O diretor Pedro Kos, de 44 anos, estava dormindo quando saiu a lista dos indicados ao Oscar. Logo, a caixa postal de seu celular começou a receber uma quantidade considerável de mensagens e ligações.
Quando ele finalmente soube que Onde Eu Moro (Lead Me Home, no original) estava entre os finalistas da categoria de Melhor Documentário em Curta-Metragem, não acreditou: estou sonhando ou já acordei?
Nascido no Rio, Pedro Kos se mudou para Nova Iorque aos 12 anos, com os pais. Cursou o Ensino Médio em Miami e fez faculdade de Teatro na Universidade de Yale, em Connecticut. Estreou no cinema em 2002, como assistente de produção de Frida, a cinebiografia da pintora mexicana.
Em 2009, quando soube que a diretora Lucy Walker estava à procura de um montador que falasse português para trabalhar em Lixo Extraordinário, o diretor de fotografia Affonso Beato não hesitou em indicar o nome de Pedro. Dos filmes que ele montou, dois já disputaram o Oscar: Lixo Extraordinário (2011) e The Square (2014).
Pedro Kos não pretende ir sozinho à 94ª cerimônia de entrega do Oscar, no Teatro Dolby, em Hollywood, no próximo domingo, dia 27. Vai levar dois dos 15 personagens retratados no documentário para desfilar no tapete vermelho. A maioria deles, diga-se de passagem, já arrumou emprego e saiu das ruas.
Onde Eu Moro vai disputar o Oscar de Melhor Documentário em Curta-Metragem com The Queen of Basketball, Three Songs for Benazir, When We Were Bullies e Audible. Desses, três já estão disponíveis no catálogo da Netflix: Three Songs for Benazir, Audible e Onde Eu Moro. Quanto aos outros dois, The Queen of Basketball e When We Were Bullies, ainda não há previsão de estreia.
1. A primeira vez que um brasileiro concorreu ao Oscar foi em 1945
O compositor Ary Barroso (1903-1964) disputou a categoria de Melhor Canção Original com a música Rio de Janeiro, do filme Brazil, de Joseph Santley. No entanto, quem levou a melhor foi Swinging on a Star, composta por James Van Heusen (1913-1990) para O Bom Pastor, estrelado por Bing Crosby.
À época, Walt Disney (1901-1966) chegou a convidar o autor de Aquarela do Brasil (1939) para assumir o cargo de diretor musical em sua produtora, em Hollywood. Rubro-negro fanático, Ary declinou do convite. E, para espanto do criador do Mickey Mouse, justificou a recusa: "Because don't have Flamengo here!".
Em 2012, outra canção original brasileira voltou a concorrer ao Oscar. Composta a seis mãos por Carlinhos Brown, Sérgio Mendes e Siedah Garrett, Real in Rio, da animação Rio, concorreu com Man or Muppet, escrita por Bret McKenzie para o filme The Muppets. E perdeu.
2. O primeiro longa brasileiro a disputar Melhor Filme Internacional foi O Pagador de Promessas
Escrito e dirigido por Anselmo Duarte (1920-2009), O Pagador de Promessas conquistou a Palma de Ouro no Festival de Cannes, um dos mais prestigiados do mundo. Mas, na 35ª cerimônia de entrega do Oscar, não teve tanta sorte. Perdeu para Sempre aos Domingos, do cineasta francês Serge Bourguignon.
Convidado para assistir à cerimônia, Duarte recusou o convite. Não gostou quando soube que a Academia tinha alterado o título de seu filme para The Given Word (A Palavra de Compromisso, em livre tradução). "Ganhei convites, passagens de avião, hotel pago e tudo mais", declarou, em 2004. "Recusei tudo".
Outros três filmes brasileiros já foram indicados: O Quatrilho (1996), de Fábio Barreto (1957-2019); O Que É Isso, Companheiro? (1998), de Bruno Barreto; e Central do Brasil (1999), de Walter Salles.
Atualmente, o candidato do Brasil ao título de Melhor Filme Internacional é selecionado por uma comissão da Academia Brasileira de Cinema (ABC). Já foi escolhido, entre outros, pela Empresa Brasileira de Filmes (Embrafilme) e pela Secretaria do Audiovisual, do Ministério da Cultura. O recordista em indicações é Cacá Diegues: Xica da Silva (1977), Bye Bye Brasil (1980), Um Trem Para as Estrelas (1987), Dias Melhores Virão (1989), Tieta do Agreste (1997), Orfeu (2000) e O Grande Circo Místico (2019).
O Brasil foi o primeiro país da América do Sul a ser indicado ao Oscar de Melhor Filme Internacional. No entanto, nunca levou a estatueta dourada. Até o momento, a Argentina ganhou duas — A História Oficial (1986) e O Segredo dos Seus Olhos (2010) — e o Chile, uma — Uma Mulher Fantástica (2018).
Até 2019, a categoria era chamada de Melhor Filme Estrangeiro.
3. Fernanda Montenegro concorreu a Melhor Atriz
Concorreu com Gwyneth Paltrow, de Shakespeare Apaixonado; Cate Blanchett, de Elizabeth; Meryl Streep, de Um Amor Verdadeiro; e Emily Watson, por Hilary and Jackie. A grande vencedora foi Gwyneth Paltrow.
Fernanda Montenegro foi a primeira atriz latino-americana a concorrer ao Oscar de Melhor Atriz. Depois dela, vieram Salma Hayek, mexicana, por Frida (2002); Catalina Sandino Moreno, colombiana, por Maria Cheia de Graça (2005), e Yalitza Aparício, mexicana, por Roma (2019).
4. Orfeu Negro ganhou Melhor Filme Internacional em 1960
O filme é falado em português, se passa em uma favela do Rio de Janeiro e tem músicas de Tom Jobim (1927-1994) e Luiz Bonfá (1922-2001). Mas, não é um filme brasileiro. Trata-se de Orfeu Negro, adaptado por Marcel Camus (1912-1982) a partir da peça Orfeu da Conceição, de Vinícius de Moraes (1913-1980).
Em 1960, Orfeu Negro ganhou o Prêmio de Melhor Filme Internacional e levou a estatueta para a França. Conquistou, ainda, a Palma de Ouro no Festival de Cannes e o Globo de Ouro de Melhor Filme em língua estrangeira.
Vinícius assistiu à versão de Camus, mas não aprovou o resultado.
5. Nenhum outro filme brasileiro ganhou tantas indicações quanto Cidade de Deus
Foram quatro: Diretor (Fernando Meirelles), Roteiro Adaptado (Bráulio Mantovani), Edição (Daniel Rezende) e Fotografia (Cesár Charlone). Não levou nenhuma.
Meirelles disputou a estatueta de Melhor Diretor com Peter Jackson (O Senhor dos Anéis: O Retorno do Rei); Clint Eastwood (Sobre Meninos e Lobos); Peter Weir (Mestre dos Mares - O Lado Mais Distante do Mundo); e Sofia Coppola (Encontros e Desencontros). Naquele ano, não deu para ninguém. O filme de Peter Jackson conquistou as 11 estatuetas que disputou. Inclusive a de Melhor Diretor.
Em 2020, Dois Papas concorreu em três categorias: Melhor Ator (Jonathan Pryce), Melhor Ator Coadjuvante (Anthony Hopkins) e Melhor Roteiro Adaptado (Anthony McCarten). Meirelles não foi indicado a Melhor Diretor.
6. Dois brasileiros já subiram ao palco durante uma cerimônia do Oscar
Anunciada por Goldie Hawn como "uma das mais glamourosas do mundo", a atriz paranaense apresentou, ao lado do ator Michael Douglas, os indicados ao prêmio de Melhor Curta-Metragem.
Durante o anúncio, Douglas perguntou a Braga se, no Brasil, as pessoas gostam de assistir ao Oscar. A estrela de O Beijo da Mulher Aranha (1985) respondeu que sim e aproveitou para mandar um recado, em português, aos fãs brasileiros: "Estou com saudades".
Já o cantor baiano foi apresentado pelo ator mexicano Gael García Bernal como "o brasileiro mais incrível" que já conheceu. Caetano dividiu o palco do Teatro Dolby, em Los Angeles, com a cantora mexicana Lila Downs. Juntos, cantaram Burn it Blue, composta por Elliot Goldenthal e Julie Taymor, para Frida (2002). Indicada ao Oscar de Melhor Canção, perdeu para Lose Yourself, cantada por Eminem, para Rua das Ilusões.
Por falar em O Beijo da Mulher Aranha, o filme, dirigido por Hector Babenco, um argentino naturalizado brasileiro, é uma coprodução Brasil e Estados Unidos. Indicado em quatro categorias, o longa premiou William Hurt (1950-2022) com o Oscar de Melhor Ator. Sônia Braga concorreu ao Globo de Ouro de Melhor Atriz Coadjuvante, mas não foi indicada ao Oscar pela Academia.
7. Estatueta 'um pouco brasileira'
Uma das três estatuetas que o filme inglês Retorno a Howard's End ganhou em 1993 — Atriz Principal (Emma Thompson), Roteiro Adaptado (Ruth Prawer Jhabvala) e Direção de Arte (Luciana Arrighi) — é um pouco brasileira.
Filha de pai italiano e mãe australiana, Luciana Arrighi nasceu no Rio de Janeiro, em 1940. No entanto, saiu do Brasil com apenas dois anos de idade e passou boa parte da infância na Austrália.
Em seu currículo, estão filmes como Vestígios do Dia (1993), Razão e Sensibilidade (1995) e Anna e o Rei (1999).
Em 2012, o nome da categoria mudou: de Direção de Arte para Design de Produção.
8. Categoria Melhor Documentário com mais indicados
São cinco, quatro coproduções: Raoni (1979), El Salvador: Another Vietnam (1981), Lixo Extraordinário (2011), O Sal da Terra (2015) e Democracia em Vertigem (2020).
Raoni é uma parceria entre Brasil, França e Bélgica. Foi escrito e dirigido pelo belga Jean-Pierre Dutilleux em parceria com o brasileiro Luiz Carlos Saldanha. Em inglês, o documentário sobre o líder indígena é narrado por Marlon Brando (1924-2004) e, em português, por Paulo César Pereio.
Já El Salvador: Another Vietnam (1981) é co-dirigido por uma brasileira, Tetê Vasconcellos, a primeira a concorrer ao Oscar, e um norte-americano, Glenn Silber.
Outra coprodução é o anglo-brasileira Lixo Extraordinário (2011), sobre o trabalho do artista plástico Vik Muniz. Dois dos três diretores são brasileiros: João Jardim e Karen Harley.
O Sal da Terra (2015) é um documentário ítalo-franco-brasileiro sobre o fotógrafo Sebastião Salgado. A direção é assinada pelo alemão Wim Wenders e pelo brasileiro Juliano Salgado, filho de Sebastião. Não levou o Oscar, mas, em compensação, ganhou o César, o prêmio mais importante do cinema francês.
Dos cinco docs indicados ao Oscar, o único que não é uma coprodução é Democracia em Vertigem (2020). Dirigido por Petra Costa, retrata os bastidores do impeachment da presidente Dilma Rousseff, o julgamento de Luiz Inácio Lula da Silva, a eleição do candidato Jair Bolsonaro e a crise política do Brasil.
9. O único brasileiro com duas indicações
Famoso pelas franquias A Era do Gelo e Rio, o cineasta Carlos Saldanha é o único brasileiro com duas indicações: Melhor Animação em Curta-Metragem por Aventura Perdida de Scrat (2004) e Melhor Filme de Animação por Touro Ferdinando (2018).
Nascido e criado no Rio de Janeiro, Saldanha mora, desde 1991, em Nova Iorque.
10. Brasileiros ajudam a selecionar os melhores
Sim, há artistas, produtores e executivos do Brasil entre os mais de 10 mil membros da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas, em Los Angeles. Para fazer parte dela, precisa ser indicado por dois jurados.
Em 2021, a lista de jurados aumentou. Foram convidados mais 395 nomes, de 49 países. Entre eles, alguns brasileiros como o ator Wagner Moura, os produtores Fabiano Gullane, Paula Barreto e Andrea Barata Ribeiro, os documentaristas João Atala e Karen Akerman, a maquiadora Anna Van Steen e a roteirista Carolina Markowicz.
No passado, outros brasileiros já foram convidados a votar no Oscar: a atriz Alice Braga, o ator Rodrigo Santoro, o produtor Rodrigo Teixeira, o diretor Kleber Mendonça Filho, o compositor Carlinhos Brown, a documentarista Petra Costa…
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