“A questão é cada vez mais atual, acho até que mais do que há 10 anos. Hoje, há muita visibilidade das pessoas, mas o preconceito é maior”, afirma Ney Matogrosso. Em 2014, ele foi um dos convidados do documentário “De gravata e unha vermelha”, de Miriam Chnaiderman, que chega agora ao streaming, na plataforma Reserva Imovision.
O longa, por meio de depoimentos de gente como Laerte, Rogéria e Johnny Luxo, trata da construção individual do próprio corpo e de como cada um encara sua sexualidade. Há muitas pessoas trans entre os entrevistados, e outro tanto de adeptos do crossdressing.
O estilista Dudu Bertholini é figura central no documentário, atuando tanto como entrevistado quanto como entrevistador. Com bom ritmo e boas histórias (alegres e tristes, mas sempre em tom verdadeiro), o filme se desenrola com agilidade, sem meias palavras.
Ney, em sua longa carreira, nunca abraçou bandeiras – não por isso, tornou-se referência máxima para a liberdade de expressão no país.
Johnny Luxo, hoje DJ, mas há pelo menos duas décadas personalidade marcante do mundo da moda, comenta, a certo momento, da importância da imagem de Ney quando ele era criança – na entrevista, ri ao saber que dois dias mais tarde o próprio cantor seria entrevistado para o documentário.
“Achei importante falar sobre o assunto, mesmo que ali eu seja um dos únicos (entrevistados) que não é trans ou se veste de mulher. A questão é que a minha imagem, principalmente na época do Secos e Molhados, atravessa gerações”, afirma o cantor.
BLOCO NA RUA
Aos 80 anos, Ney não tem só a imagem atravessando gerações. Sua música de hoje dialoga diretamente com os jovens. Ele chega a Belo Horizonte na próxima semana como uma das principais atrações do Breve Festival, em 9 de abril, no Mineirão.
Vai apresentar o show “Bloco na rua”, da turnê interrompida em 2020 por causa da pandemia e retomada no final de 2021. Não é um repertório exclusivo de sucessos da carreira. Ney coloca lado a lado “Eu quero é botar meu bloco na rua”, de Sérgio Sampaio, que virou o tema da série de shows, com “A maçã”, de Raul Seixas, “Álcool (Bolero filosófico)”, do DJ Dolores, e “O beco”, dos Paralamas.
“Este show também está cada vez mais atual, pois o Brasil piorou muito (desde o início da pandemia)”, afirma ele, que até agora só fez apresentações em teatros e espaços fechados.
“É muito interessante ver a reação das pessoas. É acelerada, não sei se pelo fato de todos terem ficado sem ir a show, mas venho sentindo uma coisa a mais na energia. Vejo muita gente jovem nos teatros, e será um teste interessante”, continua ele, referindo-se ao festival no Mineirão, o primeiro dele para milhares de pessoas.
É a “cabeça que conduz todo o espetáculo”, diz, sobre a vitalidade em cena aos 80. “Mas, olha, continuo fazendo a ginástica que sempre fiz. E comendo pouco, o que ajuda também.” Os planos para 2022 incluem turnê de cinco shows no verão americano, país em que não se apresenta há três décadas. A temporada terá, em 17 de julho, apresentação no Central Park.
DUDA E MARINA
A turnê não o impede de trabalhar com outros artistas. Ney vem participando dos shows de Duda Brack e, hoje, lança com Marina de la Riva o single “Cachito”, que estará no novo álbum da intérprete de ascendência cubana.“Ela me telefonou falando que queria gravar um disco inteiro em espanhol. Botei pilha e depois da nossa conversa fiquei me lembrando de ‘Cachito’ (de Consuelo Velázquez Torres), gravada pelo Nat King Cole. Era maravilhoso, foi sucesso no mundo inteiro e tinha guardado aquilo na memória. Aí, topei e gravamos a música”, finaliza Ney.
“DE GRAVATA E UNHA VERMELHA”
• O documentário de Miriam Chnaiderman está disponível na plataforma Reserva Imovision (reservaimovision.com.br)