alvo de rajadas de metralhadoras, num cerco de muitos mafiosos. Batman aparece caído no chão, enquanto ela tenta se esgueirar e fugir dos criminosos. No instante seguinte, o batmóvel aparece em cena pela primeira vez, com o herói ao volante, como num passe de mágica, para dar início a uma sequência de perseguição pelas ruas da cidade que faz o espectador se perguntar, confuso, se ele não teria sido transportado para alguma das sequências de “Velozes e furiosos”.

A Warner vinha alimentando grandes expectativas quanto ao lançamento do longa de Matt Reeves e um dos motivos para isso é que, pelo menos em sua estreia, os filmes do Batman costumam faturar excelentes números.


SANTA SURPRESA!


Confira algumas curiosidades sobre “Batman”

>> Originalmente, Ben Affleck havia sido contratado para estrelar, dirigir e escrever “Batman”. Ele chegou a concluir o roteiro, mas, por problemas pessoais, acabou desistindo de dirigir e estrelar o projeto. A Warner contratou Matt Reeves, que decidiu apostar em uma nova abordagem.
ator Jonah Hill

ator Jonah Hill

ANGELA WEISS/AFP

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ator Jonah Hill

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ANGELA WEISS/AFP
Jonah Hill
era cotado para o elenco de “Batman” e chegou a entrar em negociações com a Warner. Matt Reeves o queria como o Pinguim, mas o ator estava mais interessado no papel de Charada, além de supostamente ter exigido um cachê considerado muito alto, o que fez com que as negociações fracassassem.

>> As gravações de “Batman” foram muito complicadas por causa da pandemia. O longa teve o azar de começar a ser produzido no mesmo período em que a pandemia começou a se intensificar, o que fez com que as gravações levassem vários e vários meses.

>> “Batman” é o começo de um novo universo na DC. No momento, estão sendo desenvolvidos vários projetos derivados, girando em torno de Gotham, como uma série do Pinguim e outra dos policiais da cidade do Batman.

ator Nicholas Hoult

ator Nicholas Hoult

ALBERTO PIZZOLI/AFP

>> Matt Reeves afirmou que, desde que começou a trabalhar em “Batman”, viu Robert Pattinson como o protagonista ideal. O ator também estava interessado no papel. No entanto, Pattinson não foi aprovado como o novo Batman até fazer um teste com o traje do personagem. Curiosamente, esse teste também contou com Nicholas Hoult, que era visto como uma segunda opção, mas acabou sendo superado por Pattinson.