Roma, 2010. Durante a noite, uma mulher grávida desce de um prédio de classe média alta e vai para a rua, deserta naquele momento, procurar um táxi. Um carro aponta na esquina, ela faz sinal, mas ele passa direto, em alta velocidade, atropelando outra mulher. O motorista só para depois de enfiar o automóvel, também com violência, dentro do mesmo prédio.
“Tre piani”, novo filme do cineasta italiano Nanni Moretti (“O quarto do filho”, “Habemus Papam”), parte desta noite para acompanhar a vida de quatro famílias que ocupam os três andares (daí o título) do condomínio romano. A narrativa vai se desenrolar em três momentos temporais, até chegar a 2020. Adaptação do romance homônimo (inédito no Brasil), do escritor israelense Eshkol Nevo, o filme está em cartaz exclusivamente no cinema do Centro Cultural Unimed-BH Minas.
A grávida da história é Monica (Alba Rohrwacher), uma jovem que vive sozinha porque o marido está sempre trabalhando. O nascimento de sua primeira filha em nada muda sua situação – as visões de um pássaro preto fazem com que ela tema por sua lucidez, seguindo o caminho da própria mãe.
O retorno do marido, Giorgio (Adriano Giannini) em nada a acalma – ele está menos preocupado com o bebê do que em devolver o presente que Monica ganhou do irmão dele, com quem cortou relações.
REVOLTA
A segunda família são os Bardi: o casal de juízes Vittorio (Moretti) e Dora (Margherita Buy) e o filho Andrea (Alessandro Sperduti). Foi o jovem que, bêbado, atropelou e matou uma mulher na porta de casa. Aguardando o julgamento em prisão domiciliar, ele se revolta com os pais, principalmente com Vittorio, que diz que nada irá fazer para ajudá-lo. A situação chega a tal ponto que o juiz pede que a mulher escolha entre ele e o filho.
A terceira família tem relação direta com a quarta. Lucio (Riccardo Scamarcio) e Sara (Elena Lietti) são um casal jovem que sempre que pode deixa a filha de 7 anos com os vizinhos, os idosos Giovanna (Anna Bonauito) e Renato (Paulo Graziosi). A menina é muito próxima de Renato, que se vê quase como seu avô.
O drama se instala quando os dois, após uma saída, se perdem – o homem mais velho está começando a sofrer de demência. Quando Lucio encontra a filha chorando à noite em um parque ao lado de Renato, que está completamente desnorteado, o pai acaba por se convencer de que a menina foi abusada. Ironicamente, a chegada de uma nova personagem à história vai colocar Lucio no lugar de algoz.
A partir de um cenário de dor e perda, a história vai acompanhando tais personagens. À exceção do casal jovem que tem uma relação cordial com o casal idoso, as demais famílias que habitam o condomínio pouco se relacionam. A mudança temporal, ainda que traga novos personagens, pouco influi no ritmo da história.
Não há uma grande sensação de passagem do tempo – a narrativa pula para 2015, até ser concluída em 2020. A variedade de personagens e tramas não deixa espaço para que Moretti invista realmente nos personagens. Pequeno drama de pessoas comuns, “Tre piani” talvez consiga seu momento de maior impacto na sequência final, que deixa um pouco de lado o tom realista (e um tanto melancólico) que dominou toda a história.
"TRE PIANI"
(Itália/França, 2021, 119 min.). Direção: Nanni Moretti. Com Riccardo Scamarcio, Margherita Buy e Alba Rohrwacher. Classificação: 14 anos. Em cartaz no Centro Cultural Unimed-BH Minas (Rua da Bahia, 2.244, Lourdes), às 15h e às 20h10. Ingressos a R$ 20 (inteira).