Viajar a trabalho com a família não é novidade para Gilberto Gil. Em 2017, o cantor e compositor baiano circulou por algumas cidades com o show que marcou os 40 anos do disco “Refazenda”, acompanhado de outros artistas da família.
Quase dois anos depois, foi a vez de levar aos palcos o show do álbum “OK OK OK”, do qual participaram filhos e netos. Nas duas turnês, a filha cantora Preta Gil, fruto de seu casamento com Sandra Gadelha, sua primeira mulher, acompanhou de longe, pelas críticas nos jornais ou pelo que os irmãos contavam.
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Na semana passada, durante coletiva on-line que reuniu 80 jornalistas do país, Gil não escondia a alegria da inclusão de mais uma integrante do clã. “Preta vem se incorporar ao time e acho que ela vai se divertir muito e ficar feliz em conhecer tantos lugares novos na nossa companhia.”
EPISÓDIOS
Com estreia nesta sexta-feira (24/6) no Amazon Prime Video, o reality show “Em casa com os Gil” conta em cinco episódios a preparação da família para a turnê. “Confinados” em Araras, região serrana do Rio de Janeiro, por quase um mês, passaram lá o aniversário de 79 anos do cantor baiano, enquanto, de uma forma lúdica, escolhiam as canções do repertório e iniciavam os ensaios da turnê “Nós a gente”, que começa no próximo domingo (26/6), data em que Gil faz 80.Preta conta que já está recebendo dicas de Flor, sua sobrinha, uma veterana em sua segunda turnê com a família. “Ela me dá aula. Eu pergunto: Como é quando a gente chegar na cidade tal? Ela fala: ‘Tia, você só vai ter uma hora para se maquiar, você tem que ser rápida, é turnê histórica”, diverte-se Preta, assegurando que a vida da família é um palco.
“A música do meu pai fala muito sobre isso (... subo nesse palco, minha alma cheira a talco, como bumbum de bebê...); somos todos crianças nesse palco e vamos nos desenvolvendo da maneira que a gente quiser. A Bela (Gil, chef e apresentadora de televisão), mais para uma área do que para outra; a Marilia, toda a família se sente à vontade nesse palco, sendo ou não artista”, afirma.
LIÇÕES
A direção do programa é de Andrucha Waddington, Rebeca Diniz e Pedro Waddington, que fogem das tretas comuns ao realities com famosos e oferecem revelações que dificilmente veríamos. Como o momento em que o baiano, calmo de fazer inveja a Jó, sobe o tom com os netos, insatisfeitos com a derrota do time de coração, Flamengo. Gil, torcedor do Fluminense, com firmeza e muito sério ensina: “Não é possível vencer sempre”.No bate-papo virtual, Gil reconheceu que o desafio do reality foi oferecer uma jornada audiovisual com imagens, sons, músicas e conversas que fossem interessantes para o público, “focalizando numa família, uma personalidade conhecida, com uma inserção pública como eu, os filhos, os netos”.
Preta comenta que Andrucha foi muito feliz em escolher uma equipe que se enclausurou junto com a família, que não sabia muito bem quem era quem. “As câmeras ficavam escondidas dentro da nossa convivência, a gente agiu da forma mais natural possível, acho que todo mundo se sentiu literalmente em casa. A gente teve um convívio absolutamente natural, como é no nosso dia a dia, com conflitos, sim, mas os conflitos que a nossa família tem são aquilo ali. É meu pai implicando com o outro; ao mesmo tempo, é aquela figura que está ali o tempo todo instigando o discurso pró nossa família.”
HERANÇA
Para Gil, esse modo de ver a existência e as tarefas de educar e instruir são uma herança dos pais e avós que ele procurou levar adiante. “Sou resultado de uma criação muito apurada por parte de meu pai, minha mãe, minha avó, minha tia, e não tive como evitar que isso fosse naturalmente o modo seguinte, o modo próximo da minha nova família”, afirma, com orgulho.Andrucha define o programa como uma mistura de documentário com reality. “Os realities, em geral, vão tentando puxar muito nas coisas não muito legais. Aqui, de alguma maneira, o que sobressaltava era o que para mim é um exemplo. Uma família que abraça a diversidade, que tem tolerância, que tem o nosso mestre, o nosso rei coordenando aquela tribo que acolhe todos”, afirma. “Gil é quase meu pai, meu irmão mais velho, e a gente é parceiro há quase 30 anos”, diz.
Na avaliação do diretor, “Em casa com os Gil” demonstra ao público como a arte e a cultura são importantes para uma nação. “Vivemos um momento em que a cultura está totalmente deixada de lado, mas nós somos mais fortes do que isso e, apesar de tudo, resistiremos. Acho que ‘Em casa com os Gil’ é uma prova de que não tem pandemia, não tem nada que pare a nossa luz”, afirma.
Ainda sobre o tema da gestão pública da Cultura, Andrucha cita Gilberto Gil como um dos melhores ministros da Cultura que o país já teve, entre os anos de 2003 e 2008, nas gestões do ex-presidente Lula.
CURADORIA
O roteiro do programa é assinado por Hermano Vianna, que, segundo o diretor, conversou com todos os membros da família para poder criar uma pauta. Foi ele também quem propôs que cada um apontasse suas cinco canções preferidas.“Ele fez uma curadoria muito inteligente, inclusive fazendo links para o outro, não só da canção, mas também do que chamou de amigo- oculto, quem a gente iria chamar para apresentar a próxima. Então acho que é muito pessoal mesmo, ficou uma escolha de cada um, muito pessoal”, diz Preta.
“Não tenho medo da morte”, escolha de Bento Gil, filho de Bem Gil, chamou a atenção do avô. “Um menino que estava com 14 para 15 anos na ocasião, há vários anos já era a música preferida dele, indicando um pouco essa presença na alma dele dessa tendência curiosa sobre a finitude, sobre a morte.”
Quando Preta cita ‘Realce’ (“quanto mais purpurina, melhor”), em tempos tão obscuros, a letra ganha uma conotação mais forte. “Salvo algumas exceções, minhas músicas são atemporais, pois falam da vida em geral. ‘Realce’ é uma delas”, diz Gil.
A representatividade também passa pelo roteiro do reality. “Pode parecer fluido para algumas pessoas, mas para quem se sente, para quem se vê espelhado dentro de uma série é muito importante. Acho que nós somos uma família diversa, uma família mista. Meu pai misturou muita gente, de muitas formas, muitos jeitos, muitos gostos, muitos cheiros”, opina Preta. “Acho que a gente passa uma verdade do que é sermos pessoas negras, mestiças, as questões do que cada um de sua geração passou em relação a alguns preconceitos, em relação a algumas opressões, uns diferentes, então a gente tem a diversidade dentro da nossa família também, somos múltiplos, né? Muita gente pode se identificar, sim, com a nossa história, com a nossa verdade.”
Gil acrescenta: “A gente vai passar uma verdade, uma fidelidade, um valor familiar para as famílias. É essa a questão do exemplo, isso está ligado a isso, o desafio, que valor a gente tem? O desafio é isto: é ser real, é ser verdadeiro, a ideia de uma família verdadeira, é isso que eu quero passar!”.
Andrucha lembra que certa vez Gil disse que ser pop é aprender a gostar das coisas. “Eu acho que ser pop também é aprender a aceitar as coisas.”
“EM CASA COM OS GIL”
• Série documental sobre a preparação de turnê do cantor e compositor baiano em comemoração aos seus 80 anos.
Direção: Andrucha Waddington. Estreia nesta sexta-feira (24/6), no Prime Video
“TODAS AS LETRAS” GANHA REEDIÇÃO
A Companhia das Letras prepara para o próximo mês de julho o lançamento de uma edição ampliada e atualizada de “Todas as letras”, volume que reúne as composições de Gilberto Gil. Organizado por Carlos Rennó, o livro trará também comentários inéditos do cantor e compositor baiano a respeito de canções específicas e de seu processo criativo. Com 528 páginas, a publicação será vendida a R$ 199,90 (e-book a R$ 49,90).