“Lavra”, longa-metragem de Lucas Bambozzi que estreia nesta quinta-feira (6/10), é um filme que nasceu da tragédia. “Mas ele não fala da morte, retrata a morte. E precisamos fazer com que ela não se repita”, afirma o realizador paulista, criado em Minas, sobre o misto de documentário e ficção que aborda o impacto da mineração no estado.
É uma personagem ficcional quem conduz a narrativa. Depois de 30 anos vivendo nos EUA, Camila (Camila Mota, atriz do Teatro Oficina) retorna à Governador Valadares natal quando o Rio Doce é contaminado pelos rejeitos da mineração.
A personagem segue o caminho da lama e viaja por cidades impactadas por ela: Bento Rodrigues, Paracatu de Baixo, Itabira, Baguari, Serro, Conceição do Mato Dentro. Em todos os locais, encontra personagens que tiveram a vida modificada em decorrência da exploração do minério. Quando ocorre o novo rompimento, em Brumadinho, Camila chega ao local logo após o desastre e se envolve com movimentos de resistência.
''Foi fundamental estar perto da tragédia. Foi tão assustador estar lá que isso acabou reforçando o desejo de fazer o filme e a convicção de que ele conclamasse algum tipo de embate. Não é um filme que simplesmente constata o problema, ele chama para a reação"
Lucas Bambozzi, cineasta
A intenção de fazer o filme veio logo depois da tragédia de Mariana, onde a barragem do Fundão se rompeu em novembro de 2015.
Mas o projeto começou a tomar corpo no início de 2017, quando Bambozzi e parte da equipe fizeram pesquisas in loco, visitando Mariana, Bento Rodrigues e Paracatu de Baixo.
“Não era exatamente (filmagem) pra valer, mas levamos o equipamento que permitiria registros que pudessem entrar no filme. E foi o que aconteceu. Naquele momento, não tínhamos a Camila definida nem a forma do filme”, conta Bambozzi.
“Lavra” é fruto de parceria do realizador com a roteirista Christiane Tassis – a personagem de Camila é o alter ego da escritora.
Ao vivo em Brumadinho
O projeto foi ganhando forma nos anos seguintes até que no início de 2019, em meio à preparação do set de filmagem, ocorreu nova tragédia em Brumadinho.
“Conseguimos estar lá no dia seguinte (ao rompimento da Mina Córrego do Feijão) com a equipe, e cinco dias depois já estávamos com a atriz ali. Foi fundamental estar perto da tragédia. Foi tão assustador estar lá que isso acabou reforçando o desejo de fazer o filme e a convicção de que ele conclamasse algum tipo de embate. Não é um filme que simplesmente constata o problema, ele chama para a reação”, explica o cineasta.
A câmera de Bambozzi é subjetiva – tudo o que vemos é o que Camila também vê. “O filme vem da relação entre mim, a Kiti (Christiane Tassis) e a Camila. À vivência da Kiti em Valadares foram acrescentadas experiências minhas, pois cresci em Minas, e as da Camila, que é da região de Montes Claros.”
O diretor comenta sobre a linguagem cinematográfica que adotou. “Muitas vezes, a protagonista teve de fazer escolhas. Quando estava diante de um personagem real, ela dava escuta àquilo e decidia o que fazer. Não podia dizer ‘corta, Lucas’. Se alguém começava a chorar, ela abraçava, dava acolhimento ou ficava em silêncio. Então, o filme foi feito dentro desse espaço de improvisação e sensibilidade.”
Para Bambozzi, a chegada de “Lavra” aos cinemas neste momento pode trazer novos elementos para o debate em torno da exploração mineradora em Minas Gerais.
“Espero que ele seja uma ferramenta de discussão dos problemas, em especial de como escapar do maniqueísmo”, conclui o cineasta.
“LAVRA”
(Brasil, 2021, 101min., de Lucas Bambozzi) – O documentário estreia nesta quinta (6/10), às 18h20, no Centro Cultural Unimed-BH Minas, e às 18h30, no UNA Cine Belas Artes.