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Estado de Minas MÚSICA

Novo disco põe Alaíde Costa no topo da MPB, lugar que sempre foi dela

Aos 86 anos, cantora grava músicas que Céu, Ivan Lins, Erasmo Carlos e Guilherme Arantes fizeram para ela. Emicida, Pupillo e Marcus Preto dirigiram o projeto


29/05/2022 04:00 - atualizado 29/05/2022 10:54

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Alaíde Costa enfrentou o ostracismo e o preconceito racial, mas não fez concessões em relação à sua música (foto: Enio Cesar/Divulgação)
 
É incontornável a comparação entre Alaíde Costa – por conta do lançamento de seu novo álbum, “O que meus calos dizem sobre mim” – com Elza Soares. Ambas cantoras gigantes, negras, que enfrentaram longos períodos de ostracismo e com a idade avançada encontraram em músicos e produtores de uma geração bem mais jovem a oportunidade de voltar ao lugar merecido, com destaque e visibilidade.

Há, naturalmente, diferenças entre uma e outra, mas diferenças que sublinham identidades. Depois de passar as décadas de 1980 e 1990 à margem, numa espécie de limbo imposto pela indústria fonográfica, desinteressada no que ela fazia ou poderia fazer, Elza lançou, em 2002, já na casa dos 70 anos, o álbum “Do cóccix até o pescoço”. Produzido por José Miguel Wisnik, o disco repercutiu e a recolocou nos trilhos do sucesso de público e crítica.

Dali em diante, ela emplacou discos que reverberaram, com diferentes produtores e sempre se moldando ao que eles propunham. Em “Vivo feliz” (2004), Elza flertou abertamente com o rap e a música eletrônica, ambientes pelos quais transitava Arthur Joly, que capitaneou o trabalho.

Com “A mulher do fim do mundo” (2015) não foi diferente. Ela abraçou a estética proposta por Guilherme Kastrup e uma turma de músicos paulistanos – Kiko Dinucci, Rodrigo Campos, Rômulo Froes, entre outros – responsáveis por formatar o trabalho que a catapultou ao topo do pódio da MPB.

Alaíde Costa está sentada na poltrona, ao lado de Marcus Preto. O rapper Emicida está atrás dela
Universo musical de Alaíde Costa ganha nova dimensão com a produção de Emicida e Marcus Preto (foto: Enio Cesar/Divulgação)
“O que meus calos dizem sobre mim” também é resultado do interesse de uma geração mais nova pelo trabalho de Alaíde Costa. Diferentemente de Elza, no entanto, ela não migrou para o lugar, esteticamente falando, onde os produtores estavam. O rapper Emicida e Marcus Preto – diretor musical de discos de Gal Costa, Erasmo Carlos e Nando Reis – são os nomes por trás de “O que meus calos dizem sobre mim”. Foram eles que saíram de seus postos para visitar o espaço onde Alaíde gosta de estar.

BAILE 

O álbum traz canções românticas e bossas líricas sofisticadas, entoadas pela veterana cantora, de 86 anos, com sincera devoção. Responsável pela direção musical, Pupillo, de 47, imergiu nas águas mansas da expressão artística da cantora. Quem acompanhou o trabalho dele como músico no grupo Nação Zumbi ou como produtor em álbuns como “Tropix”, de Céu, vai se surpreender com os arranjos e a sonoridade. “O que meus calos dizem sobre mim” remete aos conjuntos de baile dos anos 1950, quando Alaíde iniciou sua carreira.

O time de instrumentistas oferece a Alaíde cama de pura seda, onde pode deitar sua voz profunda e cristalina confortavelmente a serviço de canções feitas especialmente para ela. Preto e Emicida foram certeiros ao convidar uma gama variada de compositores para criar os temas do repertório.

O disco traz oito faixas: “Turmalina negra” (Céu e Diogo Poças), “Nenhuma ilusão” (Fátima Guedes), “Tristonho” (Alaíde Costa e Nando Reis), “Berceuse” (Guilherme Arantes), “Pessoa-Ilha” (Ivan Lins e Emicida), “Praga” (Erasmo Carlos e Tim Bernardes), “Aos meus pés” (João Bosco e Francisco Bosco) e “Aurorear” (Joyce e Emicida). Todas inspiradíssimas e criadas sob medida para Alaíde, que já declarou que seu maior orgulho é nunca ter feito concessões. “O que meus calos dizem sobre mim” reafirma essa postura.

Com exceção, talvez, de “Pessoa-Ilha” – em que a lírica de Emicida versa mais sobre questões sociais –, as demais trafegam por entre dores de amores e tons confessionais. Sim, as músicas foram feitas para Alaíde com o desejo de que ela pudesse cantar a própria vida – uma vida que teve mais tristezas do que alegrias na profissão, conforme declarou recentemente, por causa dos longos períodos que ficou sem gravar.

Para Alaíde Costa, os períodos de ostracismo se devem ao fato de não fazer concessões e também por preconceito racial velado, que identifica até mesmo no berço da bossa nova. Era a única negra do núcleo formado por João Gilberto, Tom Jobim, Nara Leão, Carlos Lyra e Roberto Menescal, entre outros.

Alaíde Costa, nos anos 1960, com Oscar Castro Neves, Luiz Eça, Roberto Menescal e Olivia Hime
Alaíde Costa, nos anos 1960, com Oscar Castro Neves, Luiz Eça, Roberto Menescal e Olivia Hime, entre outros talentos da MPB (foto: Acervo pessoal)

SÓ CRAQUES 

O chamamento de Emicida e Preto para que figuras proeminentes da MPB compusessem para a voz de Alaíde foi ouvido em larga escala. Vários nomes, além dos que estão presentes em “O que meus calos dizem sobre mim”, enviaram músicas, entre eles João Donato, Francis Hime, Marcos Valle, Guinga e Gilson Peranzzetta.

Marisa Monte a Carlinhos Brown enviaram “Moço”. Rubel e Emicida já têm pronta “Bilhetinho”. 

Esse material vai gerar o segundo álbum, ainda sem previsão de lançamento. Que venha. Alaíde e os ouvintes atentos à sofisticação e ao refinamento de seu canto merecem.

Alaíde Costa de olhos fechados na capa do disco O que meus calos dizem sobre mim
“O QUE MEUS CALOS DIZEM SOBRE MIM”

. Disco de Alaíde Costa
. Oito faixas
. Samba Rock Discos
. Disponível nas plataformas de streaming



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