Coautora e codiretora, ao lado de Stephane Brodt, da peça “Bordados”, que estreia nesta quinta-feira (28/4) à noite, no CCBB-BH, Ana Teixeira diz que o espetáculo convida a refletir sobre a importância do encontro, da presença, do diálogo olho no olho e do afeto. Parece até resposta ao isolamento social imposto pela COVID-19. Mas não: a montagem estreou no início de 2020, antes da pandemia, no Rio de Janeiro.
''Uma coisa que me chamou muito a atenção foi a presença dos homens, frequência que só foi aumentando. Foi muito bonita essa presença e, na reta final da temporada, eles já eram maioria na plateia''
Ana Teixeira, diretora de teatro
ENCONTRO
“Bordados” mostra o encontro de seis mulheres árabes ao longo de uma sessão de chá. Em torno da bebida, elas desenrolam fios das respectivas histórias, tecendo conversas íntimas sobre casamento e família, revelando sonhos, perdas e conquistas.
Em cartaz até 30 de maio em BH, a peça se inspira no romance gráfico homônimo de Marjane Satrapi e busca referências no documentário “7 bilhões de outros”, do francês Yann Arthus-Bertrand. O texto é a costura de relatos reais recolhidos entre centenas de entrevistas reunidas pelo diretor ao redor do mundo.
Ana Teixeira explica que Arthus-Bertrand lança perguntas simples sobre o sentido da vida ou do amor com o propósito de chegar a uma questão essencial: o que nos torna humanos?
“A peça coloca também esta pergunta. A gente foi juntando relatos de mulheres e de homens que estão no documentário, desenhando as personagens e pensando em como colocar isso no formato de diálogo”, explica diretora. Em 1998, ela e Stephane Brodt fundaram a companhia Amok Teatro, que responde pela encenação.
CONVITE
As mulheres da plateia são convidadas a assistir à peça sentadas em cadeiras ao redor de mesas posicionadas na frente do palco. “Na cultura árabe, o chá é símbolo da hospitalidade. Levar as mulheres para perto da cena é uma forma de as atrizes acolherem o público feminino durante a montagem”, explica Ana Teixeira, chamando a atenção para a trilha sonora “muito delicada”.
“Assinalamos que as personagens falam de si. Elas vão revelando as angústias de viver e amar numa sociedade imersa na tensão entre a tradição e a modernidade, característica de todo o Oriente. É impressionante como as espectadoras daqui se veem nas mulheres árabes”, conta. “A gente tem uma imagem bastante deformada do mundo árabe, com a demonização dessa cultura, mas ao longo do espetáculo isso se desfaz.”
''As personagens falam de si. Elas vão revelando as angústias de viver e amar numa sociedade imersa na tensão entre a tradição e a modernidade, característica de todo o Oriente. É impressionante como as espectadoras daqui se veem nas mulheres árabes''
Ana Teixeira, diretora de teatro
EMPATIA
Antes de chegar a Belo Horizonte, “Bordados” cumpriu temporada de dois meses no Rio de Janeiro, a partir da retomada das atividades presenciais. Ana diz que a experiência não poderia ter sido melhor.
“As mulheres da plateia, apesar de em nenhum momento serem solicitadas a fazer algo, também constroem o espetáculo, porque se espelham no que está em cena. Algumas vivenciaram coisas parecidas com o que é dito e mostrado. É muito bonito ver as atrizes se emocionando no palco e sendo amparadas pelas espectadoras”, destaca.
Essa interação, aliás, não é só feminina. “Uma coisa que me chamou muito a atenção foi a presença dos homens, frequência que só foi aumentando. Foi muito bonita essa presença e, na reta final da temporada, eles já eram maioria na plateia. De repente, estavam ali se emocionando com questões femininas, tratadas entre mulheres”, revela a diretora.
“Bordados” integra a segunda etapa do Ciclo das Mulheres, projeto do Amok que aborda temas universais a partir do ponto de vista feminino, explorando também o teatro como espaço de produção de saúde na esfera relacional.
O ciclo teve início em 2018 e seu primeiro produto, o espetáculo “Jogo de damas”, inspirado em Beckett e no universo do compositor estoniano Avo Pärt, tratava da velhice e da finitude da vida.
“O Amok trabalha sobre projetos, debruçando-se sobre um tema e uma pesquisa cênica. Com o ciclo, a gente pretende afirmar o teatro como espaço de alteridade, da experiência do outro, com as mulheres conduzindo isso. A gente convida o público à escuta, fazendo as coisas de modo empático. O Amok sempre tratou de grandes temas, com a guerra sempre muito presente. Porém, com o ciclo a gente entra, se recolhe e vai para os assuntos mais íntimos”, ressalta Ana Teixeira.
A sessão de 12 de maio terá tradução em Libras e as apresentações de 14 e 23 de maio serão seguidas de bate-papo com o público.
“BORDADOS”
Peça do grupo Amok Teatro. Estreia nesta quinta-feira (28/4), às 19h, no Teatro II do Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB). Praça da Liberdade, 450, Funcionários. Em cartaz até 30 de maio, com sessões de quinta a segunda-feira, às 19h. Ingressos custam R$ 30 (inteira) e R$ 15 (meia-entrada), à venda na bilheteria do CCBB, no site www.bb.com.br/cultura e na plataforma Eventim. Informações: (31) 3431-9400