Entre o final dos anos 1960 e o início dos 1970, Branca Moreira Alves e Jacqueline Pitanguy eram brasileiras que conheciam o mundo em lugares onde as coisas estavam realmente acontecendo. A primeira estudava história na Universidade da Califórnia, em Berkeley. A segunda cursava sociologia, no Chile – vivia no país quando Salvador Allende foi eleito. Ambas tiveram contato com movimentos revolucionários, marxistas, pelos direitos civis.
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Cinquenta anos de luta
Branca e Jacqueline recuperam essa vivência de 50 anos da luta pelos direitos das mulheres no livro “Feminismo no Brasil” (Bazar do Tempo). Nesta terça-feira (23/8), Jacqueline estará em Belo Horizonte para lançar a obra, na Livraria Quixote.O encontro terá debate da autora com a socióloga e jornalista mineira Elizabeth Fleury, cofundadora do movimento Quem Ama Não Mata.
É o segundo livro que Branca e Jacqueline escrevem em dupla. Em 1981, publicaram “O que é feminismo”. “Ali, ele era recém-nascido no Brasil, e o livro aborda o seminário (“Pesquisa sobre o papel e o comportamento da mulher brasileira”, realizado em 1975 na Associação Brasileira de Imprensa, considerado o marco inicial da segunda onda do feminismo no Brasil). Temos que entender que nossa geração não foi a primeira, houve os movimentos pelo sufrágio (na primeira metade do século 20) muitíssimo organizados nos EUA, na Inglaterra e inclusive no Brasil”, conta Branca.
Para o novo livro as autoras percorreram a trajetória da chamada segunda onda não só a partir das próprias experiências, como de outras companheiras, que concederam entrevistas. Entre elas estão a escritora e integrante da Academia Brasileira de Letras Rosiska Darcy de Oliveira e a deputada federal Benedita da Silva, além de acadêmicas e intelectuais atuantes em Belo Horizonte, como Celina Albano, Sandra Azeredo, Mirian Chrystus, Dinorah do Carmo e Elizabeth Fleury.
“Cada momento histórico tem a sua característica, é muito difícil analisar a atualidade sem fazer menção ao tempo. É muito mais fácil ser feminista hoje. Quando começamos, o movimento estava ganhando legitimidade política. Nos primeiros anos, o feminismo era como alegoria de escola de samba, ‘abre alas que eu quero passar’. Ao longo da história, houve feministas, mas eram vozes individuais. Ser feminista hoje está fashion, tem mais aceitação, até pelo momento político que o Brasil está vivendo”, continua Jacqueline.
Se no período inicial as referências vinham de fora – como a francesa Simone de Beauvoir e a norte-americana Betty Friedan –, a partir do momento em que o feminismo vai crescendo no país ele passa a ter suas próprias vozes.
“O movimento feminista faz com que a academia teorize sobre ele. Mas é um movimento vivo, real, político, que vai inaugurar conceitos de gênero, de direitos sexuais e reprodutivos”, continua Jacqueline.
De acordo com ela, para que o discurso faça sentido, ele deve refletir a realidade. Dessa maneira, vai adquirindo outros matizes no decorrer do tempo.
“Durante o período da ditadura, o discurso feminista era de mulheres comprometidas com a redemocratização, contra a violência do Estado e pela liberdade de imprensa. No final da década de 1970, a arena política se torna mais complexa, então há a agenda ambientalista, o movimento negro vai adquirindo mais presença, assim como o LGBT. Hoje, a luta é, sobretudo, pela identidade de gênero e pelo reconhecimento do racismo estrutural”, finaliza Jacqueline.
"FEMINISMO NO BRASIL – MEMÓRIAS DE QUEM FEZ ACONTECER"
. De Branca Moreira Alves e Jacqueline Pitanguy
. Bazar do Tempo
. 352 páginas
. R$ 69
. O livro será lançado nesta terça (23/8), às 18h, na Livraria Quixote, Rua Fernandes Tourinho, 274, Savassi. Haverá debate com Jacqueline Pitanguy e a socióloga Elizabeth Fleury.