Jornal Estado de Minas

ARTES CÊNICAS

Teatro Francisco Nunes tem espetáculo de circo de graça neste domingo


O trapezista, a bailarina, o homem forte que entorta barras de ferro, a dupla de palhaços, o acrobata e o apresentador. O circo ingênuo e poético que encantava as plateias no início do século 20 faz uma viagem de mais de 100 anos aterrissa, neste domingo (5/6), no palco do Teatro Francisco Nunes, onde a trupe paulista Piccolo Circo apresenta, às 17h, o espetáculo “Teatro de variedades”, uma ode aos picadeiros de outrora.





A atração integra o recorte circense da programação 2022 do projeto Diversão em Cena ArcelorMittal, que prevê um total de 11 espetáculos ao longo do ano, com curadoria da Agentz Produções Culturais, responsável pela realização do Festival Mundial de Circo.

“Piccolo Circo – Teatro de variedades” traz 14 artistas em cena, que se revezam entre os números de habilidades circenses, as funções de contrarregras e a banda. Com piano, violão, contrabaixo, acordeom, pandeiro e percussão, são executados ao vivo ritmos que remontam ao início do século passado, como choro, valsa e maxixe.

O espetáculo “Teatro de variedades” marcou, em 2014, a estreia do Piccolo Circo, que foi fundado um ano antes por um grupo de artistas circenses com experiência sólida e diversa nessa linguagem. “A gente tinha o desejo de criar esse circo poético, genuinamente brasileiro, que era muito popular antigamente”, diz Marina Bombachini, uma das integrantes da trupe.





O número da bailarina, que ''caiu em desuso'', como aponta a produtora Fernanda Vidigal, é uma das atrações do ''Teatro de variedades'' (foto: Paulo Barbuto/Divulgação)

Releitura da tradição

Ela explica que a proposta do Piccolo Circo é a de uma releitura do que se fazia antigamente. “Nossa busca é por um circo imaginário; não pretende ser uma reprodução do que era, mas uma interpretação mesmo”, diz. A artista ressalta que a pesquisa sobre como eram essas atrações se dá de forma natural, no cotidiano da equipe.

“Temos uma paixão grande pelo que fazemos. O circo antigo é um tema que nos interessa desde sempre, faz parte da nossa vida. Temos registros históricos, livros, então a gente se apoia no que tem para levar o ‘Teatro de variedades’ aos palcos e picadeiros”, afirma.

A artista observa que os principais elementos de que a trupe se vale para fazer essa viagem no tempo são os personagens, muito iconográficos, dos antigos circos – a bailarina, o trapezista, o homem forte, o apresentador, que era uma figura muito marcante nos picadeiros de tempos idos, anunciando os números.





“Também trabalhamos a questão estética, não como reprodução, mas como leitura. O espetáculo é todo em preto e branco e em tons de sépia, como se fosse uma foto antiga”, diz. Com relação aos números que o público verá em cena, Marina diz que há um pequeno trapézio, uma báscula, que é uma espécie de gangorra em que os acrobatas fazem seus saltos, uma apresentação de equilíbrio de pratos e as entradas cômicas dos palhaços, entre outros. 

Novidade em BH

“E para Belo Horizonte a gente está levando uma novidade, que é um número de dândis, muito tradicional, antigo, pouco visto na atualidade, que traz dois acrobatas que se atrapalham em cima de uma mesa, com um tropeçando no outro, escorregando, trombando”, conta.

Ela diz que, fora essa novidade, a estrutura de “Teatro de variedades” é basicamente a mesma desde a estreia, com um natural refinamento decorrente dos constantes ensaios e apresentações ao longo dos anos. Essas apresentações, conforme a artista observa, vieram se alternando entre a lona e o palco dos teatros.





Números tradicionais são valorizados e ganham espaço no Piccolo Circo (foto: Paulo Barbuto/Divulgação)
“A gente consegue trazer para o teatro a atmosfera do circo de lona. Claro que são necessárias algumas adaptações, técnicas principalmente, em relação a como o espetáculo é visto. No picadeiro, sob a lona, a gente está com os olhares ao nosso redor, e no teatro o público está de frente para a cena. Mas a estética da lona está presente mesmo quando estamos no teatro”, afirma.

Circo teatro

Depois de “Teatro de variedades”, o Piccolo Circo montou, em 2017, seu segundo espetáculo, “Piccola memória”, que deu continuidade à exploração dos elementos que compunham o circo antigo. A segunda criação que a trupe levou aos palcos e picadeiros teve direção de Fernando Neves, artista que vem de uma família tradicional do chamado circo teatro, segundo Marina.

“As apresentações de antigamente começavam com o circo teatro, que era como se fosse uma peça teatral mesmo; aí vinha um intervalo e depois o circo de variedades, com esses números de trapézio, malabarismo, palhaços e bailarina, mediados pelo apresentador. O ‘Piccola memória’ inclui essa parte do circo teatro, que não está presente no ‘Teatro de variedades’. O Fernando trouxe referências importantes para a gente”, conta.





Marina se recorda que, no mesmo ano em que estreou, o “Teatro de variedades” veio para Belo Horizonte, como parte integrante da programação do Festival Mundial de Circo. “Estreamos em São Paulo, fizemos uma temporada no Sesc de Osasco e depois fomos para Belo Horizonte. Foi uma experiência muito legal, porque é um festival que reúne trabalhos importantes. Nessas ocasiões, nós, artistas, temos a oportunidade de ter contato com outros grupos e espetáculos que são referenciais. É uma troca muito rica”, destaca.
 
Confira 'Piccolo Memória', com a trupe do Piccolo Circo:
 

 

Patrocínio e curadoria

O fato de a Fundação ArcelorMittal ser a patrocinadora do Festival Mundial de Circo é o que explica a inclusão dessa linguagem artística na programação 2022 do projeto Diversão em Cena, conforme explica a produtora Fernanda Vidigal, diretora da Agentz. “Quando levei para a empresa a proposta de patrocínio para o festival, que já é realizado há 20 anos, fiz questão de falar que faltava representação do circo no Diversão em Cena. Eles entenderam e toparam a ideia de incluir, nos convidando para fazer a curadoria”, diz.

O “Teatro de variedades” do Piccolo Circo é o terceiro dos 11 espetáculos que compõem a programação. Antes, passaram por Belo Horizonte “Aplausos e vaias”, do Palhaço Mendonça, de São Paulo, e “Bagunça”, do grupo carioca Roda Gigante, no último final de semana. 





Fernanda aponta que o conjunto de espetáculos que integram o projeto este ano procura apresentar para o público a diversidade de linguagens presente na arte circense. “Assim como o Piccolo, tem outros grupos que trabalham a nostalgia, que têm essa preocupação com a memória, no sentido de trazer aquele circo do início do século 20 para hoje, mas também tem muita palhaçaria, que é uma vertente forte em Minas e no Brasil, com grupos importantes, e também propostas focadas em técnicas específicas, de malabares, acrobacias ou aéreos”, diz.

Público infantil

Segundo Fernanda, o objetivo é diversificar para mostrar um recorte, voltado para o público infantil – que é o alvo do Diversão em Cena –, da produção contemporânea. Com relação à linhagem que o Piccolo Circo representa, ela aponta alguns princípios fundamentais.

“O primeiro deles é o formato, com apresentador – algo de que o circo contemporâneo já não se vale mais. Mas esse tipo de espetáculo, como o ‘Teatro de variedades’, tem isso bem marcado, e tem a dupla de palhaços atrapalhados, tem o número da bailarina, que era uma coisa muito comum, tradicional, que também caiu um pouco em desuso”, comenta.





Ela cita, ainda, a presença da trapezista e do homem capaz de quebrar correntes como números marcantes do circo de antigamente. “Óbvio que isso vem, hoje, embalado em uma atualização, formatado por uma leitura contemporânea do que foi o circo de um século atrás, com uma pitada de humor que é atual”, pontua.

Outro elemento clássico que a produtora destaca é a presença da banda executando a música ao vivo durante a apresentação. “O circo de antigamente tinha na trilha um momento muito importante. Era uma característica marcante no início do século 20, todos os circos tinham isso, inclusive com bandas bem numerosas tocando clássicos do nosso repertório”, diz.

Trupe propõe um circo poético e genuinamente brasileiro (foto: Paulo Barbuto/Divulgação)

Pausa na programação

Depois da apresentação do Piccolo Circo, a programação circense do Diversão em Cena dá uma pausa e retorna em setembro, com o espetáculo “O jardim do imperador”, do grupo Pelo Cano, de São Paulo, que será apresentado na Praça Duque de Caxias, em Santa Tereza.





O restante da programação para o ano, segundo Fernanda, ainda será definido a partir desse hiato nos meses de julho e agosto. “Durante a pandemia os grupos não produziram, não podiam se encontrar, ensaiar, então ficou tudo parado. A partir do início deste ano é que muitos deles começaram a montar espetáculos novos. Conheço vários, mas tem que aguardar, dar tempo de os artistas produzirem, por isso é uma coisa para o segundo semestre”, explica.

O próprio Piccolo Circo – que mesmo antes da chegada da pandemia estava com suas atividades em um compasso mais lento, porque seus integrantes também atuam em outras companhias – está em fase de projetar novidades. 

“Agora é um momento de retomada que está sendo muito gratificante. Temos o projeto de um espetáculo menor, em que atuamos como se estivéssemos na era do rádio, explorando outras linguagens de comunicação. Temos vontade de desenvolver isso”, revela Marina Bombachini.

“TEATRO DE VARIEDADES”

Espetáculo do Piccolo Circo, neste domingo (5/6), às 17h, no Teatro Francisco Nunes (av. Afonso Pena, 1.321, dentro do Parque Municipal, Centro, 31. 3277-6325). Entrada gratuita, sujeita à lotação do teatro, mediante retirada de ingressos no site Disk Ingresso, ou duas horas antes do espetáculo, na bilheteria do Francisco Nunes.