Durante a temporada de seca nos arredores do Distrito Federal, um casal de agricultoras passa a cuidar do neto pequeno depois da morte da filha. Assombrada pela sensação de que uma onça-pintada está vagando pelas redondezas, ela tenta domar a rebeldia do menino, que não consegue se adaptar à vida no cerrado castigado pelo desmatamento.
Esse é o argumento de “A onça”, primeiro longa-metragem de Emanuel Lavor, de 26 anos, com produção de Bruno Torres, da empresa mineira Fuskazul Filmes.
O projeto do filme, que ainda será rodado, ganhou prêmios nos festivais Encuentros BioBioCine (Chile) e World Cinema Fund – Audience Design (Alemanha), além do Troféu Horizonte, entregue no encerramento da 16ª Mostra Internacional de Cinema de Belo Horizonte (CineBH) e do 13º Brasil CineMundi, no último domingo (25/9), na capital mineira.
De acordo com Dirk Manthey, Sara Silveira e Sophie Erbs, responsáveis pelo Troféu Horizonte, o projeto de Lavor foi escolhido devido “ao olhar que lança ao futuro que abraça a terra, coloca a diversidade no centro das atenções e potencializa as mulheres de gerações esquecidas, que educam com a sua força interior sem depender do homem”.
Os jurados destacaram também que “A onça” denuncia “o bioma em confronto com denúncias de desmatamento”, o que “abre horizontes internacionais com possibilidades de criar pontes e conexões, trazendo a potência das histórias do Brasil profundo”.
Imersão cubana
Tudo isso nada mais é do que o reflexo das experiências pessoais e familiares do diretor Emanuel Lavor. Baseado inicialmente no curta “O pequeno chupa-dedo” (2020), de sua autoria, o roteiro de “A onça” passou a ser trabalhado mais intensamente durante o mestrado do cineasta na Escuela Internacional de Cine y TV de Cuba, durante o ano passado.Lavor conta que em seis meses de profunda imersão, as reflexões abordadas no curta-metragem de 2020 foram dando lugar a dilemas mais recentes e latentes de sua própria vida.
“Ambos os filmes lidam com o fantástico, mas em ‘O pequeno chupa-dedo’ eu tinha visão muito mais negativa do mundo, de modo que as reflexões ali, com o passar do tempo, já não faziam mais parte de mim”, revela o jovem diretor.
“A história de ‘A onça’ tem muito mais a ver com minha história familiar. Tenho relação profunda com o meio ambiente e com a agroecologia”, emenda.
Pandemia, queimada e angústia
“Enquanto brasileiros, não fomos muito educados em relação ao cerrado. Quando se fala em meio ambiente e sustentabilidade, pensamos logo na Amazônia e nos esquecemos do cerrado. Mas ele é o segundo maior bioma da América do Sul, com grande biodiversidade. Infelizmente, é também o segundo bioma mais ameaçado”, lamenta o diretor.
A proposta do longa é trazer essa problemática como pano de fundo, e não como a questão central da trama. “A ideia é que o filme funcione como fábula, criando um microcosmo no qual funcione por ele mesmo, e não seja obra panfletária, que fique datada, presa a um único momento”, ressalta Lavor.
Além de Denise Fraga, o elenco de “A onça” conta com outro nome de peso: Dira Paes. A confirmação da dupla só foi possível devido a Karine Teles, atriz e roteirista.
Na parte final do mestrado em Cuba, os alunos poderiam indicar o nome de alguém da área como tutor. Lavor não pensou duas vezes. Passou logo para a Escuela Internacional de Cine y TV o nome de Karine, de quem Lavor era fã e há muito acompanhava o trabalho. A atriz, de pronto, aceitou o convite e ainda facilitou o contato com Denise e Dira.
“Karine já tinha trabalhado com a Denise no filme ‘Fala comigo’ e agora está com Dira em ‘Pantanal’. Ela ajudou a apresentar o projeto para as duas, o que seria muito difícil se dependesse apenas de mim”, reconhece Lavor.
Com o “sim” das duas atrizes, ficou mais fácil concluir o roteiro. Afinal, as falas passaram a ser planejadas para elas.
O jovem Emanuel Lavor traz experiências de vida e de carreira diferenciadas das de seus contemporâneos. Ele nasceu em Natal, no Rio Grande do Norte, cresceu em Rio Branco, no Acre, e se estabeleceu em Brasília.
Antes de se dedicar ao cinema, formou-se em artes cênicas, trabalhou como professor de ioga e como fotógrafo analógico. É dele a foto de Denise Fraga divulgada como a primeira imagem do filme.
Ao longo de su carreira no cinema, Lavor teve algumas produções selecionadas em editais e projetos, como o Laboratório de Novas Histórias, em São Paulo, e o edital Cardume Curtas (2022), em Minas.
Estreia ainda é incógnita
Trabalhos do diretor foram premiados na Mostra Curtas Fantásticos do Cine Curta Taquary (2020), em São Paulo, e no Brazil International Monthly Film Festival, em dezembro do ano passado.
Emanuel Lavor dinda não sabe quando “A onça” vai estrear.
O projeto está inscrito no fundo setorial da Agência Nacional do Cinema (Ancine) e aguarda a avaliação do órgão para a liberação da verba, o que, se depender do atual governo federal, “não deve sair tão cedo”, afirma o diretor.
O projeto está inscrito no fundo setorial da Agência Nacional do Cinema (Ancine) e aguarda a avaliação do órgão para a liberação da verba, o que, se depender do atual governo federal, “não deve sair tão cedo”, afirma o diretor.