Jornal Estado de Minas

CINEMA

Glória Pires é policial destemida que lida com o Alzheimer em "A suspeita"


Mesmo que seja uma das caras mais conhecidas da TV brasileira, Glória Pires participa pontualmente de filmes desde sua estreia nos cinemas, 40 anos atrás, com “Índia, a filha do sol”, de Fábio Barreto, no qual interpretou a personagem-título. 





Depois da fase de cinebiografias da década passada, em que interpretou Lota de Macedo Soares em “Flores raras” (2013), de Bruno Barreto; Irmã Dulce no título homônimo (2014), de Vicente Amorim, e Nise da Silveira em “Nise: O coração da loucura” (2015), de Roberto Berliner, ela retorna ao cinema em um drama policial, seu primeiro longa-metragem em seis anos.

Com estreia nesta quinta-feira (16/6), “A suspeita” é também o primeiro filme dirigido por Pedro Peregrino. Além de protagonizá-lo, Glória Pires atua aqui também como produtora. À exceção da última, ela está em todas as cenas da história, que acompanha uma comissária da Polícia Civil carioca diagnosticada com Alzheimer. 

Em meio aos sintomas iniciais que lhe provocam lapsos, Lúcia entra em uma investigação que envolve polícia e traficantes – a certo momento, é apontada como a principal suspeita do esquema.







O filme, que deu a Glória o Kikito de melhor atriz no Festival de Gramado do ano passado, nasceu de um argumento do antropólogo e cientista político Luiz Eduardo Soares. A intenção inicial era a produção de uma série. “Quando entrei no projeto, decidimos transformá-lo num longa, pois era mais a minha vontade, e também era mais viável no contexto da época, 2016”, afirma Peregrino.


LOCAÇÃO

O longa foi rodado no Rio de Janeiro, no final de 2018. A principal locação foi um andar em um grande prédio comercial no Cais do Porto. “O que a gente vê nos filmes policiais é quase sempre a delegacia. É raro ver um espaço mais de escritório, reservado para a inteligência. Achei que é uma forma de trabalhar diferente das tramas policiais que vemos, sobretudo no cinema brasileiro”, comenta o diretor.

Ainda que tenha uma trama policial, é a doença que está em primeiro plano. “Nossa tentativa era investir no que a história tem de autêntica, além do mais porque já vimos bastantes histórias de tráfico e corrupção. O mais importante era a relação entre os personagens”, acrescenta.





A narrativa começa com Lúcia no computador, escrevendo um texto que dá a entender que ela está guardando aquilo para o futuro. A história é toda fragmentada, com diferentes tempos e cenários. Existe a narrativa principal, um caso que tem relação direta com o chefão do tráfico. Mas o foco está nos policiais: Lúcia é uma comissária experiente que não se detém frente aos seus superiores, o delegado Gouveia (Gustavo Machado) e Avelar, o chefe da Inteligência (papel de Charles Fricks).


Entremeando essas sequências, há também outra subtrama, na qual vemos a protagonista chegando a uma festa de crianças em que os convidados são seus colegas na polícia. Em um terceiro viés, a história nos leva à preparação da personagem para sua aposentadoria – com uma vida solitária, em que o parente mais próximo é um tio padre (interpretado por Genézio de Barros).    


O espectador vai seguindo Lúcia nestes diferentes momentos, apresentados sempre de forma fragmentada, em referência direta aos sintomas do Alzheimer. Mas este quebra-cabeças só se tornou concreto na montagem. 

“Tirar a narrativa de ordem foi uma tentativa de conectar o espectador com a sensação da personagem de perda de memória, de não saber o que vem antes ou depois. As cenas não poderiam ter início, meio e fim. Ou tinham só início e meio ou só meio e fim. Foi um trabalho interessante de montagem entre eu, a Joana (Collier, a montadora) e a Glorinha, que participou muito”, diz Peregrino. A neurologista Mariana Spitz atuou como consultora do filme. Houve ainda a leitura de livros sobre e escritos por pacientes de Alzheimer.




Peregrino começou sua carreira em cinema por meio da fotografia, trabalhando ao lado de Walter e Lula Carvalho, Walter Lima Jr. e Júlio Bressane. Depois, migrou para a assistência de direção – um dos títulos em que atuou foi “Tropa de elite”. Chegou à Globo, onde trabalha há mais de uma década. Está começando agora a dirigir a nova trama das seis, “Amor perfeito” (título provisório), inspirada em “Marcelino pão e vinho”.

“Adoro fazer televisão, é uma excelente escola para quem está sempre querendo mais, porque tem um fluxo muito grande de trabalho. Se você é um diretor que se restringe ao cinema, é muito difícil estar sempre filmando. E fazer TV dá intimidade com o ofício, o que é muito valioso, ainda que tenha um lado massacrante”, diz Peregrino.

“A SUSPEITA”

(Brasil, 2021, 95min, de Pedro Peregrino, com Glória Pires, Charles Fricks e Gustavo Machado) – Estreia nesta quinta-feira (16/6), no Cineart Cidade (21h), Cineart Del Rey (13h50), Cineart Contagem (20h), Cinemark BH Shopping (14h10, 16h30) e UNA Cine Belas Artes (Sala 1; 14h e 18h30)