O grupo Quatroloscinco – Teatro do Comum está completando 15 anos de criação no mesmo momento em que começa a retomar de forma sistemática as atividades, após um período de mais de mais de dois anos distante da presença física de seu público.
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“O público está o tempo todo muito ativo. Digo que nesses dois anos e meio de impossibilidade do encontro, ‘Fauna’ foi a peça mais interditada do grupo. Durante a pandemia, apresentamos (a montagem) ‘Tragédia’, sem público, com transmissão ao vivo; não teria como fazer o ‘Fauna’ nesse modelo, por isso pensamos que, neste momento, era o espetáculo mais apropriado para iniciar as comemorações por esses 15 anos”, explica Benevenuto.
Desconstruir identidades
Inspirado na obra “O circuito dos afetos: corpos políticos, desamparo e fim do indivíduo”, do filósofo Vladimir Safatle, o grupo explora, com “Fauna”, temas como violência, desejo, liberdade e desamparo. Os dois atores em cena convidam o público a refletir sobre as afetividades entre corpos e discursos, que se misturam e se confundem, para desconstruir identidades.
Benevenuto considera que essa celebração vem muito a propósito não só pelo período difícil que o Brasil e o mundo passaram e ainda passam no que diz respeito à questão sanitária, mas também pelo ato de resistência que é manter um grupo de teatro por tanto tempo. Ele acredita que as aspirações que atravessavam os fundadores da trupe há 15 anos foram levadas a cabo de maneira satisfatória.
“Quando um grupo de teatro com uma caraterística muito coletiva completa 15 ou 20 anos – e aí eu penso no Galpão, que está fazendo 40 –, eu acho que sim, cumprimos e estamos cumprindo o nosso desejo enquanto artistas”, diz, acrescentando que a batalha para se manter não se limita às dificuldades recentes, relativas à pandemia e ao cenário político.
Durante a trajetória
“O Brasil é um país que, historicamente, não valoriza a arte; a questão comercial sempre falou muito mais alto”, diz. Ele observa, contudo, que, ao longo desse percurso, o Quatroloscinco encontrou seu caminho. “Um grupo de teatro se faz durante a trajetória. É diferente de quando você cria um projeto empresarial, que é um negócio em que você sabe o que vai vender, para qual público, quais metas precisa alcançar. Num grupo de teatro, é só depois de alguns anos que você entende o que está fazendo”, ressalta.
O ator e dramaturgo observa que os mecanismos que abrem espaço para as expressões artísticas – leis de incentivo, festivais, circulações, ocupações – foram alvejados politicamente ao longo dos últimos anos. Apesar disso, o Quatroloscinco projeta um calendário de atividades comemorativas que se estende até 2023.
“Comemorar é, também, uma luta, uma atitude de resistência, porque, de outra forma, como produzir? A gente quer comemorar fazendo teatro, junto do público”, pontua. No segundo semestre deste ano, o grupo se dedica ao projeto Encontro Comum, que vai gerar três criações cênicas inéditas dirigidas pelos convidados Eid Ribeiro, Sara Rojo e Ricardo Alves Jr. A estreia dessas criações está prevista para o final do ano.
Experimentações cênicas
“Estamos começando a trabalhar nesse projeto, que consiste na criação de três experimentações cênicas. Convidamos esses três diretores para compartilharem com a gente. Cada um está partindo de um lugar diferente. É uma forma que encontramos para refletir sobre esses 15 anos, que não são só nossos; é uma reflexão social, política, metafórica, que pensa não só o que foi, mas também o que virá. Também estamos estruturando outras coisas. Queremos apresentar outras peças do repertório, promover oficinas, conversas e atividades afins”, adianta.
Na sessão de “Fauna” do próximo sábado, haverá, antes da apresentação da peça, um bate-papo com a crítica e pesquisadora Julia Guimarães Mendes, da Faculdade de Letras da UFMG, sobre o tema “Relações com o público na cena convivial”, a partir das 15h30.
“O que nos interessa nesse aspecto convivial em ‘Fauna’ é a gente se dar conta desse coletivo que nós somos, não só enquanto grupo, mas como sociedade, e da impossibilidade que existe, filosoficamente, de a gente fazer acordos plenos, entender plenamente o outro; só que isso não pode fazer com que a gente não consiga viver coletivamente”, diz, antecipando os caminhos que a conversa deve percorrer.
“FAUNA”
Com o grupo Quatroloscinco – Teatro do Comum, a partir desta quinta-feira (7/7) até o próximo domingo, sempre às 19h30, na Funarte (Rua Januária, 68, Floresta). Entrada gratuita, com retirada de ingressos no local a partir de 18h30. Lotação: 80 pessoas.