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Estado de Minas AUDIOVISUAL

Mostra CineOp exibe hoje filme russo de Dziga Vertov sobre a guerra civil

Versão restaurada do longa documental com imagens históricas captadas entre 1918 e 1920 tem sessão neste domingo (26/6) e ficará disponível on-line amanhã


26/06/2022 04:00 - atualizado 26/06/2022 11:27

Oficial do Exército grita e ergue os braços, enquanto é observado por outros militares, em cena de 'a história da guerra civil'
Realizado na primeira fase da carreira de Vertov, antes de ele se tornar um expoente do cinema experimental, o longa tem imagens históricas captadas entre 1918 e 1920 (foto: CineOP/Divulgação)

A 17ª CineOP – Mostra de Cinema de Ouro Preto, que está em sua reta final, teve como um dos principais focos a produção audiovisual indígena. Um dos pontos altos de sua programação, no entanto, está bem distante, no tempo e no espaço, desse eixo temático. 

Trata-se da sessão comentada do filme russo “A história da Guerra Civil” (1921), do diretor Dziga Vertov, que, 100 anos após seu lançamento, passou por um minucioso processo de restauração.

O longa-metragem – tido como uma verdadeira raridade cinematográfica mundial – será exibido neste domingo (26/6), véspera do encerramento da 17ª CineOP, a partir da 20h, no Cine-Teatro, dentro da programação da Mostra Preservação, em uma sessão comentada com a presença do cineasta e pesquisador Luís Felipe Labaki. 

A partir de amanhã, o filme estará disponível na plataforma da mostra, juntamente com um vídeo em que Nikolai Izvolov – historiador responsável pelo restauro – apresenta um estudo de caso de seu trabalho.

No documentário, Vertov (1896-1954) cobre o desenrolar da Guerra Civil na Rússia (1918-1920), capturando de forma grandiosa um período crucial do século 20 e mostrando figuras históricas, como Leon Trotsky. A restauração do filme levou dois anos e começou com o material deixado pelo cineasta Grigory Boltyansky (1885-1953) no Arquivo de Literatura e Arte de Moscou.

Pesquisa

A partir dos textos do diretor de fotografia, Izvolov fez uma pesquisa meticulosa em outras fontes e saiu em busca de partes do filme que estavam armazenadas em diferentes arquivos. Munido desses fragmentos em 35mm de “A história da Guerra Civil”, o diretor do restauro conseguiu remontar a obra como um longa de 94 minutos.

A versão restaurada teve sua estreia mundial no International Documentary Film Festival, em Amsterdã, em 2021, e, desde então, circula por diversos países. No Brasil, o longa teve suas primeiras sessões no festival de documentários É Tudo Verdade.

Labaki – que é tradutor e organizador do livro “Cine-olho: manifestos, projetos e outros escritos”, coletânea de textos de Vertov – diz que seu papel na sessão comentada de hoje é fazer uma contextualização do momento em que o título foi lançado. 

“Vou falar sobre quem era Vertov quando fez ‘A história da Guerra Civil’, que corresponde a uma primeira etapa de sua trajetória. Também vou falar um pouco do processo de restauro”, comenta. Ele diz que, na época, o longa sequer chegou a estrear nos cinemas – teve apenas uma sessão, de forma pontual, no congresso da 3ª Internacional Comunista, em Moscou, em junho de 1921. 

O pesquisador aponta que o documentário é uma síntese do que Vertov havia feito até aquele momento, na medida em que compila imagens que o diretor vinha produzindo desde 1918 para o primeiro cinejornal de atualidades do Estado Soviético, o “Kinonedelia”, do qual era redator e montador.
 

Primeiros passos

“A restauração permite que a gente veja os primeiros passos que Vertov deu no cinema. Ele trabalhava havia apenas três anos, mas tinha acumulado muita experiência, estava fazendo cinejornal toda semana, produzindo muito”, diz. 

Ele observa que “A história da Guerra Civil” reúne esse material disperso, mas também registra imagens capturadas pelo cineasta, que viajou pelo país, acompanhado de cinegrafistas, realizando filmagens em alguns campos de batalha.

Labaki salienta que, dessa forma, “A história da Guerra Civil” é um híbrido. “Existia muito material sobre o conflito. Vertov trabalhava no ‘Kinonedelia’, que era dos cinejornais mais importantes, e o filme recupera esse material, que era produzido para ser exibido no calor do momento. Vertov foi incumbido de fazer um apanhado desses registros. Não é um projeto que parte dele; foi um filme encomendado para ser exibido no congresso da Internacional Comunista”, destaca.

Ele diz que o próprio Nikolai Izvolov entende “A história da Guerra Civil” como a última etapa pela qual Vertov passou antes de começar a realizar filmes que teriam uma marca mais autoral, de vanguarda, com caráter mais experimental, como “Um homem com uma câmera”, tida como sua obra mais importante. 

"Vertov é conhecido principalmente como expoente do cinema experimental da vanguarda soviética, de formas muito inventivas, usando a metalinguagem, mas tinha essa primeira fase da carreira dele que era menos conhecida”, diz.

Cine-crônicas

“Existia, naquele momento, a ideia de um cinema não ficcional, e existiam – para usar uma expressão contemporânea – diferentes produtos não ficcionais, como os cinejornais. A ideia de documentário existia, o que não existia era a expressão documentário, que só viria a se estabelecer entre o final dos anos 1920 e o início dos anos 1930”, aponta Labaki, acrescentando que os russos usavam o termo cine-crônicas para ser referir à não ficção de caráter histórico. “Era uma coisa que atraía muito o Vertov”, observa.

Além da prática, Vertov também se dedicou muito à teoria cinematográfica, com vários textos escritos – algo que “Cine-olho: manifestos, projetos e outros escritos” põe de novo em evidência.  Para o organizador, as ideias do cineasta não só seguem pertinentes como também instigantes, dignas de novas abordagens.

“No ano passado, Nikolai fez uma retrospectiva que ele chamou de ‘futurospectiva’. A gente ainda está entendendo um pouco do que Vertov escreveu, o que ele propôs. Na introdução de ‘Cine-olho’ falo que Vertov é resgatado pelo menos uma vez a cada década para revisões das ideias que ele lançou em relação a filme, roteiro, montagem. Ele pensava o cinema como uma forma de você projetar o futuro. Acho que a gente ainda está colhendo os frutos do pensamento dele”, comenta.

“A HISTÓRIA DA GUERRA CIVIL”

Sessão comentada do documentário restaurado de Dziga Viértov, com a presença do cineasta e pesquisador Luís Felipe Labaki, neste domingo (26/6), às 20h, no Cine-Teatro do Centro de Convenções de Ouro Preto. O longa estará disponível na plataforma do CineOP a partir desta segunda-feira (27/6).

Homem com semblante sério em frente à fachada do Cine Marrocos, em São Paulo
'Cine Marrocos', de Ricardo Calil, terá exibição às 18h de hoje, no Cine-Praça (foto: Bretz Filmes/Divulgação)

Encerramento com filme e festa junina

O público da CineOP ainda tem uma variada gama de atrações para aproveitar nestes dois últimos dias da edição 2022 da mostra. Neste domingo (26/6) serão realizados dois debates dentro da seção Encontro de Arquivos. 

O primeiro, das 10h às 12h, tem como tema “Direito à memória audiovisual: negros, movimentos sociais, LGBTQIA+, migrantes”, reunindo representantes de diferentes grupos sociais para refletir sobre o lugar da memória na vida de existências humanas muitas vezes legadas à invisibilidade pela maior parte da sociedade.

O segundo debate, que ocorre das 15h às 17h, vai abordar o tema “Critérios de seleção: entre a lembrança e o esquecimento”, com foco nas metodologias adotadas por arquivos de audiovisual. Ambas as mesas redondas da seção serão realizadas no Centro de Artes e Convenções de Ouro Preto.

O espaço também abriga, das 10h30 às 12h, uma roda de conversa sobre os processos de formação de cineastas indígenas, tendo como convidados os realizadores Charles Bicalho (MG), Ernesto de Carvalho (PE) e Mari Corrêa (SP), com mediação de Cleber Eduardo, o curador da seção Temática Histórica. O encontro visa discutir qual o papel das oficinas de capacitação realizadas por não indígenas para a formação de cineastas indígenas.

Longas

No Cine-Praça, montado na Praça Tiradentes, serão exibidos dois longas-metragens – “Cine Marrocos”, de Ricardo Calil, pela seção Mostra Preservação, às 18h; e “Bem-vindos de novo”, de Marcos Yoshi, pela Mostra Contemporânea, às 19h30.

O primeiro é um documentário que conta a história de pessoas em situação de rua, refugiados africanos e imigrantes latino-americanos que ocuparam o prédio de um antigo cinema do Centro de São Paulo. O segundo acompanha o processo de reconstrução afetiva da família do diretor, atravessada pelo fluxo migratório entre Brasil e Japão, conhecido como fenômeno dekassegui.

A programação do dia termina com a Festa Junina da CineOP, a partir das 18h, no Centro de Convenções, e vai contar com quadrilhas, shows, barraquinhas de comes e bebes e brincadeiras típicas dos festejos desta época do ano.

Para amanhã, estão previstas, entre outras atrações, a exibição de curtas e animações para crianças e adolescentes; uma sessão do filme “Katharsys”, de Roberto Moura, pela Mostra Contemporânea, às 17h, no Cine-Teatro do Centro de Convenções; e a sessão de encerramento da 17ª CineOP, com o filme “Adeus, capitão”, de Vincent Carelli e Tatiana Almeida, às 19h, também no Cine-Teatro. (DB)


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