Hoje no streaming, amanhã no palco. A cantora Mônica Salmaso chega em dose dupla para o público de Belo Horizonte. A partir de sexta-feira (27/5), está disponível, nas principais plataformas, o disco “Canto sedutor”, que ela gravou juntamente com Dori Caymmi – feito que considera a realização de um sonho. E neste sábado (28/5), Mônica se apresenta ao lado de André Mehmari, no Grande Teatro Cemig do Palácio das Artes, com o show dedicado à obra de Milton Nascimento.
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André Abujamra canta o amor nestes tempos de hatersLetieres Leite, que morreu de COVID, deixou herança preciosa para o BrasilFred Izak faz show nesta sexta (27/5), com canções autorais e hits da MPBAlceu Valença traz seu forró para a Festinha Junina, em BH'É importante estar atento e forte', diz Seu Jorge, que canta hoje em BHAdeus a Ray Liotta, astro do cinema e da TVGrande admiradora da obra do cantor, compositor, instrumentista e arranjador, ela conta que, depois de um primeiro encontro virtual para o projeto, que agradou muito a ambos, eles acabaram repetindo a dose outras três vezes.
“Ouvir nossas vozes juntas me deixou muito emocionada, e ver que Dori tinha gostado da experiência me deu coragem de perguntar se ele topava fazer um disco comigo. Tenho adoração por Dori há muitos anos, é questão de idolatria mesmo”, diz.
Ela conta que, ainda durante a pandemia, começaram a trocar ideias a respeito e, em outubro do ano passado, entraram juntos em estúdio, acompanhados por um grupo de instrumentistas arregimentado pelo saxofonista e flautista Teco Cardoso, marido de Mônica, que responde pela produção do disco.
A cantora aponta que são muitas as singularidades da obra de Dori que justificam sua reverência a ele. “Tem a beleza da voz, o bom gosto e o conhecimento que ele tem da música. Dori é um trabalhador da música, uma pessoa a quem interessa o capricho, fazer música da melhor maneira possível. Isso é fruto da dedicação de uma vida toda, de um mergulho”, afirma.
REPERTÓRIO
Mônica também destaca a personalidade musical e a sintonia da voz e do violão do seu parceiro em “Canto sedutor” – uma combinação que a deixa sempre emocionada. Ressaltando que Dori soube, com muito estudo e muito trabalho, levar adiante o legado do pai, Dorival, a cantora chama a atenção, ainda, para a generosidade dele para com seus pares. Tanto é assim que foi o próprio Dori quem, já de saída, delegou à cantora a função de escolher o repertório que seria gravado.
Ela diz que um primeiro recorte foi se ater às músicas feitas em parceria com Paulo César Pinheiro, com quem Dori compõe desde o final dos anos 1960. Ainda assim, Mônica admite que sofreu muito para chegar às canções que seriam gravadas.
“É daqueles casos em que o difícil não é escolher, é cortar”, diz, acrescentando que, durante o processo, Dori acabou por lhe enviar algumas músicas inéditas e que três delas – “Raça morena”, “A água do rio doce” e a faixa-título – foram incluídas no repertório.
Com relação às demais, ela aponta que o critério de escolha foi pensar naquelas que se adequavam melhor às suas vozes. “Eu queria muito a voz do Dori no disco, queria cantar com ele, então comecei a considerar, dentro do que eu tinha selecionado, aquelas canções cujos tons ficassem bons para nós dois, para que pudéssemos cantar juntos”, aponta.
Entram nesse rol clássicos como “Velho piano”, “Desenredo”, “Estrela de terra” e “História antiga”, canção nascedouro do projeto, executada no primeiro encontro da dupla para o “Ô de casas”, e também composições de uma safra mais recente, como “Vereda”, “Voz de mágoa”, “Delicadeza” e “Quebra-mar”, entre outras.
AMOR PELO BRASIL
Mônica diz que o conjunto da obra expressa o amor de Dori pelo Brasil e que essa é a principal marca de “Canto sedutor”. Ela observa que o parceiro no álbum enxerga o país pelo viés da cultura, que, conforme destaca, é muito rica e muito potente, um exemplo do que o país poderia vir a ser. “Acho que isso é o que está mais presente nesse disco, seguido pelo fato de que a gente está celebrando um encontro”, aponta.
A cantora acredita que falar do Brasil e de sua cultura neste momento tem um significado especial. “Quando a gente canta ‘Água do rio doce’, isso tem uma força gigantesca, um outro peso se a gente pensa no rompimento das barragens em Mariana e Brumadinho. Por outro lado, é difícil pensar numa música que te coloque dentro de Minas Gerais mais do que ‘Desenredo’. Escutar essa música é estar entre uma igreja e outra de Ouro Preto”, compara.
Dori faz coro com Mônica ao apontar o Brasil como a essência de “Canto sedutor”, mas um Brasil que já existiu, se perdeu em algum momento de sua história e hoje é uma utopia. “Minhas músicas falam desse lugar. É onde fui criado, um pouco em Minas, um pouco na Bahia, um pouco no Rio de Janeiro, sempre cultivando o amor pela música, pela literatura, pela pintura, pelas artes cênicas. Vivi um cenário que não tem nada a ver com essa coisa populista de hoje em dia. O Brasil de que falo é um país que me prometeram e não me entregaram”, diz.
O tom desalentado com que Dori fala do Brasil de hoje contrasta com o entusiasmo que ele expressa ao comentar sobre o convite de Mônica para gravar o disco. “Ela atingiu o nível das grandes cantoras do Brasil, é a melhor de todas da geração dela. Mônica é uma cantora excepcional, eu a igualo a Elis, Bethânia, Nana, essas grandes cantoras do Brasil. E além de ser uma grande artista, ela divide tudo, é muito generosa. Eu, que tenho quase 30 anos a mais que ela, fiquei muito honrado com o convite para fazer esse disco”, ressalta.
“Canto sedutor” foi gravado ao longo de cinco dias no estúdio Monteverdi, de André Mehmari, com quem há muitos anos Mônica divide projetos. Um deles, desenvolvido no fim de 2020 para ser apresentado virtualmente, aporta agora em Belo Horizonte, ocupando o palco do Grande Teatro do Palácio das Artes. “Milton”, o show que os dois apresentam amanhã, celebra tanto a obra do autor de “Travessia” e “Morro velho” quanto a continuidade dessa parceria.
“Acho que a gente se encontrou pela primeira vez no início dos anos 2000. Cada um de nós tem os seus trabalhos, seus projetos, mas a gente sempre teve esses encontros. Fomos montando, ao longo dos anos, um repertório em duo, além de participar dos discos um do outro”, diz Mônica.
OBRA DE MILTON
A cantora conta que, durante a pandemia, resolveram cumprir uma quarentena e se encontrar, só os dois, no estúdio de Mehmari, para produzir algum conteúdo. Entre as músicas que resolveram trabalhar, estava “Morro velho”, cuja execução emocionou a dupla e serviu de estímulo para que dedicassem um trabalho exclusivamente a Milton Nascimento.
“Resolvemos fazer um segundo encontro, no Estúdio Monteverdi, homenageando Milton e seus diversos parceiros. Levantamos um repertório muito importante para nós dois e que, com algumas poucas exceções, nunca tínhamos feito juntos”, explica Mônica.
Esse repertório, que o público de Belo Horizonte confere amanhã, inclui “A lua girou”, “Noites do sertão”, “Saudades dos aviões da Panair”, “Milagre dos peixes”, “Canção amiga” e, claro, “Morro velho”.
Veja Mônica Salmaso e André Mehmari interpretando "Morro velho":
O segundo encontro de Mônica e Mehmari, realizado nos estertores de 2020, foi apresentado como um show virtual no canal da cantora no YouTube, mas ficou registrado. “É um conteúdo que ficou muito bem gravado, ficou muito bom, então a gente pretende, até o final do ano, lançar isso. Queremos que vá para as plataformas, que vire CD, porque é o retrato de uma coisa feita com muito amor, com devoção pela cultura do Brasil e pela obra do Milton, que está fazendo 80 anos. Então, além de tudo, vem muito a calhar.”
DE VOLTA AO PRESENCIAL
Com o fim da necessidade de isolamento social e a retomada das atividades, Mônica e Mehmari migraram a experiência do virtual para o presencial e estrearam o show “Milton” em fevereiro deste ano, participando da programação do Festival Artes Vertentes, em Tiradentes, e do 1º Festival de Verão de Campos do Jordão. A dupla tinha apresentação prevista para o Rio de Janeiro antes da chegada a Belo Horizonte, quarta cidade, portanto, a receber o espetáculo, que marca o encerramento do Festival Villa-Lobos, realizado pela Fundação Clóvis Salgado.
Para Mehmari, “Milton” é um trabalho especial, porque reflete a admiração que ele nutre pelo cantor e compositor, que recentemente anunciou, para o final deste ano, sua aposentadoria dos palcos. “A música de Milton já é parte indissociável da minha vida e da minha história, de modo que cada canção se conecta com quem sou em vários níveis, não somente como artista. Existe um humanismo profundo que emana da música e da voz de Milton que é algo de imenso valor e que devemos sempre reverenciar e amplificar”, ressalta.
Mehmari diz, ainda, que “mergulhar neste repertório sagrado ao lado da Mônica, num tempo de tantos desafios, foi das experiências mais marcantes e emocionantes de toda a minha carreira”. Ele diz tratar-se de uma obra profundamente conectada com um Brasil que se deseja. “Navegar com paixão e fé por esse cancioneiro tendo a cumplicidade total desta genial parceira de longa data é se lembrar a cada compasso daquilo que é nossa essência primordial”, aponta.
Veja Mônica Salmaso, André Mehmari e Teco Cardoso em 'A terceira margem do rio', canção de Caetano Veloso e Milton Nascimento:
Veja Mônica Salmaso, André Mehmari e Teco Cardoso em 'A terceira margem do rio', canção de Caetano Veloso e Milton Nascimento:
Evocando o cerne do álbum que gravou com Dori Caymmi, Mônica Salmaso também identifica esse caráter na obra que alicerça o show de amanhã, no Palácio das Artes.
“A música de Milton Nascimento significa a identidade do Brasil, a reafirmação dessa identidade. Milton é das vozes – a que canta e a que escreve – mais potentes, pungentes e emocionantes de toda a história da música brasileira. Poucas pessoas já me fizeram chorar ouvindo tanto quanto o Milton me fez. É a identidade mais profunda que a gente tem, é ouvir, voltar para casa e falar: isso é o melhor que a gente pode ser.”
“A música de Milton Nascimento significa a identidade do Brasil, a reafirmação dessa identidade. Milton é das vozes – a que canta e a que escreve – mais potentes, pungentes e emocionantes de toda a história da música brasileira. Poucas pessoas já me fizeram chorar ouvindo tanto quanto o Milton me fez. É a identidade mais profunda que a gente tem, é ouvir, voltar para casa e falar: isso é o melhor que a gente pode ser.”
“CANTO SEDUTOR”
.Mônica Salmaso e Dori Caymmi
.Biscoito Fino
. 14 faixas
.Disponível nas principais plataformas de streaming
“MILTON”
.Show de Mônica Salmaso e André Mehmari, neste sábado (28/5), às 20h30, no Grande Teatro Cemig do Palácio das Artes (Av. Afonso Pena, 1.537, Centro, 31.3236-7400). Ingressos para plateia 1 a R$ 120 (inteira) e R$ 60 (meia); plateia 2 a R$ 100 (inteira) e R$ 50 (meia); e plateia superior a R$ 80 (inteira) e R$ 40 (meia).