Nesta quinta-feira (15/9), Paris inaugura extensa exposição com cerca de 200 objetos da mexicana Frida Kahlo (1907-1954) que ficaram escondidos a sete chaves durante meio século. Outra mostra revela a grande influência da pintora sobre a moda contemporânea.
O público verá dos famosos huipiles, trajes tradicionais indígenas que ajudaram Frida a se tornar uma celebridade, às botas ortopédicas que dolorosamente marcaram sua vida, passando por espartilhos que a própria artista decorou. O Museu Galliera, templo da costura, expõe esses objetos pela primeira vez na capital francesa.
Diego Rivera trancou acervo
Após a morte da pintora, os objetos e milhares de fotografias foram trancados por ordem de Diego Rivera, companheiro dela. O conjunto só foi descoberto e catalogado em 2004. Desde então, é exibido esporadicamente em cidades como Londres.
“A imagem de Frida Kahlo perdura porque ela conseguiu quebrar muitos tabus por meio de seu corpo (...). Era uma pessoa que lidava com questões de deficiência, felicidade, convicções políticas e identidade de gênero”, explica Circe Henestrosa, curadora da exposição.
O público logo compreende, ao entrar na sala dedicada a criações de estilistas, a enorme influência de Frida sobre objetos e vestidos. Jean-Paul Gaultier reivindica os espartilhos e cintas da pintora, Karl Lagerfeld fotografa a top model Claudia Schiffer com as sobrancelhas unidas e laço à la Kahlo, enquanto Valentino recupera espetaculares adereços de cabeça que lembram a Virgem Maria.
A história de Frida Kahlo com o vestuário mexicano demonstra como a apropriação cultural costuma ser uma relação mútua – processo que, no caso do México, vem de séculos.
Em algumas regiões, como Chiapas, huipiles eram utilizados por autoridades religiosas cristãs para identificar as tribos indígenas.
Outros trajes, como o resplandor, bordados com babados ao redor do rosto, surgiram do fascínio das mulheres de Tehuantepec pela imagem da Virgem Maria, resplandecente com raios em volta de sua figura. Séculos depois, Frida, filha de mexicana mestiça e alemão, se “apropriou” daquela imagem genuinamente indígena.
Sem jamais pisar em Tehuantepec, mas orgulhosa de sua herança, a pintora transformou roupas regionais em símbolo mexicano por excelência, assim como o terno e o chapéu charro.
“Temos muitos vestidos tradicionais, mas ela escolhe o vestido que remete à mulher poderosa de um matriarcado. Ela escolhe o vestido que a ajuda a comunicar suas crenças políticas”, explica Circe Henestrosa.
Frida "causou" na Paris dos anos 30
Frida Kahlo viajou a Paris apenas uma vez, em 1939, para participar de uma exposição coletiva. “Parece que ela anda por toda parte vestida assim. Havia várias mulheres de aparência muito excêntrica, mas nenhuma poderia rivalizar com o traje mexicano”, escreveu o pintor Vassily Kandinsky sobre Frida, após a abertura da mostra.
O ciclo de apropriação não terminou com a morte da pintora, como comprova a influência dela sobre estilistas contemporâneos. No Museu Galliera, destaca-se o resplandor floral branco e amarelo que a marca Comme des Garçons propôs em 2012, cobrindo a modelo completamente. Ou o espartilho de aros metálico de Alexander McQueen, criado para Givenchy em 2001.