Depois de inaugurar uma biblioteca própria, com cerca de 6 mil publicações, em dezembro passado, o Centro Cultural Unimed-BH Minas abre na próxima sexta-feira (11/3) as duas salas de cinema que completam seu projeto de expansão.
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Coesão poética e liberdade de criação são a alma do 'Clube da Esquina'"Clube da Esquina": sonho vira realidade nos estúdios da Odeon''Clube da Esquina'' nasceu ao som das ondas na paradisíaca Mar Azul'Tarsilinha' leva quadros da pintora modernista à telonaOrquestra Ouro Preto retoma projeto com estudantesToquinho e Ivan Lins voltam a BH e convidam o público a cantarPara marcar a inauguração das salas, será exibida a mostra “Mais fundo que o mar: O cinema, a música e as esquinas”, uma homenagem aos 50 anos de lançamento do disco “Clube da Esquina”. Os filmes selecionados dialogam com a criação do movimento, que, a partir dos anos 70, projetou Minas Gerais para o mundo. Paralelamente, haverá oficinas, workshops, palestras e sessões comentadas.
O cineasta Samuel Marotta, idealizador e curador da mostra, explica que a proposta é retratar o Clube da Esquina a partir dos filmes que embasaram e atravessaram sua formação. Ele conta que quando leu o livro “Os sonhos não envelhecem: histórias do Clube da Esquina”, de Marcio Borges, sentiu que aquela era uma obra mais sobre memórias cinematográficas do que musicais. “A mostra chega com o objetivo de responder à hipótese de que o Clube da Esquina começou no cinema”, conta.
“Entendi que havia uma espécie de gênese cinematográfica no Clube”, diz, destacando que já conhecia a célebre história das três sessões seguidas de “Jules e Jim”, de François Truffaut, a que os jovens amigos Marcio e Milton assistiram antes de, extasiados, sob o impacto do filme, irem para casa escrever o que viriam a ser algumas das primeiras letras do Clube da Esquina: “Novena”, “Gira girou” e “Crença”.
BLOCOS TEMÁTICOS
“A partir disso, pensando nas relações dos músicos do Clube com o cinema, nessa inspiração que tiveram assistindo aos clássicos e nas trilhas sonoras para filmes que alguns deles assinaram posteriormente, me veio a ideia da mostra”, diz.
Para dar sentido a um conjunto de títulos tão distintos, ele os agrupou em blocos temáticos. São eles: “Milton Nascimento”, “Wagner Tiso nos filmes de Walter Lima Jr.”, “Tavinho Moura nos filmes de Carlos Alberto Prates Correia”, “Carta branca a Marcio Borges” e “Sessões especiais”.
“Eu já conhecia o cinema de Carlos Alberto Prates Correia, para mim um dos maiores cineastas do mundo, e a relação do Tavinho Moura com ele; já sabia das trilhas do Wagner Tiso para o Walter Lima Jr., das trilhas do Milton para diversos diretores, então fui propondo esses blocos temáticos”, explica.
Assim, a sessão intitulada “Milton Nascimento” traz os filmes para os quais Bituca fez a trilha ou em que atuou; em “Carta branca a Marcio Borges” há três clássicos selecionados pelo escritor e letrista; no bloco “Sessões especiais” estão reunidos filmes que trazem músicas do Clube, como “Sagrada Família”, de Silvio Lanna, ou “Perdidos e malditos”, de Geraldo Veloso.
FONTES DE PESQUISA
Marotta conta que, além do livro de Marcio Borges, valeu-se de diversas outras fontes para compor a programação de 21 títulos da mostra. Ele diz que os próprios filmes e outras referências bibliográficas lhe serviram de substrato, bem como as conversas com músicos e cineastas. “Eu contava para todo mundo sobre a realização dessa mostra, então alguém sempre tinha alguma coisa, uma pista para indicar”, aponta.
“Fiquei próximo do Tavinho, do Wagner, do Marcio; eles foram contando histórias permeadas pelo cinema. O Walter Lima Jr. me contou histórias incríveis de quando ele veio a Belo Horizonte pela primeira vez e conheceu Milton e Fernando Brant ainda muito jovens. Ele dizia que também via cinema na música do Milton. E o Marcio foi diretor, ele fez um filme, que se perdeu, foi queimado pelo Dops no acervo do CEC (Centro de Estudos Cinematográficos), se chamava ‘Joãozinho e Maria’. Fui descobrindo isso tudo com a pesquisa”, comenta.
Além das sessões de cinema, a mostra terá curso de trilha sonora ministrado por Wagner Tiso, masterclass do cineasta Walter Lima Jr. e debates com Márcio Borges, Bernardo Oliveira (produtor e crítico musical) e Juçara Marçal (cantora e atriz); Duca Leal (escritora) e Victor de Almeida (produtor cinematográfico e atual presidente do CEC); Gabriel Martins (diretor de cinema) e Maurílio Martins (diretor de cinema); Ewerton Belico (curador e diretor de cinema) e Luís Felipe Flores (ensaísta, curador e pesquisador de cinema).
PROGRAMAÇÃO PARALELA
Marotta considera que essa programação paralela, recheada de nomes consagrados da música e do cinema, é o destaque – ou, como diz, a cereja do bolo – da mostra. “Um curso de trilha sonora com o Wagner Tiso, ao longo de três encontros, aqui em Belo Horizonte, com ele falando sobre seu processo criativo em forma de oficina, acho isso um evento histórico”, afirma. As inscrições, tanto para os debates quanto para as oficinas, podem ser feitas pelo site da Sympla.
Ele também indica como imperdível a masterclass com Walter Lima Jr., que, aos 84 anos, vem à capital mineira especialmente para esse compromisso. O curador chama a atenção, ainda, para os debates previstos, como os que trazem os cineastas Gabriel e Maurílio Martins, da produtora Filmes de Plástico, comentando “Tostão, a fera de ouro”, ou Juçara Marçal – cujo álbum “Delta Estácio Blues” figurou em várias listas de melhores do ano passado – falando da influência do Clube em sua vida e, claro, de cinema. “Ela é uma cinéfila absurda, tem muito o que dizer, então foi uma sacada esse deslocamento dela para o cinema, dividindo a mesa com o Bernardo”, diz.
“Um filme gera determinado debate, então fui compondo a programação pensando no que cada sessão poderia se desdobrar, seguindo uma espécie de fluxo que a própria mostra sugere. Também sou realizador e acho que o processo de construção de uma mostra lembra o processo de construção de um filme: você tem uma ideia, monta um roteiro e, a partir dele, cria uma série de situações para aquele evento”, aponta.
AÇÕES INTEGRADAS
Diretor de Cultura do Minas Tênis Clube, André Rubião diz que, com a abertura das salas de cinema e a conclusão do processo de expansão do Centro Cultural, a ideia é sempre promover ações integradas.
O pontapé inicial já foi dado, precisamente com foco na celebração pelos 50 anos de lançamento do disco “Clube da esquina”: entre 3 e 6 de fevereiro passado, a Galeria de Arte abrigou a exposição “Viagem de ventania – Trilha sonora dos tempos” e, paralelamente, o teatro abrigou a série de shows “Mistura Minas”, com representantes, herdeiros e amigos do Clube.
“Infelizmente, por causa da pandemia, que não nos permitiu cumprir um cronograma, a mostra de cinema não coincidiu com a exposição e com os shows, mas ainda teremos apresentação do Toninho Horta no teatro. A ideia é fazer com que as salas de cinema, por meio de sua programação, estejam sempre dialogando com o que acontece nos outros espaços do Centro Cultural”, aponta Rubião.
Ele diz que, além de cumprir um papel de integração, o objetivo é que as novas salas ocupem um nicho que as grandes redes de cinema não preenchem. Na mesma linha de outros espaços de exibição que compõem equipamentos culturais – como o Cine Humberto Mauro, no Palácio das Artes, o Cine do Sesc Palladium ou o MIS Cine Santa Tereza –, o Centro Cultural Unimed-BH Minas quer dar espaço para mostras e produções independentes.
“Nossa proposta é mesclar; em uma das salas vamos trabalhar mais com mostras, seguindo essa ideia de curadoria. Já temos cinco aprovadas nas leis de incentivo, que vão ocorrer ao longo de 2022 e também em 2023. Na outra sala vamos dedicar espaço para filmes locais ou com recortes específicos, funcionando de forma mais comercial, mas com títulos alternativos, fugindo dos blockbusters”, salienta.
MODELO DE CINECLUBE
Samuel Marotta acredita que as novas salas do Centro Cultural Unimed-BH Minas chegam na esteira de uma tendência, de um modelo mais próximo do cineclube, que está ganhando cada vez mais espaço.
“Faz um tempo que a gente lida com as salas de shopping center, só que agora tem um elemento novo, que é o streaming. Você acha praticamente tudo ali. Acho que as salas com perfis de curadoria tendem a crescer justamente porque há uma gama muito grande de informação, então a mediação, a discussão representam um ganho gigantesco”, avalia.
Ele exalta o surgimento para a cidade – já que o acesso ao Centro Cultural Unimed-BH Minas como um todo é para a população em geral, não apenas para os sócios do Minas Tênis Clube – de duas novas salas de cinema com essa característica e, conforme aponta, com alto padrão de qualidade técnica.
“Quando soube da estrutura dos cinemas, fiquei impressionado, porque é um negócio extraordinário. É o melhor projetor do mercado, tem cadeiras muito confortáveis”, diz, acrescentando que tanto os cinéfilos da cidade quanto os realizadores vão se beneficiar.
“Pensei que é um ótimo espaço de exibição a mais para o cinema feito em Belo Horizonte e em Minas Gerais, que é muito pungente, muito forte. Trata-se de abrir espaço para filmes que não chegariam às salas de cinema de um shopping”, destaca.
André Rubião reforça que tanto público quanto cineastas estarão muito bem servidos com as duas novas salas. “Um diferencial delas é a tecnologia, porque é tudo de última ponta; estamos trabalhando com projeção 4K DCP e sistema de som Dolby 7.1. Em termos de estrutura de exibição, não sei se há outra sala no estado operando com esses sistemas”, diz, acrescentando que os projetos de acústica e climatização foram integrados, garantindo níveis muito baixos de ruído.
“MAIS FUNDO QUE O MAR: O CINEMA, A MÚSICA E AS ESQUINAS”
Mostra de filmes que celebra o cinquentenário de lançamento do álbum “Clube da Esquina”, a partir desta sexta-feira (11/3) até 26/3, nas salas de cinema do Centro Cultural Unimed-BH Minas (Rua da Bahia, 2.244, Lourdes). Ingressos a R$ 2 (inteira) e R$ 1 (meia), à venda na bilheteria e no site do Minas Tênis Clube, onde consta a programação completa da mostra. As atividades paralelas são gratuitas, mediante prévia inscrição no site Sympla