“Pois de muitas coisas agora já podemos rir. De outras jamais poderemos. Fique à vontade, afrouxe o cinto, tire o cotovelo do braço da moça que não é sua, e boa viagem.” Com este texto, de Millôr Fernandes, o MPB4 dava início ao show “Bons tempos, hein?!”. Corria o ano de 1979, e o Brasil estava em meio à abertura política, findo o período mais duro da ditadura militar (1964-1985).
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Exigência
O espetáculo, que teve início em março, é como deve ser. Os seis estão no palco fazendo um show conjunto, e não apenas participações no set de um ou outro, como comumente as reuniões em palco são apresentadas. “Exigência do Kledir”, diz Miltinho.
“Nós nos reunimos para definir o repertório pela internet. Fizemos uma seleção e depois depuramos. A partir do primeiro espetáculo, em Porto Alegre, já mudamos o roteiro. A gente vai adaptando e melhorando, em uma conversa democrática”, comenta Kleiton.
E foi assim desde o início desta história. Terminada a turnê de “Bons tempos, hein?!”, o MPB4 começou a pensar no repertório do próximo álbum. Depois da gravação de “Circo de marionetes”, o quarteto perguntou aos irmãos gaúchos se eles teriam mais algumas cartas na manga. “Foi aí que a gente se conheceu pessoalmente”, diz Miltinho. Do material apresentado, o grupo escolheu duas canções, “Vira virou” e “Viração”.
Já era 1980 e o Almôndegas tinha se desfeito. No final de 1979, os irmãos Ramil haviam participado do Festival da Rede Tupi com a canção “Maria Fumaça”. Saíram de lá com uma menção honrosa e bem conhecidos em todo o país. Contratados pela gravadora Ariola, lançaram-se como dupla. E gravaram, também naquele ano, seu álbum de estreia como Kleiton & Kledir. Tanto “Vira virou” quanto “Viração” estavam no repertório.
A história vai longe. No mesmo 1980, o MPB4 saiu em turnê do novo disco, “Vira virou”, também o nome da série de shows. O grupo vocal convidou os irmãos gaúchos – ambos já radicados no Rio de Janeiro desde aquela época – para a temporada nos palcos.
Convivência
“Estreamos em São Paulo e viajamos o Brasil inteiro. Desta ligação começou uma amizade muito grande com ele. Virei parceiro do Kledir, o Magro do Kleiton. Era muito interessante a convivência com aqueles caras mais jovens”, acrescenta Miltinho.
“A letra da música (’Vira virou’) entrou na capa, que foi ilustrada por Elifas Andreato. Imagina a minha felicidade como compositor, como artista que estava começando. E depois a participação no espetáculo. Aquele momento foi fundamental para que a gente conquistasse espaço”, diz Kleiton.
O MPB4, em sua longa trajetória – foi formado em Niterói, em 1965 –, já fez muita parceria em show. Em sua primeira década, sua carreira não podia ser desvinculada de Chico Buarque. Ao longo dos anos, foram muitos os parceiros de palco: Ivan Lins, Toquinho, Leila Pinheiro. “Quisemos fazer com outros artistas. Antes da pandemia, já me veio na cabeça o Kleiton e o Kledir, já que iam comemorar os 40 anos”, acrescenta Miltinho.
Os planos, claro, foram adiados para este ano. A reunião de 2022, vale dizer, é a primeira que MPB4 e Kleiton & Kledir fazem desde a turnê de 1980. “Houve colaboração com eles e deles com a gente neste tempo, mas coisas pequenas. Foram convidados para gravar ‘Vira virou’ em um CD que depois virou DVD. No início da pandemia, fizemos ‘Paz e amor’, uma música bonita, cheia de esperança, para tentar levantar o moral. Convidamos eles para gravar os vocais e cada um fez em casa, com seu celular. Mas reunião como esta é a primeira”, diz Kleiton.
O repertório abrange os sucessos das duas formações. “Apesar de você”, a canção de Chico Buarque de 1970 que virou hino no período duro da ditadura, foi censurada e só foi registrada em LP oito anos mais tarde, no álbum de 1978, continua no repertório do MPB4.
“Está no show, assim como várias outras (da época). ‘Cicatrizes’ (um dos discos mais importantes do grupo) está comemorando 50 anos e ficamos bobos de ver como suas músicas continuam atuais. Por um lado, infelizmente”, diz Miltinho. O disco traz, além da faixa-título, canções como “Pesadelo” (Maurício Tapajós e Paulo César Pinheiro), “Partido alto” (Chico Buarque) e “San Vicente” (Milton Nascimento e Fernando Brant).
Os mineiros, por sinal, têm muita importância na trajetória do MPB4 e de Kleiton & Kledir. E um teatro de Belo Horizonte, o histórico Marília, em especial. “Nós nos apresentamos com a banda Almôndegas no teatro nos anos 1970. Aliás, foram os únicos shows do grupo fora do Sul do Brasil”, conta Kleiton.
Miltinho também revira a memória para falar de BH: “Em 1970, estreamos um show no Teatro Marília. Era um momento difícil da vida brasileira, e a gente já conhecia o Sirlan de Jesus, que fez ‘Viva Zapátria’ (outra canção de ‘Cicatrizes’). Chamamos ele para participar da banda e ficou o Sirlan na bateria e o Toninho Horta na guitarra. Foi aí que começamos a conhecer o pessoal do Clube da Esquina, que ainda nem existia.”
Miltinho comenta que duas capitais brasileiras que foram fundamentais para a carreira do grupo são Belo Horizonte e Porto Alegre. “Lamentavelmente, há muito tempo não fazíamos show aí.”
MPB4 E KLEITON & KLEDIR
Show neste sábado (30/7), às 21h, no Sesc Palladium, Rua Rio de Janeiro, 1.046, Centro. Ingressos: Plateia 1 (esgotado); Plateia 2 – R$ 200 e R$ 100 (meia); Plateia 3 – R$ 180 e R$ 90 (meia). À venda na bilheteria do teatro e no site Sympla.