O Coral das Lavadeiras de Almenara apresenta o recital “Cantando a vida”, nesta sexta-feira (13/5), em Belo Horizonte, no teatro do Centro Cultural Unimed-BH Minas. Com 31 anos de existência, o grupo celebra seu retorno aos palcos após o hiato provocado pela pandemia, com turnê que inclui as cidades de Piedade do Paraopeba (distrito de Brumadinho) e Teófilo Otoni, além da capital mineira e de Almenara.
Fundado por iniciativa do cantor e pesquisador cultural Carlos Farias, o grupo tem por objetivo divulgar e gravar canções tradicionais da região Norte mineira e revelar as misturas e influências étnicas – africanas, indígenas e galaico-portuguesas – que compõem a música popular brasileira.
Coordenador do coral, Carlos Farias aponta a região do Vale do Jequitinhonha como um caldeirão borbulhante de cultura, onde diversos grupos produzem música e arte.
“Fui para Almenara em meados dos anos 80, como psicólogo de um projeto social. Em setembro de 1990, o prefeito da época construiu uma lavanderia comunitária, e eu fui convidado para a inauguração”, conta. “Foi uma festa! Eram umas 50 mulheres cantando, com o que o prefeito me fez o desafio de preparar um coral para cantar no aniversário da cidade, em janeiro do ano seguinte”, relembra.
“Fui para Almenara em meados dos anos 80, como psicólogo de um projeto social. Em setembro de 1990, o prefeito da época construiu uma lavanderia comunitária, e eu fui convidado para a inauguração”, conta. “Foi uma festa! Eram umas 50 mulheres cantando, com o que o prefeito me fez o desafio de preparar um coral para cantar no aniversário da cidade, em janeiro do ano seguinte”, relembra.
"Eu gosto muito de lavar roupa, que é um trabalho que minha mãe me ensinou e eu canso de falar, eu gosto demais da lavada de roupa. Mas vai chegando nosso tempo e a gente precisa ir cuidando da saúde. As oportunidades da gente vai já pro lado mais da música. Também é um trabalho que eu adoro muito. Fui pra lá lavar roupa e eu não pensava assim que a gente podia ter essas oportunidade que a gente temos hoje"
Dona Teresa Fernandes de Sousa Novais, integrante do Coral das Lavadeiras
VOZES
O grupo se firmou em 10 mulheres lavadeiras-cantoras e se manteve praticamente o mesmo ao longo das décadas. Quatro integrantes que faleceram – Juracy Lima da Silva, Adélia Barbosa da Silva, ambas no coral desde a fundação, e Sebastiana Dias Silva e Valdenice Ferreira Santos – acabaram sendo substituídas por filhas e netas, mantendo o número original de vozes em 10.Com o passar dos anos, o grupo foi se popularizando na região e conseguindo angariar recursos para gravar os CDs “Batukim brasileiro – O canto das lavadeiras” (2002), “AQUA – a música das lavadeiras do Jequitinhonha” (2005), “Devoção” (2014), “Riozinho” (2019), bem como a coletânea “Palma do rio”, em 2017.
“‘Riozinho’ é no sentido carinhoso. O Amazonas – maior rio do mundo – para nós é um riozinho; o Rio Arrudas, em Belo Horizonte, é um riozinho; e qualquer veio d’água merece ser tratado com carinho”, explica Carlos sobre o cuidado com a biodiversidade que o coral prega.
Além da gravação dos discos e das dezenas de espetáculos que realizam no Brasil, as lavadeiras-cantoras também fizeram apresentações fora do país, no Festival de Arte e Criatividade da Ilha da Madeira 2002, em Portugal, e na Expô Zaragoza 2008, na Espanha, e receberam prêmios como a Medalha da Ordem do Mérito Cultural 2010 e o Prêmio Culturas Populares 2012, ambos concedidos pelo Ministério da Cultura.
Dona Teresa Fernandes de Sousa Novais, uma das integrantes do coral, comenta sobre a experiência de se apresentar fora do país: “A gente pede a Deus que, um dia, quem sabe, a gente não volta de novo (a viajar)”, diz. “Esse trabalho para mim é um sonho que a gente realizou. Quando a gente era pequenininha e estava no rio lavando roupa mais a mãe da gente, aí o avião subia assim e a gente falava ‘ê, vião, me leva que eu tô limpa’.”
Em 2019, o grupo fez suas últimas apresentações antes da paralisação forçada pela pandemia. O terceiro ano do projeto Roda de Conversa e Cantoria com as Lavadeiras, realizado com recursos do Fundo Estadual de Cultura, levou o coral a escolas de sete municípios diferentes, onde as cantoras compartilharam histórias pessoais de luta e superação.
“‘Cantando a vida’ é exatamente para celebrar a sobrevivência pós-pandemia. Depois de dois anos de silêncio, sem poder cantar presencialmente, somos sobreviventes graças às vacinas, que se mostraram muito eficazes. Somos a favor da vacinação e da vida, mesmo vivendo em uma sociedade que cultua a morte e a violência – não só no Brasil, mas no mundo”, defende Carlos.
Além de Dona Teresa, integram o coral as lavadeiras-cantoras Ana Isabel da Conceição, Emília Maria de Jesus, Alice Veríssimo, Isabel Veríssimo, Mariana Gonçalves, Mayra de Oliveira, Mirian Fernandes Pessoa, Santa de Lourdes Pereira e Simone Veríssimo. Dona Emília e dona Santa de Lourdes não viajarão com o grupo porque têm mais de 80 anos e ficaram em sua cidade para evitar o desgaste da viagem de mais de 700 quilômetros e cuidar de sua saúde, segundo informa o coordenador.
"Eu era uma menina muito tímida quando mais nova. Quando comecei a participar de apresentações na minha cidade e fazer aulas de música, comecei a me desenvolver. Aprendi muito com as mulheres do coral e com sua experiência. Elas sempre me deram muita força e me apoiaram a continuar cantando"
Mariana Gonçalves, integrante do Coral das Lavadeiras
AVÓS
Mariana Gonçalves, neta de dona Ana Isabel, tem 25 anos e é uma das mais novas integrantes do coral. Ela estreou aos 15 anos, na gravação de “Devoção”. “Eu era uma menina muito tímida quando mais nova. Quando comecei a participar de apresentações na minha cidade e fazer aulas de música, comecei a me desenvolver. Aprendi muito com as mulheres do coral e com sua experiência. Elas sempre me deram muita força e me apoiaram a continuar cantando”, diz Mariana. A menina se diz orgulhosa e honrada de ser parte do coral junto com sua família.Dona Teresa Fernandes, uma das avós de coração de Mariana, tem 66 anos e está no coral desde que foi fundado, em 1991. Natural de Almenara, a lavadeira conta sobre sua vida e seu amor por seu ofício, ensinado por sua mãe. Sua relação com a música se deve ao coral, já que, como diz, “quando era pequena, só tinha tempo para trabalhar e rezar”.
“Eu gosto muito de lavar roupa, que é um trabalho que minha mãe me ensinou e eu canso de falar, eu gosto demais da lavada de roupa”, conta dona Teresa. “Mas vai chegando nosso tempo e a gente precisa ir cuidando da saúde. As oportunidades da gente vai já pro lado mais da música. Também é um trabalho que eu adoro muito. Fui pra lá lavar roupa e eu não pensava assim que a gente podia ter essas oportunidades que a gente temos hoje.”
Ambas citam “O canto das lavadeiras” como sua canção favorita do coral. “Não sei se é porque as lavadeiras cantam com tanto amor e vivência, mas quando eu canto essa música fico toda arrepiada e me lembro de todas as outras ‘vózinhas’ que já estiveram conosco e que, para mim, são todas minhas avós”, comenta Mariana.
E dona Teresa entoa, com força e emoção na voz: “Mas cadê meu lenço branco... ô lavadeira/Que eu lhe dei para lavar... ô lavadeira/Madrugada madrugou... ô lavadeira/E o sereno serenou... ô lavadeira/Não tenho culpa do que se passou/Deu uma chuva muito forte/E o lenço carregou”.
"Cantando a vida (o nome do espetáculo) é exatamente para celebrar a sobrevivência pós-pandemia. Depois de dois anos de silêncio, sem poder cantar presencialmente, somos sobreviventes graças às vacinas, que se mostraram muito eficazes. Somos a favor da vacinação e da vida, mesmo vivendo em uma sociedade que cultua a morte e a violência, não só no Brasil, mas no mundo"
Carlos Farias, coordenador do Coral das Lavadeiras
“CANTANDO A VIDA”
Recital com Carlos Farias e Coral das Lavadeiras. Nesta sexta-feira (13/5), às 21h, no teatro do Centro Cultural Unimed BH Minas (Rua da Bahia, 2.244, Lourdes). Ingressos a R$ 30 e R$ 15 (meia), à venda na bilheteria do teatro e no site CARLOS FARIAS E CORAL DAS LAVADEIRAS - Ingressos - EVENTIM. Classificação: livre
* Estagiário sob supervisão da editora Silvana Arantes