Lançado no Festival de Cannes de 1964, quando concorreu à Palma de Ouro, “Deus e o diabo na terra do sol”, segundo longa de Glauber Rocha (1939-1981) e considerado o mais importante de seus filmes, ganha segundo lançamento no evento francês.
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Festival de Cannes vai exibir, em maio, filmes de diretores ucranianosAtor Vincent Lindon, de 'Titane', vai presidir o júri do Festival de CannesBrasil está fora da principal competição do Festival de CannesFestival de Cannes chega ao fim, eclético e sem favoritosFilmes exibidos em Cannes discutem islã, racismo e perseguição a imigrantesOs 21 filmes na disputa pela Palma de Ouro no 75º Festival de CannesA cópia restaurada ficou pronta em fevereiro, depois de um longo processo iniciado em 2019. A iniciativa partiu do realizador brasiliense Lino Meireles, que se uniu a Paloma Rocha, filha de Glauber. “Quando fazia o documentário ‘Candango: Memórias do festival’ (2020), sobre o cinema brasileiro, procurei filmes da cinematografia nacional que não estavam disponíveis. Me deu vontade de trabalhar com restauração.”
Como Paloma também mora em Brasília, os dois se uniram para o projeto. O processo foi iniciado três anos atrás e interrompido em decorrência da pandemia. A recuperação foi feita a partir dos negativos, sob a guarda da Cinemateca Brasileira, em São Paulo.
QUADRO A QUADRO
Realizada pela Cinecolor, a restauração começou com o escaneamento dos negativos, quadro a quadro. “Foi criada uma matriz digital e depois foi feita a restauração do som (a cargo do Estúdio JLS)”, conta Meireles.
Os originais, ele diz, estavam em perfeitas condições. “Qualquer projeto de recuperação (fílmica) no Brasil só é possível por causa das cinematecas. Quando começamos, estávamos com a perspectiva desta ‘anticultura’”, acrescenta, referindo-se ao processo de sucateamento que a área cultural vem sofrendo em âmbito federal nos últimos anos.
A Cinemateca Brasileira, que desde março está com nova diretora, reabre em 13 de maio para o público, com mostra dedicada à obra de José Mojica Marins. A instituição, que em governos anteriores já vinha sendo relegada a segundo plano, ficou fechada nos últimos anos – o descaso do atual governo federal acabou levando ao inevitável. Em julho de 2021, um novo incêndio tomou conta do prédio – parte da obra de Glauber foi perdida.
Para Paloma Rocha, a seleção para o Cannes Classics é não só “o reconhecimento ao filme, mas é, sobretudo, uma maneira de recolocar o Glauber no local onde ele pertence, o certame dos grandes diretores do mundo.”
Para ela, exibir “Deus e o diabo” restaurado é uma forma de relançar as ideias do pai. “Tem uma frase que ele sempre dizia: ‘O novo é o eterno’”.
OUTRAS TELAS
Filmado em 1963, “Deus e o diabo” acompanha Manoel (Geraldo Del Rey), pobre e explorado, que depois de assassinar seu patrão passa a peregrinar pelo sertão com sua mulher, Rosa (Yoná Magalhães), em busca do mar prometido pelo beato Sebastião (Lidio Silva).
Após a morte de Sebastião, assassinado por Rosa, o casal volta a peregrinar até encontrar um novo líder, o cangaceiro Corisco (Othon Bastos). Nessa jornada, ele tem em seu encalço o mercenário Antônio das Mortes (Maurício do Valle).
A partir do relançamento em Cannes, Meireles espera que o longa ganhe novamente outras telas. “Estamos com os direitos para negociá-lo e espero que haja muito interesse, pois continua sendo o filme brasileiro mais reconhecido do mundo. A matriz que temos agora cabe tanto para os cinemas atuais quanto para o streaming.”