Jornal Estado de Minas

TEATRO

Inspirado em ataque terrorista homofóbico, 'A golondrina' chega a BH


Junho é conhecido como mês do Orgulho LGBTQIA + em memória à Rebelião de Stonewall, ocorrida em 28 de junho de 1969, em Manhattan, contra a arbitrariedade com a qual a polícia nova-iorquina tratava a comunidade. Desde 2016, entretanto, outra data foi adicionada ao calendário de reflexão contra a homofobia. Em 12 de junho daquele ano, um atirador estadunidense de origem afegã levou a cabo o mais mortífero ataque contra civis nos Estados Unidos desde o 11 de Setembro de 2001, na Boate Pulse, em Orlando, Flórida.





É neste contexto que se passa a montagem da peça "A golondrina", que ganha o palco do Teatro do Centro Cultural Unimed, no Minas Tênis Clube, neste fim de semana. O texto contou com a tradução de Tânia Bondezan, que dá vida à protagonista Amélia. Professora de canto, ela desenvolve uma relação comovente com Ramon, vivido pelo ator Luciano Andrey, sobrevivente do ataque que vitimou seu filho na Boate Pulse.

A peça estreou em 2019, mas ficou suspensa ao longo de 2020 e 2021 em função da pandemia. O ator e produtor Odilon Wagner conta que conseguiu manter a equipe durante o período para que, a qualquer chance de retorno, eles estivessem a postos. Dirigida pelo mineiro Gabriel Fontes Paiva, o espetáculo tem texto original do espanhol Guillem Clua.

"O texto é muito potente, muito tocante. A relação entre os dois personagens, apesar de eles brigarem e se divertirem juntos também, é muito delicada. O autor tem um acerto absurdo, porque ele não toma partido de ninguém. Então, o público também dá razão aos dois e ouve dois pontos de vista completamente diferentes", afirma Tânia. O título, em espanhol, significa andorinha e acabou sendo mantido no idioma original.




EMOÇÃO NA PLATEIA 

A atriz conta ter tido uma recepção muito sensível por parte do público. Inicialmente absorta, ela revela reparar como a plateia vai se compenetrando ao longo da peça e ficando mais ereta nas poltronas à medida que a história evolui. No final, muitas vezes, as pessoas sequer conseguem bater palmas tomadas de emoção.

"As pessoas ficam profundamente emocionadas. Aos prantos mesmo, mas não um choro de tristeza, que a pessoa saia derrubada. É um choro de emoção. Você não precisa ter vivido a mesma realidade que esses personagens para se emocionar. Todo mundo já perdeu alguém, todo mundo já não teve tempo de falar eu te amo, todo mundo já passou por essa situação, né?", reflete.

Tânia conta se identificar com a personagem que, por coincidência, tem o mesmo nome de sua mãe. Para ela, a vida tem sido mais gentil, mas ambas são mães amorosas e protetoras, que tentam fazer as coisas certas e carregam uma culpa que as une. Amélia foi, para si, uma oportunidade de imergir em seus sentimentos.





"É um texto de teatro tradicional, de gabinete mesmo, mas como é extremamente bem escrito e propõe esse mergulho nos personagens, a gente fazia verdadeiras sessões de terapia – eu, o Gabriel e o Luciano Andrey", brinca.

Odilon Wagner afirma nunca ter se envolvido tanto com uma peça na qual não esteve nos palcos ou na direção. Assim como Tânia, ele destaca a potência e a sensibilidade do texto que deu a ela o Prêmio Shell de melhor atriz pelo papel. Para ele, entretanto, apenas a recepção do público já valeria a pena.

"A dramaturgia do Guillem Clua é muito inteligente, pois não fica apenas no discurso que poderia ser entendido como ideológico ou demarcação de território. Poderia ser isso, mas não, as pessoas só se transformam através de histórias humanas e reais. Ele ouviu tantas histórias semelhantes à época e foi a partir delas que ele escreveu o texto," explica Wagner.




TRANSFORMAÇÕES 

São diversos os relatos de identificação recebidos por ele sobre processos de aceitação semelhantes ao retratado no palco. "Se as famílias, dentro de suas próprias estruturas, não conseguem aceitar realidades diferentes, sexualidades, visões ou pessoas que são diferentes daquilo que elas imaginam como ideal, onde que a gente vai conseguir isso? Como a gente transforma uma sociedade, se não for dentro da própria família? É um espetáculo necessário para todo mundo", diz. "Eu queria levar 'A golondrina' para todo o canto, para ver se as pessoas entendem o que é o amor, o que é a aceitação", acrescenta Tânia.

*Estagiário sob a supervisão da subeditora Tetê Monteiro

“A GOLONDRINA”
Nesta sexta (5/8) e sábado (6/8), às 21h, e domingo (7/8), às 19h, no Teatro Centro Cultural Unimed BH Minas (Rua da Bahia, 2.244 – Lourdes). Ingressos: R$ 80 (inteira). Vendas on-line em eventim.com.br